Dívida não é vergonha

Não sinta culpa por ter dívidas e não conseguir poupar, diz Nath Finanças; veja dicas da influenciadora

Larissa Coldibeli Colaboração para o UOL, em São Paulo Divulgação

Nath Finanças, 22, não poupa críticas ao sistema financeiro e não tem problemas em compartilhar a própria vida, como ao contar que comprou pizza para a família quando recebeu um aumento.

A audiência do seu canal no YouTube, com dicas de finanças pessoais e investimentos para a população de baixa renda, explodiu em 2020, passando de 38 mil inscritos em janeiro para mais de 200 mil em dezembro.

Em entrevista ao UOL, a administradora de empresas de Nova Iguaçu (RJ) diz que ninguém deve se sentir culpado ou constrangido por estar endividado, já que muitos brasileiros estão na mesma situação. Ela também afirma que as pessoas aprenderam, com o ano difícil que foi 2020, a valorizar a reserva de emergência, e dá dicas para começar a montá-la como e quando der, ainda que aos pouquinhos.

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"Educação financeira é importante, mas não faz milagre"

UOL - Tem como poupar e investir ganhando um salário mínimo?

Nath Finanças - Dependendo da situação, não dá para fazer tudo ao mesmo tempo. Poupar não significa poupar muito. Você consegue poupar R$ 10, R$ 20 ou R$ 30. Vá juntando os centavos quando pagar uma compra no débito em vez de em dinheiro, assim você economiza. Não vai ser fácil, mas você pode conseguir aos poucos.

Coloque na sua cabeça: guarde quando você puder e se você puder. Não se sinta pressionado ou culpado por não conseguir guardar dinheiro se você tem outras prioridades. Às vezes, vai tudo para pagar contas da casa, alimentação, contas dos filhos. Mas, se puder, comece a guardar, é um hábito que tem que começar.

UOL - O salário mínimo não sobe na mesma proporção que os preços de alimentos e do aluguel. Dá para equilibrar as contas?

O salário mínimo não tem o aumento que deveria, não acompanha o aumento do arroz, do óleo. Muitos dos meus seguidores perderam o emprego, tiveram redução salarial, não receberam o 13º. O [salário por] dia do trabalhador está mais barato que o quilo da carne, para quem ganha um salário mínimo [R$ 1.045, em 2020]. Meus seguidores estão aprendendo a se organizar, mas não tem como dizer que só educação financeira vai salvar neste momento. Ela dá suporte para você se organizar, mas não faz milagre.

Agora é começar a pensar em fazer reserva de emergência para o ano que vem, guardar R$ 10, R$ 20, R$ 30. Mas não serão seis meses de reserva, como os economistas falam. Meu público usou o ano para pagar contas básicas, como alimentação, e negociar dívidas que estavam altas. É difícil para as pessoas de baixa renda montar essa reserva, elas tentam guardar como podem.

Falta educação financeira no país? Quem deveria ser responsável por ela?

Não falta só educação financeira, mas interpretação de texto, matemática. Educação financeira é importante nas escolas e em casa, para normalizar a conversa sobre dinheiro.

Educação financeira pode ser a solução, por exemplo, para entender sobre juros compostos e não cair em ladainha de gerente de banco oferecendo empréstimo, não cair em cheque especial e cartão de crédito com limite alto e anuidade, cobrança de pacote de serviços essenciais que poderiam ser gratuitos.

Mas ela não resolve os problemas do mundo e do sistema. A pessoa tem que entender por que o salário dela não aumenta e por que as coisas estão caras demais. Colocam a culpa na pandemia, mas antes dela já não tinha aumento real do salário mínimo, não tinha política pública para ajudar as pessoas de baixa renda.

As pessoas estão indo para a informalidade, não estão conseguindo um emprego CLT [Consolidação das Leis do Trabalho] que assegure que, se ela passar mal, vai ter plano de saúde. Aí classificam trabalhos precários, sem segurança nenhuma, como "empreendedorismo". Temos que focar no emprego e na valorização da CLT.

Tem muita coisa que precisa ser discutida, não só por economistas e por quem entende do sistema econômico brasileiro, mas entre toda a população, para as pessoas entenderem e tomarem decisões.

Dá para fazer planos de médio e longo prazo em um período tão incerto como este? Que dicas você dá para o pós-pandemia?

Dá, considerando sua realidade de hoje e sem metas inalcançáveis. O planejamento financeiro deve ser feito em fases.

O primeiro passo é entender sua relação com o dinheiro, começar a organizar as dívidas, a entendê-las e a negociar. Busque colocar essa organização financeira no papel.

Tenha metas não só na mente, escreva e coloque em prática como um hábito. Coloque uma meta e vá dividindo as tarefas durante o ano. Por exemplo, quer viajar depois da vacina? Tem que pesquisar os preços, saber com o que vai gastar, transporte, passeios, alimentação, se vai precisar comprar algo.

7 dicas para ficar no azul em 2021

  • 1

    Anote o dinheiro que entra e que sai

    Assim, pelo menos evitará gastar mais do que deveria. "O controle financeiro ajuda você a se questionar por que está recebendo o mesmo salário, enquanto as coisas estão ficando mais caras. A educação financeira e o controle são os pontos principais para questionar o que está acontecendo e não se contentar", diz Nath.

  • 2

    Não olhe para o passado

    Em janeiro, comece anotando apenas os gastos de janeiro --olhar para o passado pode lhe confundir. Faça anotações semanalmente, crie o hábito.

  • 3

    Evite gastos desnecessários

    Ao anotar os gastos, você vai conseguir comparar preços e identificar situações em que pode deixar de gastar.

  • 4

    Tenha paciência com o dinheiro e seja gentil consigo mesmo

    Entenda sua relação com o dinheiro e perceba a importância de se organizar financeiramente.

  • 5

    Busque quitar as dívidas

    Nath diz que 2021 será um ano ótimo para quitar dívidas porque "as empresas vão querer negociar, elas querem se recuperar de um 2020 difícil".

  • 6

    Monte a reserva de emergência

    Não precisa seguir o conselho clássico de guardar 30% do salário. Guarde 1%, 2%, 3% --quanto puder. Mas faça disso um hábito. Assim, chegará o momento em que será possível investir em alguma coisa.

  • 7

    Para investir, estude

    Não basta assistir a vídeos de dez minutos no YouTube para escolher um investimento, diz Nath. O vídeo dá uma noção, mas é preciso um estudo aprofundado para entender o mercado financeiro.

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Estou endividado. O que faço?

Estar endividado é ruim, mas não é motivo para culpa ou vergonha, segundo Nath. Ela cita a uma pesquisa da CNDL (Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas) com o SPC Brasil (Serviço de Proteção ao Crédito), anterior à pandemia, para dizer que muitos motivos podem levar ao endividamento. São eles, pela ordem:

  1. Perda do emprego
  2. Redução da renda
  3. Empréstimo do nome para terceiros
  4. Falta de controle financeiro

Não tenha medo de negociar e não sinta vergonha de estar endividado, pois mais de metade da população brasileira está. Respire, você está buscando resolver. Querem fazer o pobre se sentir constrangido, às vezes, até por buscar seus direitos. Por isso, é importante a gente falar sobre endividamento e normalizar a questão do dinheiro, para ter conhecimento e questionar quando houver uma prática abusiva.

Nath Finanças, influenciadora de economia para a população de baixa renda

Passo a passo para negociar suas dívidas

  • 1

    Coloque no papel todas as dívidas, incluindo os juros

  • 2

    Procure pagar primeiro as que têm juros mais altos

  • 3

    Antes de negociar, calcule quanto você pode pagar por mês

  • 4

    Prefira negociar por telefone ou pela internet

    No atendimento presencial, a pressão do credor é maior para fechar o negócio na hora, mas nem sempre é oferecida a melhor negociação

  • 5

    Pesquise feirões de renegociação

    No Feirão da Serasa, por exemplo, há descontos de até 90%

  • 6

    Tenha cuidado com o número de prestações

    Tente também aproximar o valor a ser pago ao devido inicialmente

  • 7

    Faça isso com todas as dívidas ao longo do tempo

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"Não caia nessa de curso para ganhar dinheiro"

Com o número de investidores pessoas físicas crescendo na Bolsa, também se popularizaram na internet os gurus de investimentos, que prometem enriquecimento fácil com a Bolsa. Nath critica influenciadores que vendem cursos e diz que eles se aproveitam da vulnerabilidade das pessoas que estão em dificuldades financeiras, principalmente neste momento de pandemia.

"Esses gurus são charlatões, não querem realmente ajudar as pessoas, querem ganhar dinheiro vendendo cursos. A CVM [Comissão de Valores Mobiliários] tem que fiscalizar e punir essas pessoas que estão se aproveitando da vulnerabilidade de outras", disse.

"Eu apoio quem fala sobre investimento de forma responsável, com certificado adequado para isso, porque conhecimento tem que ser transmitido. Mas se a pessoa só oferece o curso dela, que custa mais que o auxílio emergencial, não caiam nessa. Ela só quer lhe enganar. Não existe dinheiro fácil nem retorno rápido assim."

4 conselhos sobre investimentos

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"Se prometem retornos super-rápidos, corra. Se falam que essa é a hora de investir na Bolsa e, se você não investir, estará perdendo, corra. Porque não é assim, você tem que ter paciência com seus objetivos."

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"Não existe um investimento que seja o melhor para todo mundo, porque cada um tem um objetivo. Um pode querer resgatar o dinheiro daqui a seis meses, e outro, daqui a cinco anos. Por isso, nenhuma carteira de investimentos é igual."

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"Você tem que estudar os investimentos que são adequados para você. Não adianta pegar indicação de fulano. É você quem tem que estudar para tomar a decisão."

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"Não confie seu dinheiro a outras pessoas. Você que tem que administrá-lo e saber o que fazer com ele."

Os números da Nath Finanças

  • Mais de 203 mil inscritos no canal no YouTube

  • Vídeos com mais de 2,3 milhões de visualizações totais

  • Quase 430 mil seguidores no Twitter

  • Mais de 290 mil seguidores no Instagram

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