Mudar plano de previdência?

O que fazer com o plano de previdência privada em tempos de alta da inflação e dos juros

Raphael Coraccini Colaboração para o UOL, em São Paulo Inside Creative House/iStock

Uma multidão de brasileiros está descobrindo os fundos de previdência privada. Só no primeiro semestre deste ano, houve um aumento de 42% da demanda por esse tipo de investimento. Em abril, o patrimônio dos fundos de previdência atingiu o valor de R$ 1 trilhão pela primeira vez, com um crescimento de R$ 61 bilhões em comparação ao mesmo mês de 2020.

Essa adesão aconteceu também por causa da popularização de fundos de renda variável, que passaram a compor a previdência de muitos brasileiros. Esses fundos oferecem possibilidade de ganho maior atrelado, principalmente, ao desempenho da Bolsa de Valores.

Mas com a inflação e os juros subindo e a Bolsa em patamares mais discretos, a pergunta é: vale mudar o plano de previdência e tentar se beneficiar das condições atuais da economia?

O UOL ouviu especialistas em previdência privada e investimentos que apontam se existe a possibilidade de aumentar a rentabilidade desse tipo de investimento, e como fazer. Antes, vale entender como exatamente funciona esse tipo de investimento, voltado para o longuíssimo prazo, e quais as diferenças entre os planos disponíveis no mercado.

Como exatamente funciona um plano de previdência privada?

Ele é muito semelhante a um investimento em fundos de renda fixa, atrelados a indicadores econômicos, ou fundos multimercados, que distribuem o dinheiro em várias modalidades. A diferença está no tempo mais alongado em que o investidor deixa o dinheiro rendendo, além do benefício fiscal que o governo concede no Imposto de Renda.

Além do tempo de aplicação e dos impostos e taxas cobrados, a rentabilidade de um plano de previdência privada vai depender do tipo de ativo que ela contém. Pode acompanhar a valorização de empresas, caso seja composto por ações, ou estar atrelado a algum indicador econômico, como IPCA ou Selic.

A previdência é um monte de fundos aprovados pela Susep [Superintendência de Seguros Privados] onde o dinheiro é alocado de acordo com os planos que o investidor tem, que vão de renda fixa a multimercados.

Marcelo Flora, sócio responsável pelo BTG Pactual digital

Se você deixar sua aplicação por um tempo mais longo, pode pagar somente 10% de Imposto de Renda. Enquanto isso, na renda fixa tradicional, a maioria dos investimentos cobra, no mínimo, 15%.

Fabrizio Gueratto, financista do Canal 1Bilhão Educação Financeira e professor de MBA da Faculdade Unisinos

Dilok Klaisataporn/iStock

O que diferencia os planos de previdência?

A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) permite, hoje, a inclusão de ativos mais rentáveis e mais arriscados nos fundos de previdência, como fundos de ações. Hoje, é possível investir em fundos que alocam até 100% do dinheiro em papéis de companhias, por exemplo.

As taxas de administração dos fundos variam conforme a instituição financeira, mas também de acordo com o risco envolvido. Os que possuem apenas investimentos em renda fixa tendem a ter taxas de administração menores e rentabilidade mais discreta.

Hoje em dia os planos de previdência privada possuem diversos ativos. A CVM flexibilizou bastante isso. Então, é possível até mesmo ter mais de um plano, montando uma carteira de previdência variada, com ativos de renda variável e renda fixa.

Fabrizio Gueratto, financista do Canal 1Bilhão Educação Financeira e professor de MBA da Faculdade Unisinos

Normalmente, se você seleciona um fundo multimercado [de renda variável], o próprio gestor vai ajustando o fundo de acordo com o cenário, por isso as taxas tendem a ser mais altas. Ele pode realocar os recursos de acordo com esse novo cenário de juros.

Marcelo Flora, sócio responsável pelo BTG Pactual digital

Getty Images/iStockphoto

Devo revisar meu plano de previdência com as mudanças de cenário econômico?

Com a inflação e os juros subindo, o investidor pode se sentir atraído por mudar seu plano e direcionar mais dinheiro para fundos indexados pelo IPCA ou pela Selic. Porém, os planos de previdência são feitos para o longo prazo e, por isso, mudanças pontuais na economia não são suficientes para indicar se um ativo valorizará ou não até o resgate.

É o que diz Rodrigo Sivieri, professor de Mercado Financeiro e Avaliação de Empresas na Trevisan Escola de Negócios. Ele avalia que o investidor não deveria ceder à tentação de mexer na previdência privada neste momento.

Mesmo para os investidores mais arrojados, que estão pensando em migrar parte do seu capital dos fundos de ações para fundos de renda fixa, a subida dos indicadores macroeconômicos pode não ser exatamente a melhor opção.

"Num horizonte longuíssimo de tempo, o Ibovespa [índice da Bolsa] acaba rendendo mais que inflação e juros, mesmo em tempos de Selic a dois dígitos", afirma Sivieri.

O fundo de previdência não deve ser algo rotativo, para se ajustar conforme a economia, mas também não é recomendado que você tenha só o plano de previdência privada como investimento. É aconselhável que haja uma diversificação em outros ativos de renda fixa e de renda variável.

Rodrigo Sivieri, professor na Trevisan Escola de Negócios

Lucky336/Getty Images/iStockphoto

Como aumentar a rentabilidade da previdência privada?

É possível fazer mudanças dentro da previdência que aumentem a lucratividade dela sem que ela perca seu caráter de investimento de longuíssimo prazo, e isso tem a ver com redução de taxas cobradas pelas instituições que operam o plano. Sivieri aconselha ao investidor comparar os fundos de previdência disponíveis no mercado e identificar os que oferecem melhores taxas de administração.

Para Marcelo Flora, do BTG Pactual digital, algumas condições oferecidas pelas instituições devem ser avaliadas em qualquer cenário econômico e vão dizer ao investidor se é possível aumentar a rentabilidade fazendo a portabilidade para outro plano ou outra instituição.

Antes, os fundos dos bancões tinham taxas elevadas que não justificavam o investimento. Hoje, há gestões muito mais eficientes que conseguem entregar uma rentabilidade superior a uma taxa de administração baixa, e sem taxa de saída. Esses são os pontos que devem ser levados em consideração.

Rodrigo Sivieri, professor na Trevisan Escola de Negócios

Se o plano tem taxa de entrada, de saída, de carregamento e se tem taxa de administração superior a 2%, isso deveria ser um sinal de alerta para que esse investidor busque planos mais modernos.

Marcelo Flora, sócio responsável pelo BTG Pactual digital

Como mudar de plano para obter melhores condições?

A portabilidade só é permitida em planos da mesma modalidade, de PGBL para PGBL e de VGBL para VGBL. Respeitando essa regra, é possível fazer a portabilidade tanto de uma instituição para outra quanto de um plano para outro dentro da mesma instituição.

As mudanças podem ser feitas para reduzir taxas de administração ou aumentar a rentabilidade dos ativos dos planos. Para mudar de seguradora, é preciso ter o número do certificado, que deve ser apresentado à nova seguradora. "A instituição que está recebendo o plano inicia o processo de portabilidade, e, em até sete dias úteis, essas reservas são transferidas", explica Marcelo Flora, do BTG.

Para os especialistas, a previdência sempre vai ter lugar dentro de uma carteira de investimentos, independentemente da alta da taxa de juros e da inflação porque sua característica de longo prazo faz com que ela atravesse oscilações de curto e médio prazo.

Nesse tempo, porém, o investidor deve ficar atento às condições oferecidas pelo mercado. Com o aumento da concorrência, a tendência é de redução das taxas, o que incide diretamente na rentabilidade do plano.

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