Pizza é cara no Brasil

O brasileiro paga mais por pizza porque o país é muito imprevisível, diz chefe da pizzaria Domino's

Beth Matias Colaboração para o UOL, em São Paulo
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Fernando Soares, CEO da Domino´s Pizza, explica, em entrevista exclusiva na série UOL Líderes, diz que a pizza no Brasil é mais cara porque o país é muito imprevisível e os preços ficam mais altos porque é difícil planejar os negócios.

Ele também reclama da falta de uma coordenação nacional no fechamento do comércio durante a pandemia, fala sobre a nova dinâmica do consumo e como a entrega não é mais o diferencial do setor de fast food.

Apaixonado por pizza, o chefe da Domino´s diz que a mais vendida na rede de restaurantes em todo o país é a de calabresa. Sobre a fusão com o Burguer King, afirma que as marcas devem continuar independentes.

Ouça a íntegra da entrevista com Fernando Soares, CEO da Domino´s Pizza, no podcast UOL Líderes. Também pode assistir à entrevista em vídeo no canal do UOL no YouTube. Continue nesta página para ler os destaques da conversa.

Preço salgado

UOL- A pizza é cara no Brasil se comparada a outros países?

Fernando Soares - Eu podia estar vendendo uma pizza muito mais barata. Sim, o brasileiro paga mais caro na pizza, e volta no tema da previsibilidade: eu não sei que custo vou ter dos meus insumos amanhã, e as empresas precisam se proteger disso de alguma forma. Então elas colocam essa margem para se proteger. Infelizmente, o brasileiro sempre está pagando mais caro para garantir que as coisas funcionem.

O que os empresários podem fazer pelo Brasil agora?

Os empresários têm que dar o exemplo. É claro que não dá para colocar tudo isso nas costas do empresário, mas é nossa responsabilidade fazer o país funcionar, gerar emprego, treinar as pessoas e crescer.

E o que o Brasil pode fazer pelos empresários?

As regras precisam ser mais transparentes, mais compreensíveis e previsíveis. A sensação, quando você olha para a política desorganizada, é: será que vai ser aprovado aquilo ou será que vai mudar a regra? Você está sempre retraído e nunca incentivado a crescer, sem visão de médio e longo prazo.

Falta coordenação econômica?

Em relação à questão econômica, a conta é simples. Gastar menos do que ganha e assim gerar valor ao longo do tempo. Você não vê o país na mesma direção. Isso gera uma revolta porque não é assim que se faz a gestão da economia nem individual nem empresarial e muito menos de um país.

A Domino's é assim

  • Fundação

    1960 (EUA) 1994 (Brasil)

  • Funcionários

    1.500 (Brasil)

  • Unidades

    310 (Brasil)

  • Presença no mundo

    95 países

Pandemia sem coordenação

UOL - Como você explica o Brasil para os estrangeiros?

Fernando Soares - Temos algumas complexidades. A questão tributária é praticamente impossível de explicar e eu diria que até quase impossível de entender.

O segundo ponto é que as regras mudam. Um exemplo real foi o que aconteceu em março do ano passado. Enquanto alguns países mostravam números maravilhosos de retomada, avanço de vacina, nós dizíamos a eles que tínhamos um problema.

As regras mudavam a todo instante, de estado para estado, de cidade para cidade. É muito difícil controlar uma operação nacional desta forma porque não temos uma diretriz única.

Faltou um comando nacional para enfrentarmos a pandemia?

Tenho uma sensação de que faltou coordenação. Sem entrar no mérito qual era a regra correta, mas era preciso uma melhor coordenação para entender exatamente a maneira como deveríamos nos comportar e ter um pouco de previsibilidade.

Nas nossas empresas, tínhamos essa previsibilidade. Olhar para o país vizinho era uma oportunidade de olhar para o futuro. Estávamos sempre um pouco atrapalhados. Isso gerou insegurança geral, para os times, para os consumidores e para o país inteiro. Essa foi a grande dificuldade.

Para quem você mandaria uma pizza em 2022? Para o Bolsonaro, para o Lula?

Eu mando uma pizza para os brasileiros porque no final do dia é um povo resiliente, criativo, bem-humorado.

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Tenho uma sensação de que faltou coordenação [na pandemia]. Era preciso entender exatamente a maneira como deveríamos nos comportar e ter um pouco de previsibilidade.

Fernando Soares, CEO da Domino´s Pizza

Nada de pizza no almoço

UOL - Quais foram as mudanças nos hábitos dos consumidores nos últimos anos?

Fernando Soares - A pandemia acelerou duas tendências que impactaram bastante o varejo e principalmente o setor de food service. A primeira é a digitalização. A maneira como nos comunicamos com o consumidor passou a ser muito mais direta, com uso de mídias sociais.

Uma segunda tendência, que já era forte lá fora do país, é o delivery. Não só para os restaurantes, mas o varejo em geral acabou experimentando o e-commerce. Para dividir alguns números do setor: tínhamos no início da pandemia, falando de grandes redes, em torno de 40% das vendas de fast food em delivery. Agora esse número está acima de 90%.

Mas mudou a forma de consumir pizza?

Prefiro dizer que concentrou muito em uma única ocasião. Começamos a entregar mais de uma pizza no mesmo endereço, pizzas de tamanhos maiores ou mais combos com bebida ou sobremesa. Isso porque as pessoas estavam em casa, mas em família.

O que mudou também foi a pizza do almoço que, infelizmente, desapareceu. Outra informação interessante é que aqui no Brasil, há dois anos, a venda no salão representava mais de 30%. Em algumas cidades do interior chegava a 50%.

Com o fechamento, todo mundo migrou para o delivery. Temos uma expectativa de que essas vendas no salão voltem de uma maneira diferente; talvez não com o mesmo peso e com formato ainda restrito.

Entrega não é mais fator "uau"

UOL - Teremos ainda mais empresas aderindo ao delivery?

Fernando Soares - O delivery deste ano é totalmente diferente do ano passado, quando eu tinha 40% dos outros players jogando neste mercado. Hoje temos quase 100%. Qualquer tipo de refeição viaja bem como a pizza. A ocasião de comer em casa se revolucionou. Acredito que esse é o mundo novo e temos que estar preparados para saber operar.

Hoje em dia vemos tudo viajando muito bem pelo delivery, frutas, verduras?.

Eu gosto de usar o exemplo do sorvete. Ele também viaja bem no delivery. Não muito tempo atrás, podíamos nos gabar porque as pizzarias sabiam muito bem fazer o delivery. Hoje, elas não estão mais sozinhas. Você precisa ir buscar qual é o seu fator "uau" para entregar uma pizza porque não é mais só eu que faço entregas na sua casa.

E qual vai ser o "fator uau" da Domino´s?

Estamos sempre buscando outras ideias e outros canais. Fomos os primeiros a lançar pedidos de WhatsApp, inclusive, em relação à Domino´s em outros países. Fomos também os primeiros a aceitar pedido por "emoji" -você manda um emoji de pizza e nosso WhatsApp já entende que é um pedido de pizza.

Imagine uma companhia de fast food que tem uma área de desenvolvimento de produto que está pensando na interação do consumidor com o aplicativo. É um cuidado que há três ou quatro anos não estava na lista de tarefas da empresa, mas hoje é obrigatório.

Preferência nacional: calabresa

UOL - A alimentação no Brasil tem características regionais muito diferentes. Há essa preocupação da empresa em atender as preferenciais regionais?

Fernando Soares - Não temos produtos diferentes regionalmente. Mas em relação a outros países, há alguns sabores nossos, como a pizza de pão de alho, que quase impossível de descrever para os estrangeiros.

Existe a pizza preferida do brasileiro?

A pizza mais vendida é calabresa. Em São Paulo, há uma preferência grande para frango com requeijão.

A pizza é um alimento saudável?

Pizza é duplamente saudável. Ela entrega alegria, comemoração. É um presente para si mesmo. É também um produto que envolve qualidade. No nosso caso, a massa vai fermentando no caminho da loja, naturalmente. Além disso, podemos customizar com menos molho, menos queijo.

Em alguns países, a Domino´s oferece pizzas 100% vegetais. Por que essa opção ainda não está no Brasil?

A resposta para isso requer muita responsabilidade, principalmente quando precisamos equalizar uma operação em 320 lojas. Começamos alguns testes, mas ainda não conseguimos escalar com a qualidade necessária. Temos que correr porque o consumidor está pedindo.

Como será a fusão com a Burguer King?

Primeiro, vamos esperar a aprovação [pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica], depois vamos para uma fase de poder gerar valor das sinergias. Os produtos são individuais, as marcas continuam independentes.

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