Quanto dinheiro sua empresa tem em caixa hoje? Quanto você vendeu e quanto gastou? Conhecer o fluxo de caixa é imprescindível para que seu negócio se sustente e não sucumba com as crises.

Mesmo pequenas empresas têm acesso a softwares de controle financeiro em tempo real, o que reduz gastos e aumenta a produtividade. Segundo especialistas, as pequenas e médias empresas (PMEs) podem reduzir até 20% dos gastos e ter um ganho de produtividade de 30% a 70%.

O fluxo de caixa faz parte de um processo geral maior, que é o planejamento e controle financeiro do negócio. "É este processo completo que age como um 'waze' indicando caminhos para levar a sua empresa aos seus objetivos", diz Dariane Fraga, professora de planejamento e controle financeiro, do Programa de Capacitação de Empresa em Desenvolvimento (Proced) da FIA (Fundação Instituto de Administração).

Veja a seguir dicas de especialistas para evitar erros e fazer um bom planejamento em uma empresa de qualquer tamanho.

Mas o que é o fluxo de caixa?

É um controle gerencial para acompanhar o quanto sua empresa tem de dinheiro no caixa. Pode ser feito todo dia, por semana ou por mês, mas especialistas recomendam que esse controle seja diário. Nele são preenchidas todas as entradas (recebimentos) e saídas (pagamentos) de recursos da empresa. Ou seja, ele aponta se está faltando ou sobrando dinheiro em caixa.

Confira o que são entradas e saídas de dinheiro:

Entrada: vendas à vista, recebimento de vendas a prazo, cartões de crédito e débito.
Saídas: despesas fixas ou variáveis (como aluguel, contas de consumo, pró labore, salários e benefícios), custos (como compras de matéria-prima, manutenção de equipamentos e gastos com propaganda) e tributos (impostos, taxas e contribuições).

Se há o controle desse fluxo de entradas e saídas, a empresa consegue detectar com antecedência os períodos em que o caixa ficará descoberto (negativo).

A partir disso, toma decisões para solucionar este problema, como renegociar prazos de pagamentos, buscar recursos, fazer promoções etc.

Também é possível detectar folgas futuras no caixa e aproveitar para fazer aplicações e compras para a empresa, segundo Patricia Viana, consultora financeira do Sebrae-SP.

Uma má gestão do fluxo de caixa pode efetivamente 'matar' uma empresa.

Luciana Ikedo, assessora de investimentos e sócia do escritório Ikedo Investimentos

Os erros no caixa das pequenas empresas

Tecnologia acessível para empresas pequenas

Economia de gastos e aumento da produtividade

Os especialistas estimam que há redução de gastos de dinheiro e ganho de produtividade para a empresa ao utilizar ferramentas digitais no controle financeiro do negócio.

Dariane Fraga diz que, com ferramentas corretas de gestão em todo o processo de planejamento e controle financeiro, as pequenas e médias empresas podem reduzir até 20% dos gastos.

Estimativa parecida foi feita pelo consultor Renato Claro, especialista em economia de empresas: redução de 15% a 20% das despesas financeiras de uma empresa que tem pleno domínio de seu fluxo de caixa. "Este domínio só é viável e confiável por meio de sistemas digitais", afirmou.

Sobre o ganho de produtividade, Carlos Castro, planejador financeiro CFP pela Planejar (Associação Brasileira de Planejadores Financeiros), diz que a variação é de 30% a 70% para as PMEs. "Mede-se o ganho de produtividade dividindo o faturamento pelo número de funcionários. Não é uma medida fácil. A forma de medir é empírica, ou seja, na implementação da tecnologia se mede a variação de faturamento por número de funcionários ao longo de determinado período. Não é uma relação de causa e efeito imediata. O KPI [Key Performance Indicator], que faz essa medição, é fundamental para todas as empresas", disse.

A variação para as PMEs é alta porque, segundo Castro, as pequenas e médias empresas estão em diferentes estágios de automação. "Produtividade pode não significar necessariamente aumento de vendas. A produtividade pode ser também a redução de custos, ou seja, libera-se tempo dos funcionários para eventualmente fazer outras atividades", declarou.

A assessora de investimentos Luciana Ikedo faz um alerta: para a gestão eficiente do fluxo de caixa, é imprescindível que as empresas mantenham o capital de giro necessário investido, com as melhores taxas possíveis, mas considerando a alta liquidez, a baixa volatilidade. Segundo ela, os produtos de investimentos mais indicados para as empresas são os Fundos DI e os CDBs com liquidez.

"Nas pequenas e médias empresas, muitas vezes, há acúmulo de funções e, dificilmente, existe uma pessoa com alto nível de qualificação dedicada exclusivamente à gestão do fluxo de caixa. É comum, por exemplo, que o capital de giro seja pequeno e que não haja acesso a linhas de crédito rápidas, baratas, com um prazo adequado e que atenda às necessidades da empresa", afirmou ela.

Ilton Rogerio/Getty Images/iStockphoto

Quais os benefícios do controle financeiro em tempo real?

A tecnologia digital disponibiliza informação em tempo real sobre as movimentações financeiras da empresa, e isto eleva a previsibilidade de planejamento do caixa, segundo Carlos Castro.

Com planejamento, as empresas podem fazer investimentos como compra de máquinas, treinamento dos funcionários ou mesmo distribuição de lucros.

Confira os principais benefícios:

Reduzir gastos desnecessários.
Cumprir pagamentos e obrigações.
Antecipar situações e problemas para a tomada de decisões mais acertadas.
Gerar informações para comparar períodos (evolução de vendas).
Auxiliar para estabelecer metas de aumento de vendas ou redução de despesas.
Evitar que a empresa tenha que buscar recursos de forma desesperada no mercado, a juros altos.

No entanto, risco não se planeja, se mitiga. A tecnologia não mitiga riscos, mas entrega informações que ajudam a empresa a projetar reserva de caixa para enfrentar crises de mercado.
Carlos Castro, planejador financeiro CFP pela Planejar

Seja o que aparecer na frente, como coronavírus, eleições ou tsunami, manter em dia o processo de planejamento e controle financeiro da empresa vai ajudar no mapeamento e na escolha da estratégia para trazer bons resultados ou até mesmo a apontar o momento de a empresa encerrar suas atividades.

Dariane Fraga, professora de Planejamento e Controle Financeiro da FIA

Cuidados que as pequenas e médias empresas devem ter

De acordo com Patricia Viana, as PMEs devem ter uma reserva de capital de giro para os três primeiros meses de operação do negócio. A média do retorno do investimento no Brasil é de dois anos e meio (30 meses).

"Portanto, iniciar um negócio já com as dívidas de sua implementação pode levar à falta de sucesso desse empreendimento. O ideal é que um novo empreendimento seja visto como um filho, que começará a contribuir com a renda familiar depois de atingir uma idade específica. Tal prazo pode ser calculado no projeto de viabilidade econômica e financeira do investimento, cálculo que faz parte do plano de negócios da empresa", declarou.

10 erros no caixa das PMEs, segundo os especialistas:

Misturar as finanças pessoais com as da empresa.
Não conhecer seu fluxo financeiro.
Falta de previsibilidade em relação às receitas e despesas.
Controlar despesas e receitas em sistemas distintos.
Prazos curtos para pagamento de fornecedores e prazos longos para recebimento dos clientes.
Operar com grandes estoques que levam longo prazo para girar.
Não provisionar despesas futuras (13º salário, férias, multa de FGTS, etc.).
Usar todo seu capital de giro.
Não estabelecer indicadores gerenciais que antecipam a análise de tendência do comportamento do caixa.
Utilizar os cheques especiais e contas garantidas como uma extensão de seu caixa.

Reduzir o tempo entre os gastos e os ganhos

Patricia Viana afirma que, quanto mais longa a distância entre os prazos de pagamento e os prazos de recebimentos de uma empresa, maior deve ser a reserva de caixa para sustentar todo o processo.

Veja um exemplo: uma empresa compra matérias-primas para fabricar determinado produto. Após esse tempo de fabricação, os produtos são postos à venda, e o cliente, ao comprar, pode pagar à vista ou a prazo. Ou seja, a empresa compra e gasta antes para vender e receber o valor investido depois, com lucros.

"Observar o ciclo financeiro e tomar medidas para reduzir os prazos entre pagamentos e recebimentos resulta em melhorias no caixa das empresas", afirmou Patricia Viana, citando algumas medidas para isso: estocar o mínimo necessário, realizar vendas à vista ou com entrada e negociar prazo de compras postergando pagamentos, entre outras.

Livro-caixa é coisa do passado; planilha também

Antes, o controle do fluxo de entradas e saídas era feito por meio do livro-caixa. "Literalmente, eram anotadas todas as entradas e saídas, informações necessárias para se fazer a escrituração contábil. O processo foi evoluindo para planilhas, e hoje há ferramentas integradas que disponibilizam a informação em tempo real", disse Carlos Castro.

Com a digitalização, a quantidade de dados foi ampliada e passou a ser processada em bancos de dados em questões de segundos
Carlos Castro, planejador financeiro CFP pela Planejar

Renato Claro, especialista em economia de empresas, diz que há ainda grande número de PMEs que controlam suas entradas e saídas por meio de planilhas eletrônicas.

"Isso é bastante temerário. Primeiro, porque é um controle muito pessoal. Normalmente só quem criou a planilha sabe utilizá-la. Há riscos de segurança da informação, ou seja, se eu cometer um erro e apagar alguma informação importante, dificilmente consigo recuperá-la. O controle via planilhas dificulta também a leitura de informações relevantes. É mais difícil extrair este tipo de informação para o gerenciamento do negócio", afirmou Claro.

Patrícia Viana diz que, no controle de caixa tradicional ou livro-caixa, as empresas fazem o controle de caixa, mas sem classificar esses ganhos e gastos no plano de contas (denominações que a empresa dá para todas as suas entradas e saídas).

O controle de caixa tradicional apenas resulta na informação do saldo, mas não permite uma análise gerencial por categoria de entrada e saída de recursos. Também não permite a projeção do caixa no futuro. É somente uma apuração do saldo do período.

Patrícia Viana, consultora financeira do Sebrae-SP

Softwares de controle financeiro ajudam a cuidar de tudo

As ferramentas mais utilizadas para controle e gerenciamento de caixa são planilhas personalizadas em Excel e softwares de controles financeiros, que também integram outros tipos de controle em um sistema de gestão.

As ferramentas digitais dependem do porte da empresa. As mais desenvolvidas têm sistemas de ERP ("Enterprise Resource Planning"), que controlam desde a compra, entrada da mercadoria e despesas até venda de produtos e serviços e recebimentos.

Segundo Renato Claro, empresas de menor porte normalmente contam com sistemas de ERP de controles de estoques e vendas.

Estes sistemas mais sofisticados conseguem informar que uma venda feita em xis vezes representa uma previsão de entrada de caixa nas datas contratadas com a empresa de meios de pagamentos. Os sistemas menos sofisticados não têm esta funcionalidade, o que dificulta o controle.
Renato Claro, especialista em economia de empresas

Segundo Claro, as PMEs ainda têm dificuldade em informar ao sistema de gestão as despesas não relacionadas ao fluxo comercial (compra e venda de produtos e serviços). "Despesas como aluguel, telefone, água, energia etc. acabam ficando fora do sistema, o que inviabiliza chegar ao fluxo de caixa. No máximo se controla o fluxo de recebimentos", disse.

"Numa empresa pequena, até mesmo o Excel pode ser utilizado para gerar esse relatório. Porém, sistemas informatizados são mais ágeis, possuem todas as dimensões de registro mais estruturadas", disse a professora Dariane Fraga.

Outra ferramenta para automação do fluxo de caixa é a de gestão de funil de vendas CRM ("Customer Relationship Management").

Carlos Castro diz que, com a mudança de compra de licença de software para modelo de assinatura, estas ferramentas estão disponíveis com elasticidade de preços, o que permite que todas os portes de empresas possam automatizar seus processos financeiros. Este é um modelo em nuvem.

"Os modelos em nuvem estimularam o desenvolvimento de um ecossistema em torno das ferramentas de gestão de fluxo de caixa de maneira que prestadores de serviços de contabilidade, por exemplo, possam ter seus escritórios integrados ao ERP das empresas, gerando as obrigações de pagamentos de impostos também em tempo real. Da mesma forma este ecossistema foi se ampliando para integrar empresas de meios de pagamentos, prefeitura e bancos", afirmou Castro.

Para Castro, esta integração em tempo real facilita a conciliação financeira de todas as informações contábeis com o saldo no banco.

Como fazer esse controle do fluxo de caixa?

Patricia Viana, do Sebrae-SP, aconselha que o empresário deve sempre reservar um momento de seu dia para fazer os controles, lançamentos e projeções de caixa.

"Anotar os pagamentos é a parte mais fácil, uma vez que grande parte das despesas está registrada em contratos, boletos ou ainda são recorrentes, como salários e aluguéis", afirmou ela.

Para projetar os recebimentos, diz, é necessário verificar as vendas a prazo realizadas e a data em que tais recursos serão devidamente recebidos pela empresa. Ainda deverá projetar as vendas à vista, com base em seu histórico de recebimentos. "Normalmente, quanto mais controle a empresa fizer, mais reais se tornarão as suas projeções", afirmou.

Como projetar o caixa da empresa?

É preciso levar em conta o histórico de vendas, a sazonalidade do seu produto ou serviço e os possíveis fatores externos (relativos ao clima, ao mercado e a eventuais crises, como a atual pandemia).

"Desta forma, a empresa poderá ter uma visão de seu caixa a longo prazo, detectando problemas que possam ser resolvidos antecipadamente. Durante as crises, o gerenciamento de caixa se torna ainda mais importante. Ao perceber a redução nas vendas ou entradas financeiras, é necessário observar as despesas com um olhar contingenciador, ou seja, buscar redução de gastos, negociações de pagamentos e uso de medidas governamentais, como a redução de jornada dos funcionários. São exemplos de atitudes para não deixar o caixa da empresa descoberto", declarou Patricia Viana.

Por outro lado, é possível também aproveitar oportunidades quando há sobras de caixa para fazer investimentos, por exemplo.

A projeção do caixa pode ser feita para a semana, quinzena, mês ou bimestre. Quanto mais longa a projeção, maior será a visão do empresário. "A visão de longo prazo dá segurança, ela é a base para reduzir incertezas e ansiedade na gestão", afirmou Patricia Viana. Ela diz, no entanto, que ajustes sempre são necessários.

Renato Claro diz que numa pequena empresa é comum que o administrador invista muito tempo em questões administrativas, dentre as quais o controle de caixa é um dos mais críticos.

"Quantas vezes não se vê o empresário desesperado para receber um determinado pagamento para poder honrar uma obrigação sua? Um controle de caixa mais desenvolvido permite que o gestor invista muito menos tempo. Conhecendo os fluxos, o empresário pode entrar em seu home banking numa segunda-feira e autorizar todos os pagamentos da semana de uma vez, já que confia que o dinheiro estará disponível. Daí ele pode usar seu tempo para atividades que gerem mais vendas e mais resultado, em vez de ficar 'planilhando'", afirmou Claro.

O planejamento é um norteador, e não uma verdade absoluta. É importante comparar o caixa previsto com o realizado e apurar as lições e motivos que levaram a tais variações.

Patrícia Viana, consultora financeira do Sebrae-SP

Dinheiro sob controle

10 erros no caixa das PMEs, segundo os especialistas:

Como projetar o caixa da empresa?

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