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Claudia Díaz Guillén, a ex-enfermeira de Hugo Chávez que luta para não ser extraditada para a Venezuela

Mar Pichel - BBC News Mundo

17/12/2018 11h56

Ela passou anos cuidando de Hugo Chávez, pertencia ao círculo de pessoas próximas ao ex-presidente e atuou como tesoureira do governo venezuelano por dois anos.

Mas agora, Claudia Patricia Díaz Guillén teme que a Espanha a extradite para a Venezuela, onde enfrenta acusações de lavagem de dinheiro e peculato.

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Díaz Guillén foi presa em abril deste ano em Madri junto ao marido, Adrián José Velásquez Figueroa, que trabalhou na área de segurança de uma agência do governo venezuelano.

A Justiça da Venezuela acusa o casal de lavagem de dinheiro e enriquecimento ilícito enquanto ocupavam cargos públicos durante o mandato de Chávez.

"Eles nos torturariam, violariam todos os nossos direitos, que por si só já foram violados", afirmou Díaz Guillén em entrevista à BBC Mundo, serviço em espanhol da BBC, quando perguntada sobre o que acha que aconteceria se fosse extraditada para seu país.

Em sua primeira decisão, em outubro, a Audiência Nacional da Espanha deu sinal verde para a extradição, a pedido das autoridades venezuelanas. Mas a defesa de Díaz Guillén recorreu da decisão, alegando que a extradição colocaria a vida de sua cliente em "sério risco".

De efermeira a tesoureira

Díaz Guillén era militar e, em 2001, passou a integrar a Guarda de Honra, encarregada da segurança do presidente. Ela combinou sua carreira militar com a obtenção de diplomas de Enfermagem e Direito na Universidade Central da Venezuela.

Isso a levou a trabalhar, a partir de 2003, na equipe de médicos e enfermeiros de Chávez, onde ficou até 2011, e depois no Escritório Nacional do Tesouro.

Ele afirma que assumiu esses cargos públicos por mérito próprio.

"Sou apresentada simplesmente como enfermeira, sem nenhum tipo de formação, e sou uma mulher que se preparou, estudou e combinou muito bem a carreira militar com a obtenção de duas formações", diz.

Embora ressalte que seu relacionamento com Chávez era "puramente profissional", ela enfatiza que "durante os oito anos em que trabalhou diretamente com ele nas funções de enfermagem, foi criada uma relação de respeito e amizade".

"Lembro dele como uma pessoa muito humana, boa e sensível", acrescentou ela sobre o ex-presidente, que morreu em 2013.

Ela se desligou "completamente das funções de enfermagem" em 2011 - mesmo ano em que Chávez foi diagnosticado com câncer -, quando assumiu o cargo de chefe do Escritório Nacional do Tesouro, cargo que ocupou por dois anos, assim como o de secretária-executiva do Fundo Nacional de Desenvolvimento (FONDEN).

Ambos os postos eram de grande responsabilidade financeira - ela recebia ordens diretamente do ministro da Fazenda, Jorge Giordani.

Mas tudo mudou para Diaz Guillén quando a saúde de Chávez piorou.

"No último estágio da doença dele, o ministro e eu fomos submetidos a uma forte pressão do alto escalão do governo - nessa época, Chávez não podia exercer diretamente (o poder), já nos últimos meses de sua doença, no fim de 2012. E foi aí que começamos a receber instruções totalmente fora da lei, e o ministro (Giordani) e eu recusamos categoricamente", relata.

"Eu e o ministro ficamos muito surpresos de ver como, diante dos últimos momentos de vida do presidente, eles foram capazes de dar instruções deste tipo, como se tivessem se aproveitando do fato de que ele estava em seus últimos dias."

Díaz Guillén se recusa a dizer os nomes das pessoas que emitiram essas ordens "fora da lei" - ela alega que está passando por um processo de extradição e que teme por sua vida. Afirma apenas que eram "altos funcionários".

Segundo ela, uma das instruções tinha a ver com a devolução do pagamento de impostos feito por uma empresa.

Chávez "não estava ciente dessas instruções", explica Díaz Guillén, porque "ele já havia delegado suas funções".

"Uma vez que Chávez morreu - em 5 de março de 2013 - as ordens fora da lei que chegavam ao ministro e a mim foram intensificadas. E nós, categoricamente, dissemos não, que não compactuaríamos com esses pedidos."

Em abril de 2013, ela foi demitida do cargo pelo presidente Nicolás Maduro.

A saída da Venezuela

Díaz Guillén conta que semanas antes de ser demitida, e poucos dias depois da morte de Chávez, o marido dela "foi ameaçado de morte e disseram a ele que precisava sair do país".

"Não deram a ele nem 24 horas para sair, e ele deixou a Venezuela." Foi para a República Dominicana.

Mas Díaz Guillén permaneceu na Venezuela até dezembro de 2014, quando recebeu baixa do serviço militar. E se encontrou com o marido na República Dominicana.

Ela explica que, nesse período em que permaneceu na Venezuela, sua gestão foi auditada por empresas internacionais, como a Deloitte, e também por auditores internos.

"Em nenhum momento fui acionada por qualquer objeção que tenha sido apresentada na administração de recursos", argumenta.

'Panama papers'

Mas as suspeitas contra Díaz Guillén e sua gestão começaram quando o nome de seu marido, Velázquez Figueroa, apareceu nos chamados "Panama papers", em abril de 2016. Nesse mesmo ano, ela e a família se mudaram para a Espanha, onde moram atualmente.

Nesse momento, o Ministério Público da Venezuela abriu uma investigação e emitiu uma ordem de prisão internacional contra o casal por enriquecimento ilícito.

Segundo a procuradoria venezuelana, o casal recebeu a assistência do escritório de advocacia panamenho Mossack Fonseca - no centro do escândalo dos "Panama papers" por ajudar seus clientes a lavar dinheiro, evitar sanções e sonegar impostos - para criar empresas "offshore" e "encobrir" uma fortuna não declarada.

O mandado de prisão contra o casal alega que ambos utilizaram seus cargos públicos para obter vantagens econômicas e "adquirir bens móveis e imóveis em território nacional e no exterior" e aumentar seu capital "de maneira desproporcional à sua renda".

O documento sugere ainda que Velázquez Figueroa é o dono de nove empresas no Panamá.

"As acusações feitas pela Venezuela são totalmente falsas. Minha gestão foi auditada e não houve danos ao patrimônio, como dizem", declarou à BBC Mundo.

Ela admite que o marido abriu duas empresas no Panamá, "o que não é um crime", afirma.

"Meu marido decidiu abrir essas empresas no Panamá para preservar o patrimônio e pelas diferentes flutuações cambiais. Ele tinha uma empresa na Venezuela, e essa empresa tinha contratos nacionais e internacionais, por isso ele se viu obrigado a criar uma empresa no Panamá", respondeu Díaz Guillén ao ser questionada sobre o motivo pelo qual seu marido decidiu criar tais empresas.

Ela também argumenta que seu patrimônio é fruto de seu trabalho e das empresas de seu marido.

"Nosso patrimônio vem do fato de que meu marido é empreendedor desde muito antes da gente se conhecer, é um empresário que teve sucesso", diz.

"É a culpa de um crime que eles querem colocar em nós", acrescenta.

"E como não houve irregularidade na minha gestão, mais de três anos se passaram, e foi quando o nome do meu marido apareceu nos 'Panama papers', é a desculpa perfeita para montar este argumento".

'Troféu político'

Após serem detidos, em abril, as autoridades venezuelanas pediram à Espanha para extraditar o casal.

Díaz Guillén considera que a solicitação tem motivações políticas.

"A Venezuela não quer justiça, querem nos levar até lá para nos exibir como troféus políticos".

Por que iam querer exibir como troféu político uma ex-funcionária que era próxima a Chávez?, pergunto a ela.

"Dizem que o governo Maduro é uma continuidade do governo de Chávez, o que é totalmente falso, porque começaram a emitir diretrizes contrárias às que estávamos seguindo de acordo com a lei", responde.

"E eles querem nos usar como troféus políticos para encobrir exatamente a situação que existe na Venezuela. Caso a Espanha conceda a extradição, a Espanha, que é um país que preza a liberdade, que assinou acordos importantes com organizações internacionais, que acredita que foram cometidos crimes contra a humanidade na Venezuela, ao nos extraditar, está outorgando um caráter democrático à Venezuela", acrescenta.

A Audiência Nacional está analisando separadamente com os pedidos de extradição de Díaz Guillén e Velásquez.

Em despacho datado de 26 de outubro, o tribunal considerou "que foram dados todos os requisitos legais para prosseguir com a extradição" da ex-enfermeira.

A defesa de Díaz Guillén, liderada pelo advogado espanhol Ismael Oliver, recorreu da decisão e está disposta a esgotar todos os recursos possíveis para evitar a extradição. Eles estão aguardando agora um segundo parecer.

Mas no caso de o tribunal espanhol emitir outra decisão favorável à extradição, eles ainda podem recorrer ao Supremo Tribunal e ao Tribunal Europeu de Direitos Humanos, em Estrasburgo, na França.

Eles argumentam que a Venezuela é um país em que os direitos humanos não são respeitados.

"Nós não fugimos da justiça, nosso advogado afirmou à corte que queremos que a Venezuela envie todas as provas que supostamente têm contra nós", diz Díaz Guillén.

"Nós nos colocamos à disposição da justiça, mas o que não queremos é que nos mandem para a Venezuela, um país onde vão nos torturar", argumenta.


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