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Esqueça a economia. Se o assunto é Brasil, o importante é a política

Filipe Pacheco

27/08/2015 14h10

(Bloomberg) - Foram-se os dias em que as decisões de investidores com foco no Brasil se baseavam em relatórios econômicos e em balanços de empresas. Mais do que nunca, gestores estão mais propensos a esmiuçar as manchetes dos jornais nacionais para acompanhar os últimos acontecimentos políticos.

O mercado está ávido por cada novidade vinda de Brasília, em um momento em que a presidente Dilma Rousseff luta por sua sobrevivência política diante de um Congresso que trava as medidas de austeridade tidas como necessárias para evitar o rebaixamento da classificação de risco do país de volta para o grau especulativo. As notícias sobre projetos de lei engavetados, negociações de bastidores e o amplo escândalo de corrupção que se aproxima cada vez mais da própria presidente têm sido mais que suficientes para desencadear reações em negócios com o real, com os títulos de dívida do país e com as ações.

"Eu gostaria de ter formação em Ciência Política", disse Will Landers, um gestor de recursos que ajuda a gerenciar US$ 2,7 bilhões em ações latino-americanas na BlackRock Inc. "Temos que continuar seguindo o noticiário de perto e tentar interpretar o que ele quer dizer para potenciais passagens de reformas, leis necessárias para o ajuste fiscal".

O contexto tem levado a uma expansão nos negócios de firmas de assessoria política como a Eurasia Group e a Arko Advice. A Eurasia, que tem cinco analistas políticos focados na cobertura do Brasil, está contratando para as unidades de São Paulo e Nova York, disse Bruno Reis, diretor da empresa no país. A Arko abriu uma filial em Londres no ano passado e viu um aumento de 25% no número de clientes em 2015, disse Lucas de Aragão, sócio da empresa com sede em Brasília.

"Estamos recebendo uma enxurrada de perguntas de todo o mundo: algumas são dúvidas muito genéricas a respeito do impacto no crescimento, enquanto outros clientes querem detalhes específicos sobre um possível processo de impeachment", disse Aragão, de Brasília. A complexidade do governo do Brasil torna "difícil para os brasileiros de São Paulo ou do Rio entender o que está acontecendo. Para os estrangeiros então, é um desafio ainda maior".

Tributos a acionistas

No dia 18 de agosto, o índice de referência Ibovespa oscilou de uma perda de 1,2% para um ganho de 0,5% após notícias que diziam que um projeto de lei para tributar dividendos de empresas havia sido engavetado. No dia 7 de agosto, o real caiu 1% em apenas dois minutos antes de se recuperar novamente em meio a relatos de que o vice-presidente Michel Temer deixaria a função de articulador principal de Dilma no Congresso. E no dia 16 de julho notícias de que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva seria incluído na investigação desencadeou uma onda de vendas no real.

A Loomis Sayles Co., com sede em Boston e que tem US$ 242 bilhões sob gestão, incluindo bonds e ações do Brasil, neste ano contratou duas firmas de consultoria política e outra que monitora redes sociais para acompanhar postagens no Twitter e em sites em busca de qualquer menção a palavras-chave como "impeachment". José Tovar, CEO da ARX Investimentos, com sede no Rio de Janeiro, que tem cerca de R$ 11 bilhões em ativos, disse que também tem conversado com analistas políticos diariamente.

"É preciso muita criatividade para analisar o Brasil atualmente", disse Bianca Taylor, analista de títulos soberanos do Brasil da Loomis Sayles. "O cenário político é o foco principal".

Notícias ruins

A perspectiva para a economia do Brasil é tão ruim que os traders precificaram a maior parte das notícias negativas. O índice de ações Ibovespa despencou 52% em dólares nos últimos 12 meses e a moeda caiu 38%. Além disso, o desemprego é o mais alto em cinco anos, a inflação supera a faixa-meta definida pelo Banco Central há sete meses consecutivos e a pesquisa do BC com economistas mostrou que o Brasil caminha para sua recessão mais longa desde os anos 1930.

A recuperação da crise depende, em grande parte, da capacidade de Dilma de aprovar medidas fiscais em um Congresso dividido.

Estar a par de cada acontecimento em Brasília tem dado "muito trabalho", disse Reis, da Eurasia. "Entender de política se tornou obrigatório para entender o Brasil".

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