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REPORTAGEM

Avião solta chamas pelo motor após colisão com pássaro em SP; qual o risco?

Alexandre Saconi

Colaboração para o UOL, em São Paulo

22/09/2021 04h00

Um avião teve de abortar a decolagem no aeroporto de Congonhas (SP) na última quinta-feira (16) após o motor soltar chamas durante o procedimento. Não houve nenhum risco maior durante o ocorrido, e os passageiros, que seguiam para Fortaleza, trocaram de avião e continuaram viagem após cerca de uma hora.

O que causou as chamas foi a ingestão de um pássaro pelo motor, fenômeno chamado de "bird strike", que é quando uma ave atinge o avião. Após cancelar a decolagem, o piloto e a torre de controle conversam sobre o fenômeno como a causa da parada, o que serve de alerta para as demais operações no local.

O fenômeno não é raro de acontecer e já causou diversos problemas, inclusive acidentes. No caso ocorrido em Congonhas, a aeronave foi inspecionada e, segundo dados de sites de rastreamento de aviões, voltou a realizar voos já no dia seguinte.

Labareda

Estol - Montagem/Reprodução/YouTube - Montagem/Reprodução/YouTube
Ingestão de pássaros desregula a entrada de ar gerando labareda, que é o combustível queimando fora do motor
Imagem: Montagem/Reprodução/YouTube

Devido à entrada irregular de ar no motor após a colisão com o pássaro (ou entrada de outro objeto), ele pode emitir labaredas e fazer estalos — barulhos que parecem "pipocos". Em uma situação mais grave, as lâminas do motor podem ser danificadas e passarem a girar de maneira desbalanceada, o que também gera problema na ingestão do ar.

A chama ocasionada nesta situação dura poucos instantes, o que não significa que o motor esteja pegando fogo. Quando isso acontece, é preciso observar o manual de cada avião para saber como proceder.

Geralmente, opta-se por abortar a decolagem. Caso não seja possível, por segurança, os pilotos podem continuar com o procedimento, devendo retornar o quanto antes para um aeroporto, se necessário.

Motor aguenta

Motor - Alexandre Saconi - Alexandre Saconi
Ninho de corujas localizado na cabeceira do aeroporto de Congonhas, em São Paulo
Imagem: Alexandre Saconi

O motor dos aviões é planejado para suportar condições extremas. Durante os testes, são jogados diversos objetos contra as "blades", que são as pás que movimentam e comprimem o ar no motor.

No geral, quando um pássaro bate em uma dessas pás, ele é dilacerado e jogado para a parte mais externa do canal de passagem de ar, não sendo sugado pela turbina. Com isso, o que costuma ocorrer é um dano nessas "blades", e não um prejuízo maior para todo o conjunto.

Ainda assim, às vezes, pode ser necessário trocar o motor antes de a aeronave voltar a voar. Mesmo que o impacto seja mais severo, o motor é protegido para não causar danos à asa ou ao avião.

Ocorrências

bird - Montagem/Liam McManus - Montagem/Liam McManus
Sequência mostra colisão com pássaros de um Embraer E190 em maio de 2013, em Manchester (Inglaterra)
Imagem: Montagem/Liam McManus

Segundo dados do Cenipa (Centro de Investigação e Prevenção de Acidentes Aeronáuticos), foram registrados 301 ocorrências de impacto entre aviões e aves no Brasil entre 2010 e 27 de julho de 2021. Destes, cinco foram considerados acidentes. A maioria foi classificada apenas como incidentes sem gravidade.

O aeroporto com maior incidência de "bird strike" no período foi o de Guarulhos (SP), com 14 ocorrências, seguido por Congonhas (SP), com 13 incidentes, e Santos Dumont (RJ), com 11 registros.

O controle da fauna é de responsabilidade dos operadores dos aeroportos. Quando são observadas aves nas proximidades do local, tanto pilotos quanto as equipes em solo comunicam esse fato via rádio para manter todos em alerta.

Muitas vezes, as colisões com pássaros ocorrem na fuselagem, sem causar danos substanciais. Já em outras situações, pode haver um rompimento das paredes externas do avião ou, até mesmo, do para para-brisa.

AMX - Divulgação/Henrique Rubens Balta de Oliveira - Divulgação/Henrique Rubens Balta de Oliveira
Colisão de uma aeronave AMX da Força Aérea Brasileira com ave: impacto destruiu o nariz do jato
Imagem: Divulgação/Henrique Rubens Balta de Oliveira

Pesca restrita no Santos Dumont

No aeroporto Santos Dumont, no Rio de Janeiro, a presença de barcos no entorno do local é restrita. Um dos motivos é a possibilidade de o jato de ar que sar dos aviões adernar (tombar de lado) as embarcações.

Outro risco está ligado diretamente com o "bird strike". Grande parte desses barcos é de pesca, e, com a presença de peixes fora da água, pássaros começam a voar por perto se sentindo atraídos pela comida fácil, passando a compor mais um risco para a aviação.

Em abril deste ano, um voo atrasou vários minutos no aeroporto devido a essa restrição, já que um barco estava atraindo aves para a cabeceira da pista. Veja no vídeo:

Pouso no Rio Hudson em 2009

Hudson - Brendan McDermid/Reuters - Brendan McDermid/Reuters
Passageiros de voo da US Airways aguardam resgate nas asas de avião que teve que pousou no rio Hudson (Nova York), em janeiro de 2009
Imagem: Brendan McDermid/Reuters

Um acidente famoso envolvendo colisão com pássaros foi o que levou ao pouso no rio Hudson, ocorrido em Nova York (EUA) em 2009. Um avião Airbus A320 com 155 pessoas a bordo perdeu os dois motores ao colidir com pássaros após a decolagem e ficou incapaz de pousar em qualquer aeroporto próximo.

Essa história foi relatada no filme "Sully: O Herói do Rio Hudson" (2016), e provou que, na aviação, a preparação e a segurança são fundamentais, o que evitou uma tragédia. Naquele dia, o voo 1549 da US Airways partia do aeroporto LaGuardia, em Nova York, com destino a Charlotte, na Carolina do Norte.

Minutos após a decolagem, houve a colisão com um bando de gansos, o que levou à perda de potência dos dois motores. Neste momento, quem pilotava o avião era o copiloto Jeffrey B. Skiles, que ouviu do comandante Chesley "Sully" Sullenberger o aviso de que pássaros estavam logo à frente da aeronave, mas não havia nada que pudesse ser feito no momento.

A única solução encontrada foi pousar no rio Hudson. Nenhum passageiro morreu, e todos foram retirados das águas frias em um estado de saúde relativamente bom, apesar do trauma e do frio.

Em 2019, o UOL realizou uma simulação na Delta 5 Simuladores de como foi o voo e o pouso. Veja: