Reserva de emergência no fim

O dinheiro guardado para crises acabou; você mexe nos investimentos ou toma um empréstimo?

Wal Azevedo Colaboração para o UOL, em São Paulo iStock/Arte UOL

Um bom planejamento financeiro inclui contar com uma reserva de emergência, ou de proteção, de oportunidade, ou outro nome que você preferir. A principal finalidade deste fundo é proteger suas aplicações financeiras de médio e de longo prazo, para que, em casos de turbulências no percurso, você tenha dinheiro para cobrir gastos e se reorganizar, sem mexer nos investimentos.

Este fundo pode cobrir, por exemplo, um momento de aperto no orçamento, seja por problemas de saúde, desemprego, perda de clientes (no caso de empreendedores) ou qualquer outro motivo que gere um aumento das despesas ou redução da renda.

Mas, se geralmente este fundo é planejado para cobrir até seis meses de despesas básicas, e a crise gerada pela pandemia já dura bem mais de um ano, como esticar tanto assim esse dinheiro? E quando a reserva acabar, é hora de mexer nos investimentos ou recorrer a um empréstimo? Passada a crise, como recompor as economias?

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Como esticar a reserva?

O caminho, em momentos de crise, é se ajustar à nova realidade, cortando custos. Em função da pandemia, certamente muitos gastos já foram reduzidos, mas vale verificar se há algo mais a ser feito.

Lavínia Martins, CFP (planejadora financeira certificada) fundadora e CEO da Fluxo Planejamento Financeiro, diz que, além dos ajustes no orçamento, é importante procurar alternativas para repor a renda perdida, mesmo que "bicos" temporários, até que a situação se estabilize.

O planejador financeiro Guilherme Prado, head comercial da Fiduc, recomenda: "Seja um camaleão, adapte-se ao novo ambiente e preserve suas finanças", citando alguns exemplos:

  • Avaliar alternativas de transporte: possibilidade de vender o carro, buscando outros meios de locomoção mais baratos.
  • Mudar a alimentação: repensar o carrinho de supermercado, reduzindo gastos.
  • Inovar na atividade física: fazer aula de personal trainer junto com familiar ou amigo. Cancelar mensalidade da academia, exercitar-se em parques próximos.
  • Cancelar serviços redundantes: cancelar o serviço de streaming usado para ver uma única série ou o aplicativo de entrega que não é essencial.
  • Procurar renegociar/recontratar serviços vigentes: plano de saúde, conta de celular e outras despesas.
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Se a reserva acabar, o que fazer?

Procure atualizar sua planilha de orçamento, verificando o efeito dessas ações. Além da redução de despesas para se ajustar ao novo (e temporário) padrão de renda, Guilherme Prado sugere outros caminhos, tais como mudar para outro imóvel e buscar novas fontes de renda.

Muitas profissões estão rompendo com antigos padrões, seja por mudança no comportamento do consumidor ou por adoção de novas tecnologias. Isso representa uma oportunidade para novas carreiras.
Guilherme Prado, head comercial da Fiduc

Os planejadores são unânimes na recomendação de preservar ao máximo os investimentos, mexendo neles somente se não houver outro jeito.

Lavínia Martins diz que, se a pessoa já consumiu toda a reserva de emergência, pode dispor de alguns recursos investidos, mas deve encarar a alternativa como uma situação emergencial limite, procurando encerrá-la o mais rapidamente possível.

Assim que a pessoa conseguir restabelecer a produção de renda, deve reconstruir a reserva de emergência e repor as outras reservas consumidas.

Lavínia Martins, CFP®, fundadora e CEO da Fluxo Planejamento Financeiro

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Recorrer a empréstimo ou não?

Lavínia Martins diz que, em um momento de crise extrema, é importante o investidor levar em consideração se vai consumir toda a reserva financeira ou se deve também tomar um empréstimo, para não acabar com toda a reserva.

É mais fácil e mais barato conseguir crédito no mercado quando se tem patrimônio, incluindo reservas financeiras, do que quando se está zerado e sem perspectiva de melhoria de renda no futuro.
Lavínia Martins, CFP®, fundadora e CEO da Fluxo Planejamento Financeiro

A planejadora afirma que, neste caso, vale considerar fazer um empréstimo com garantia do carro ou imóvel para conseguir obter uma taxa de juros baixa, desde que o prazo não seja superior a três anos, e de que a parcela de pagamento do contrato de crédito não exceda 20% da renda.

"O prazo do contrato determina o custo da dívida, então, o ideal é pagar o dinheiro de volta no menor período possível. Lembrando que, para tomar dívida, é necessário ter renda para pagá-la, e que toda dívida compromete o poder de compra da renda futura. Por isso é importante tomar crédito com responsabilidade, para sair de um momento de sufoco, sem que se torne um novo problema financeiro", afirma.

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Como escolher qual investimento resgatar?

Guilherme Prado faz uma analogia, explicando que cada tipo de investimento fica em uma "gaveta", que pode ser acessada em diferentes intervalos de tempo. Compreender quando "abri-las" ajuda a evitar perdas:

  • Comece pelos mais conservadores (gaveta abre todo dia): podem ser resgatados a qualquer momento, têm menor volatilidade. CDBs, RDBs, fundos de renda fixa.
  • Os próximos são os investimentos cuja gaveta pode abrir uma vez, a cada 1-2 anos: fundos multimercado, fundos de renda fixa mais arriscados e fundos menos líquidos com um pouco mais de volatilidade.
  • Depois, vêm ações e derivativos, cuja gaveta pode ser aberta uma vez, a cada 2-5 anos.

Lavínia Martins diz que, se pessoa não vê perspectiva de crescimento para um investimento, pode resgatá-lo, "assim, deixa de perder nele e pode pagar suas contas". Se todos os investimentos tiverem bom desempenho, procure resgatar a rentabilidade daquele com melhor performance, deixando o principal (aporte inicial) investido.

Quanto a resgatar produtos de renda fixa ou de renda variável, tudo depende.

"Neste momento de alta da inflação e da taxa de juros, para quem tem papéis de renda fixa atrelados à inflação, talvez faça mais sentido vender ações ou resgatar dinheiro de fundos de ações. Já para o investidor com boa composição em ações, com expectativa de que continuem performando e pagando bons dividendos, pode ser melhor se desfazer de papéis de renda fixa", afirma.

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Tributação: capítulo à parte!

Com relação à tributação, a planejadora Lavínia Martins explica é indicado resgatar o investimento que pagar a menor alíquota de Imposto de Renda, para não ser penalizado na saída do investimento.

Ela exemplifica: Se a pessoa tem investimento em previdência privada com tabela regressiva há menos de seis anos, embora o resgate possa estar disponível em poucos dias, a alíquota de IR será entre 35% e 25% do rendimento do fundo no período. Neste caso, faz mais sentido vender ações na Bolsa, ou resgatar o dinheiro de um fundo de ações e pagar o IR de 15%, ou de um fundo multimercados ou de renda fixa que está sujeito à tabela regressiva (de 22,5% a 15% dependendo do período de investimento).

Já se o investimento no fundo de previdência com tabela regressiva tiver sido há mais de seis anos, portanto com alíquota de IR já menor do que 20%, pode ser preferível resgatar dinheiro da previdência do que de fundos multimercado, renda fixa ou de ações.

"É importante checar essa questão do prazo e entender qual é a alíquota de IR que incide no resgate de cada produto para ajudar a escolher de onde resgatar o dinheiro", diz.

Lavínia Martins faz um alerta: "Para o investidor que tem investimento nos fundos dos melhores gestores, principalmente fundos fechados para captação, este deve ser o último lugar de onde resgatar dinheiro, porque normalmente são os investimentos com maior perspectiva de retorno no futuro".

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Situação superada, hora de recompor sua reserva!

Superadas as dificuldades, a recomendação é manter os novos hábitos de controle financeiro, incluindo o custo de vida reduzido pelo maior tempo possível.

"Deve passar a poupar e investir o máximo que conseguir dentro da nova renda, para repor as reservas consumidas, no menor prazo de tempo possível", diz Lavínia.

O mais indicado é construir uma reserva diversificada de investimentos, usando produtos de renda fixa para guardar a reserva de emergência, e todos os outros tipos de produtos financeiros para compor a carteira de investimentos das outras reservas, considerando seus objetivos de vida e aposentadoria.

Guilherme Prado sugere alguns parâmetros para composição da reserva, que deve ser suficiente para cobrir despesas de:

  • No mínimo seis meses, para profissionais com estabilidade de emprego (por exemplo, funcionários públicos)
  • Entre seis e 12 meses, para funcionários CLT (Consolidação das Leis do Trabalho)
  • De 13 a 24 meses para empreendedores ou pessoas cuja renda varia de um mês para outro
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