Auditorias devem responder por fraudes em banco, dizem especialistas
A revelação de uma fraude bilionária no banco PanAmericano do empresário Silvio Santos trouxe à tona o debate sobre o papel das empresas de auditorias.
Por que erros contábeis que se arrastavam desde 2006 não foram detectados antes já que a instituição é auditada duas vezes por ano?
Em entrevistas a “Folha de S.Paulo”, o diretor da Deloitte (que audita o PanAmericano desde 2004) Maurício Pires Resende eximiu sua empresa de culpa.
De acordo com ele, o trabalho do auditor é verificar se o dado está correto. “Se alguém maquia [balanço], não é o auditor”, declarou.
Venilton Tadini, diretor do banco Fator, instituição que junto com a auditoria KPMG auditou o PanAmericano para a Caixa Econômica Federal, acusou a instituição de Silvio Santos de fornecer “documentos falsos”.
“Em seus relatórios, as auditorias têm o hábito de afirmar que as contas das empresas estão sendo aprovadas de acordo com as informações fornecidas pelas próprias empresas. Ou seja, uma maneira de transferir a responsabilidade em caso de problemas no futuro”, afirma um executivo de uma instituição financeira que pediu para não ser identificado.
Especialistas ouvidos pelo UOL Economia são unânimes em dizer que, embora seja função da empresa fazer seu balanço, a auditoria também tem sua parcela de culpa caso não detecte uma fraude ou um erro de contabilidade.
“O principal responsável é sempre o administrador da empresa porque é ele que fornece os dados. Agora, o auditor deveria ser responsabilizado também porque ele atestou que aquele número estava bom. Se não é para o auditor se responsabilizar, para que serve a auditoria?”, afirma Luis Fernando Camargo, professor do Insper e ex-funcionário das auditorias Deloitte e PricewaterhouseCoopers.
Camargo, porém, ressalta que é importante analisar caso a caso. Isso porque um problema de contabilidade, por exemplo, pode estar em uma operação que não é auditada, já que o trabalho de auditoria nunca passa por 100% das transações. A fiscalização é feita por amostragem.
“Uma fraude que o auditor não descubra não elimina a culpa dele. Mas a culpa continua sendo da administração da empresa. O que tem de ser apurado por investigação é por que aquela fraude não foi descoberta e se, por um processo normal de auditoria, ela deveria ter sido descoberta”, diz Guy Almeida Andrade, integrante do Conselho de Administração do Ibracon (Instituto dos Auditores Independentes do Brasil).
Durante o processo de auditoria, a empresa contratante precisa fornecer uma “carta de representação”, documento onde ela confirma que entregou tudo o que foi solicitado e assume a responsabilidade por sua veracidade.
“Essa carta não tem o condão de eximir a responsabilidade do auditor. Ela tem o condão de estabelecer, entre o auditor e o seu cliente, qual é o papel de cada um. Se o auditor for processado [por não detectar uma fraude], ele jamais vai levar a carta e dizer: ‘olha, a culpa é do cliente, não é minha’”, afirma Andrade.
Embora não seja comum, qualquer pessoa pode, em teoria, apresentar uma denúncia contra uma auditoria ou auditor registrados na Comissão de Valores Mobiliários (CVM).
Em caso de condenação, porém, a pessoa não receberia nenhuma indenização. Isso dependeria de uma ação na justiça comum.
Andrade compara o serviço da auditoria à inspeção veicular obrigatória na cidade de São Paulo, que mede a quantidade de poluentes emitidos pelos veículos e retira de circulação os que contaminam acima do permitido.
Segundo Andrade, o motorista pode colocar algum produto químico para ludibriar o sistema de avaliação e assim conseguir que o carro seja aprovado. Nesse caso, o culpado pela fraude é o proprietário do veículo, embora a inspeção também deva ser responsabilizada por não ter detectado o problema. Para Andrade, o mesmo vale para as auditorias.
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