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Enel manda conta de R$ 64 mil a comerciante que pagava R$ 300 em média

O comerciante Humberto José de Lima, 60, em frente à loja que recebeu uma conta de luz de R$ 64 mil Imagem: Nivaldo Souza/Colaboração para o UOL

Nivaldo Souza

Colaboração para o UOL, em São Paulo

08/03/2022 04h00

O comerciante Humberto José de Lima, 60, abriu há cerca de cinco anos a distribuidora de água Vila Prudente, na zona leste de São Paulo. No estabelecimento de 50m², onde vende galões de água mineral, o empresário está acostumado a pagar uma conta de energia de cerca de R$ 300 por mês em média. Em dezembro, porém, ele tomou um tremendo susto ao checar o valor da fatura para o mês seguinte no site da distribuidora Enel.

A conta saltou de R$ 251,87 no mês anterior para R$ 64.203,03 em janeiro. A diferença é de 25.391% em apenas um mês. Daria para pagar mais de 21 anos de conta de luz.

Humberto José de Lima em sua loja de águas na zona leste de São Paulo Imagem: Nivaldo Souza/Colaboração para o UOL

Na loja, visitada pelo UOL, existem apenas duas lâmpadas, um refrigerador com porta de vidro e dois computadores. "A conta que me mandaram talvez seria o gasto de uma pequena indústria. Nem uma bela padaria gasta isso por mês", compara o comerciante.

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O valor cobrado pela empresa equivale a mais de três meses de faturamento do estabelecimento, onde Humberto emprega dois funcionários. Ele também atua nas vendas e na entrega de galões nas casas de clientes próximos. "Se eu tiver que pagar essa conta, que é impagável, vou precisar vender a loja", afirma o comerciante.

Desde então, Humberto teve de peregrinar para resolver o problema. Ele conta que procurou uma unidade de atendimento da Enel, e que precisou ir ao local três vezes.

Sem solução e sem dinheiro para pagar a conta, o comerciante procurou auxílio de um vereador da região, cuja assessoria o ajudou a redigir uma reclamação na ouvidoria da distribuidora.

A resposta da Enel foi protocolar. "Depois de fazer uma análise, vimos que o número de dias faturados foi maior que o de costume. Isso quer dizer que neste mês a sua conta tem mais dias de consumo. Mas não se preocupe, a leitura não está errada e nem seu hábito de consumo mudou. Por isso, concluímos que o valor cobrado na sua conta está certo", disse a empresa.

Parcelamento sem aval

O empresário afirma que a Enel parcelou automaticamente o total em duas prestações de pouco mais de R$ 31 mil, com o primeiro vencimento em 4 de fevereiro.

O advogado especializado em direito do consumidor Angelo Bueno observa que parcelamentos ou renegociações de valores atrasados só podem ocorrer com a concordância expressa do consumidor. "Caso contrário, não terão qualquer validade", afirma.

Corte de luz

Fatura digital do comerciante, com uma conta de luz de R$ 64 mil Imagem: Nivaldo Souza/Colaboração para o UOL

Sem poder arcar com a fatura, e três dias após o vencimento da primeira parcela, a Enel cortou a energia do comércio. Por lei, como observa Bueno, em casos de inadimplência, a distribuidora deveria notificar o cliente duas semanas antes da suspensão do fornecimento. "O consumidor tem 15 dias para pagar o débito ou então poderá sofrer o corte de energia dentro do prazo de 90 dias", observa o advogado.

O estabelecimento da Vila Prudente ficou sem o suprimento de energia entre 7 e 26 de fevereiro. Humberto precisou recorrer à barbearia ao lado para conseguir uma tomada emprestada. "Foram três semanas sem luz. Mas ainda bem que meu vizinho me emprestou energia com uma extensão", conta.

Posteriormente, a distribuidora estendeu o prazo do primeiro pagamento para 4 de março. Com a prorrogação, o empresário solicitou o religamento da energia. A empresa atendeu ao pedido. Mas ele ainda temia um novo corte por falta de pagamento.

Enel reconhece erro

Enel cortou fornecimento de energia elétrica do comerciante e, depois, reconheceu erro de leitura e corrigiu a falha na fatura Imagem: Nivaldo Souza/Colaboração para o UOL

O UOL procurou a Enel por email para perguntar sobre o caso. Em nota encaminhada na última quinta-feira (3), a empresa informou que "após análises, identificou um erro na leitura do consumo de energia realizada no mês de dezembro de 2021" e que "em contato com o cliente, a empresa esclareceu que cancelou o valor cobrado referente a essa fatura."

Segundo Humberto, a companhia enviou um técnico ao local, onde preencheu um formulário com dados do medidor de energia e orientou empresário a voltar ao posto de atendimento na Vila Prudente para corrigirem o valor. "Não seria mais lógico o técnico mesmo encaminhar o relatório internamente e resolver o problema?", questiona o comerciante.

Após a saída do técnico, segundo Humberto, as contas com valores elevados "sumiram" do seu cadastro de cliente no site da Enel.

Disparada de reclamações

De acordo com o Procon-SP, o número de reclamações registradas no órgão classificadas como "cobrança indevida/abusiva" por parte da Enel saltou de 3.514 em 2019 para 82.515 em 2020. Um aumento de 2.248%.

A disparada de 2020, segundo o Procon, ocorreu em função da dificuldade de os técnicos da empresa fazerem a leitura dos medidores residenciais, calculando o valor das contas pela média de consumo de energia. Com o aumento de queixas, a Enel liberou a autoleitura dos medidores pelos consumidores. O resultado foi a queda de reclamações no ano seguinte.

Em 2021, as reclamações caíram para 20.854. Apesar do recuo, o número de queixas ainda foi 494% maior que o verificado em 2019.

O Procon-SP orienta consumidores nos casos de contas com valor acima do normal. O atendimento é feito presencialmente nas unidades do Poupatempo, mas é preciso agendar pelo site.

O que fazer se cobrança for abusiva?

Bueno avalia que nos casos de aumento desproporcional no valor na conta o consumidor deve comparar o nível de consumo de energia com meses anteriores.

De acordo com o advogado, caso haja discrepâncias consistentes o passo seguinte é acionar a distribuidora para solicitar uma revisão.

Em caso de recusa, é preciso registrar queixa no Procon e na Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), solicitando que a empresa apresente o cálculo de como chegou ao valor da conta.

"Cabe pedido de danos morais e materiais pelo corte de energia e cobrança indevida. Na ação, a distribuidora deverá provar a licitude do reajuste, demonstrando os cálculos e medições que autorizam o incremento no valor da conta de energia", complementa Bueno.

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