Governo lança programa de hedge cambial para investimentos verdes com recursos do BID e do Fundo Clima
Por Fabricio de Castro
SÃO PAULO (Reuters) - O governo anunciou nesta segunda-feira o programa Eco Invest Brasil, com o qual vai oferecer proteção cambial para investimentos estrangeiros em projetos sustentáveis no país, por meio de operações com derivativos cambiais e linhas de financiamento específicas.
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Na primeira parte do programa, relacionada aos derivativos cambiais, o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) disponibilizará 3,4 bilhões de dólares para operações com derivativos que forneçam hedge (proteção) de projetos sustentáveis de prazos mais longos, superiores a dez anos.
Neste programa, antecipado pela Reuters na sexta-feira, o apoio do BID atuará como intermediário na contratação de um banco internacional que oferecerá o seguro cambial no Brasil. Caberá ao Banco Central fazer a ponte para que os investidores dos projetos ecológicos no país possam acessar os derivativos cambais.
Poderão ser utilizados diferentes derivativos cambiais nas operações, como opções cambiais e swaps -- que neste caso não se confundem com a atual dinâmica de leilões diários de swaps promovidos pelo BC.
Na prática, pelo Eco Invest Brasil empresas interessadas em projetos sustentáveis no Brasil poderão procurar instituições financeiras habilitadas pelo BID, que receberá o repasse de recursos do banco interamericano por meio do Banco Central.
De acordo com o Tesouro Nacional e o BID, as operações serão realizadas conforme a demanda dos investidores.
A segunda parte do programa diz respeito à disponibilização de recursos por linhas de crédito específicas, para investimentos sustentáveis.
Neste caso, o BID ofertará 2 bilhões de dólares, que se juntarão aos recursos, já disponíveis atualmente, no Fundo do Clima -- instrumento da Política Nacional sobre Mudança do Clima que apoia projetos e financiamentos de empreendimentos para mitigar mudanças climáticas. O valor do BID se juntará aos cerca de 10,4 bilhões de dólares que hoje já compõem o fundo.
Estes recursos serão utilizados, conforme o secretário do Tesouro Nacional, Rogério Ceron, para bancar linhas de crédito específicas disponíveis para projetos de economia sustentável.
Serão quatro linhas de crédito. A linha de Blended Finance fornecerá de 10% a 15% do valor do financiamento para investimento no Brasil, desde que o montante restante seja captado no mercado internacional. O prazo será de até 25 anos.
A linha de Liquidity Facility buscará atuar em eventos de desvalorização cambial que possam afetar os investimentos feitos no Brasil. O prazo também é de até 25 anos.
Outra linha, de Foreign Exchange Derivatives, permitirá que o mercado privado desenvolva soluções de derivativos, como swaps e opções, que atendam à demanda por hedge.
A quarta linha será voltada para a estruturação de projetos (Project Structuring).
"A alocação inicial (nas linhas) depende um pouco do apetite das instituições financeiras", explicou Ceron. Segundo ele, a expectativa é de que sejam ofertados de 1 bilhão a 2 bilhões de dólares por ano no conjunto das linhas. "O que a gente sentir que está funcionando bem, a gente vai viabilizando."
Assim, o BID disponibilizará ao todo 5,4 bilhões de dólares ao programa. Outros 10,4 bilhões estão no Fundo Clima atualmente. Por fim, haverá ainda um aporte de 1 bilhão de dólares do Reino Unido, sendo que os recursos serão utilizados neste caso no financiamento de um verificador independente do programa.
Durante a coletiva, o chefe de assessoria econômica do Tesouro, Mario de Almeida, não descartou que haja alguma suplementação adicional do governo ao Fundo Clima no decorrer de 2024. "Mas é um processo normal de suplementação financeira", minimizou, ao ser questionado se haverá recursos do Tesouro no programa.
IMPLEMENTAÇÃO E OBJETIVOS
Em nota, o Ministério da Fazenda afirmou que, diante da volatilidade do real, o custo da proteção cambial para prazos mais longos é tão alto que inviabiliza atualmente investimentos ecológicos em moeda estrangeira no país. Por isso a importância do novo programa.
"O seguro promete cobrir a diferença cambial, assegurando que o investidor possa comprar dólares por uma taxa previamente definida, minimizando, assim, suas perdas", afirmou.
O novo programa será implementado com a edição de uma medida provisória e a posterior regulamentação pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), com o detalhamento de como os derivativos cambiais poderão ser acessados.
Na solenidade de anúncio do programa, em São Paulo, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse que o BC não tem como objetivo controlar a volatilidade da moeda norte-americana com os derivativos cambiais.
"O Banco Central não toma nenhum tipo de risco de crédito em derivativo cambial", afirmou Campos Neto durante entrevista coletiva ao lado de autoridades do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e do governo brasileiro. "O objetivo do instrumento é facilitar o hedge cambial no longo prazo."
Campos Neto pontuou ainda que não existe nenhuma operação sendo estudada que use reservas cambiais.
LEILÕES DE SWAP
Presente a uma coletiva técnica após a apresentação do programa, o diretor de Política Monetária do BC, Gabriel Galípolo, também procurou diferenciar a parte do programa lançado nesta segunda-feira que trata de derivativos cambiais dos leilões de swaps que o BC já faz atualmente.
Enquanto o programa anunciado nesta segunda-feira visa a oferta de derivativos de longo prazo, superiores a dez anos, os leilões atuais do BC abarcam operações de até 12 meses.
Nas conversas com o mercado, conforme Galípolo, surgiu a percepção de que nos leilões o BC poderia ofertar contratos com prazos mais longos, de até 18 meses.
Sobre isso, Campos Neto esclareceu: "Quando tivermos coisa mais concreta (sobre swaps de 12 a 18 meses), vamos repassar (ao mercado)", afirmou.
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, não pôde comparecer ao evento após ser diagnosticado com Covid-19, o que também coloca em dúvida sua participação presencial nas reuniões do G20 nesta semana em São Paulo.