UOL - Existe algum aspecto do nosso mercado que o senhor acha difícil de entender, ou peculiar?
Heini Zachariassen - Sim. Nós já operamos em 15 países vendendo vinho, e geralmente o tamanho do mercado é o critério [para começar a venda]. Mas "pulamos" o Brasil por muito tempo, mesmo o país sendo o segundo maior em número de downloads, porque parece que é um lugar muito complicado para fazer e-commerce de vinhos, com impostos, frete etc. Levamos um tempo para descobrir como fazer isso. Nesse sentido, é um país muito complicado.
O senhor pode falar um pouco mais sobre essas dificuldades? Que desafios a empresa enfrenta?
Um dos maiores são os impostos. Tivemos que encontrar parceiros em estados específicos para nos certificar de que nós teríamos as taxas certas. Nunca tínhamos visto isso em lugar nenhum.
O frete e os preços são relativamente altos também. Tudo isso são dificuldades de negócios que não tivemos na Europa. Os Estados Unidos também são bastante complicados. Tivemos vários desafios aqui, mas nós os estamos enfrentando e vamos lançar [o e-commerce].
O que um governo deve fazer para criar o melhor ambiente de estímulo à inovação e ao empreendedorismo?
É muito simples: ficar fora do caminho.
Apenas isso?
Isso é muito importante. Veja a Dinamarca, que é um país muito bom para fazer negócios. Os impostos são muito altos para algumas coisas, mas há pouquíssima burocracia, não há corrupção e o governo realmente fica fora do caminho a maior parte do tempo. Isso é crucial. É realmente um grande problema quando os governos ficam interferindo.
O que o senhor pensa do Brasil, nesse sentido?
Honestamente, não conheço o ecossistema de negócios daqui muito bem, mas pelo que escuto, posso ficar um pouco preocupado. Parece haver mais burocracia do que deveria.
O consumidor brasileiro tem alguma característica que o distingue dos outros?
Sim, cada mercado é diferente. Aqui, os vinhos do Chile, da Argentina e de Portugal são os mais populares, enquanto nos Estados Unidos são outros. Uma coisa que eu percebi no Brasil é que nós temos algumas ferramentas sociais no aplicativo, nas quais você pode curtir ou publicar um comentário, por exemplo. Por alguma razão, isso é extremamente popular aqui, mas não no resto do mundo.
Como são essas funções?
É como um Instagram, mas com vinhos. Não tem sido uma parte muito importante do nosso produto, mas aqui é. Fora isso, o Brasil é o nosso segundo maior mercado em downloads, atrás dos Estados Unidos. Temos 3,1 milhões de downloads aqui. O Brasil foi um "early adopter" do Vivino [um dos primeiros a usá-lo].
Diferentemente dos europeus e dos argentinos, por exemplo, o brasileiro não é um tradicional consumidor de vinho. Como é operar em um mercado assim?
É interessante porque acho que essa é uma das razões pelas quais nós temos sido tão bem sucedidos. Como o vinho é relativamente novo aqui, as pessoas querem aprender.
Trouxemos o aplicativo para cá justamente por isso, por causa do [consumidor que pensa:] "ei, eu não entendo muito sobre vinho, mas quero aprender mais".
O senhor costuma acompanhar a situação política do Brasil? Como ela interfere nos negócios?
Até o momento, não interferiu. Mas é interessante, parece ter muita coisa acontecendo aqui. Se você acompanha a mídia estrangeira, as pessoas falam muito sobre o Brasil e a crise, mas estou aqui há alguns dias, e as pessoas parecem estar bem e prósperas. Mas talvez eu tenha estado nos bairros "certos". Acho que a imagem que temos no exterior é um pouco mais sombria do que o que está realmente acontecendo aqui.
Como uma crise econômica muda o hábito do usuário do aplicativo e do consumidor de vinho?
Em 2008 ou 2009, quando a economia estava encolhendo e tudo estava desmoronando, conversei com um argentino que gerencia um bar de vinhos em Copenhague [Dinamarca]. Perguntei como o bar estava indo, e ele disse: "está ótimo!". Falou que as pessoas estavam deixando de fazer viagens caras para a Tailândia, por exemplo, mas estavam garantindo a sua taça de um bom vinho para ter algum tipo de prazer.
Acho que, em uma crise, as pessoas passam a comprar vinhos numa faixa de preço um pouco mais baixa, mas elas definitivamente não abrem mão do seu vinho. E talvez elas até precisem de uma taça extra para lidar com os momentos ruins.