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REPORTAGEM

Gol será controlada por empresa no Reino Unido; muda algo para passageiro?

Controladora da Gol formou holding com a Avianca, da Colômbia - Divulgação/Gol
Controladora da Gol formou holding com a Avianca, da Colômbia Imagem: Divulgação/Gol

Alexandre Saconi

Colaboração para o UOL, em São Paulo

11/05/2022 17h56

A companhia aérea Gol anunciou nesta quarta-feira (11) que passará a ser controlada por uma empresa com sede no Reino Unido. O acionista controlador da brasileira, o fundo de investimentos em ações Mobi, e acionistas do grupo colombiano Avianca assinaram um acordo para a criação do conglomerado empresarial chamado Grupo Abra. As duas aéreas estarão debaixo do guarda-chuva da holding, mas as operações de cada uma seguem separadas.

Especialistas ouvidos pelo UOL dizem que esse tipo de acordo é comum para as empresas reduzirem custos, pagarem menos impostos e buscarem financiamento mais barato, sobretudo após crises, como a da pandemia. Segundo eles, o movimento não muda a concentração do mercado aéreo brasileiro, que continua alta, e não deve ter impacto nos preços das passagens. Saiba mais abaixo.

'Concentração é normal após crises'

O acordo entre Gol e Avianca segue uma tendência que já ocorreu anteriormente no Brasil, que é a de concentração do mercado. De acordo com Edgard Monforte, professor da FEA/USP (Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da Universidade de São Paulo), de Ribeirão Preto, o anúncio é algo comum e até esperado.

"A concentração de empresas é normal após um período de crise, como o da pandemia. A criação dessa holding pode ser atribuída à questão da crise sanitária", diz.

Essa visão é compartilhada por Oswaldo Sansone Rodrigues Filho, professor do curso de Aeroportos na faculdade de Engenharia Civil do Mackenzie. "Esse movimento acontece, principalmente, em decorrência da pandemia, devido às dificuldades que as empresas tiveram para manter a saúde financeira. É um socorro, uma jogada mais empresarial, um aporte chegando para salvar as empresas", diz.

Segundo os especialistas, as concentrações ajudam as empresas a ganhar escala e reduzir custos. Ao se tornar maiores, elas podem negociar melhores custos, como redução no valor de leasing (espécie de aluguel) de aviões ou com fornecedores.

A Gol também terá vantagens com a mudança da sede para o Reino Unido. "Além de pagar menos impostos, há como fazer operações no mercado financeiro com mais facilidade, com a captação de recursos a custos mais baixos", diz Monforte.

Segundo os especialistas, entre as possíveis vantagens no negócio, destacam-se:

  • Redução nos custos com a integração de rotas
  • Barateamento de manutenção
  • Possibilidade de que compras de suprimentos e negociações sejam feitas em conjunto, gerando economia
  • Maior capacidade na negociação do preço de combustíveis
  • Vantagem tributária (menos impostos) e melhor acesso ao mercado de capitais devido à mudança para o Reino Unido

Concorrência prejudicada?

No Brasil, apenas três empresas dominam o mercado de transporte aéreo. São elas, com a sua respectiva participação na parcela de passageiros pagos até março de 2022:

  • Latam (34,79%)
  • Gol (33,22%)
  • Azul (31,03%)

Para Sansone, a mudança na organização da Gol não deve alterar a disputa entre as companhias brasileiras em um primeiro momento.

"Não mudou o ambiente concorrencial. Não haverá uma empresa nova, já que a Avianca não opera por aqui. Por isso, não vejo alteração no mercado e nem no ambiente de competição", diz.

A concentração atual, segundo Monforte, pode ser ruim, mas o mercado brasileiro não tem condições de aumentar o número de aéreas em atuação aqui.

"Concorrência no setor aéreo é algo desejável. Mas para ter uma concorrência como nos Estados Unidos, o país precisaria ter mais aeroportos e slots [horários para pousos e decolagens]. Enquanto não tiver mais aeroportos competindo entre si, como lá, não teremos essa concorrência", afirma.

    Terá impacto no preço da passagem?

    O acordo não deve ter impacto nos preços das passagens de acordo com os especialistas, porque o setor ainda vem enfrentando uma recuperação difícil por causa da crise da pandemia e da alta dos combustíveis.

    Ao mesmo tempo, como a concorrência não deve mudar, também não há pressão para queda nos preços.

    "O ambiente interno no país se mantém, então não vejo alteração no mercado e nem no ambiente de competição. Como consequência disso, também não vejo impacto no valor dos bilhetes em função desse movimento das controladoras", diz Sansone.

    Para Monforte, é preciso haver mais concorrência para que as passagens caiam, o que não é a situação no momento.

    Concentração é frequente no setor de aviação no Brasil

    A concentração, por meio de fusões e aquisições de empresas, não é algo necessariamente estranho no mercado brasileiro.

    Em entrevistas recentes, o próprio presidente da Gol, Paulo Kakinoff, já havia citado essa possibilidade no horizonte do mercado de aviação nacional, diante da queda da demanda.

    Um dos casos mais recentes foi a tentativa da Azul de comprar a Latam, cuja controladora passa por um processo de reestruturação nos EUA (Chapter 11, similar à recuperação judicial no Brasil). Mesmo com o apoio de alguns dos credores do grupo Latam, a negociação não foi concluída devido ao valor elevado que a Azul teria de desembolsar para a aquisição.

    Diversas empresas já passaram por esse processo de concentração nos últimos anos. Na década passada, a brasileira TAM se fundiu com a chilena LAN, criando a Latam.

    Por sua vez, a Gol incorporou a Webjet em um processo encerrado em 2012. Antes, em 2007, a companhia também havia comprado a Varig.

    Em 2020, a Azul concluiu a compra da Two Flex, em um negócio de R$ 123 milhões.