UOL - O que o consumidor da próxima década quer?
Pedro Bianchi - O consumidor da próxima década não quer ter nada, ele quer usar tudo e não ter nada. Isso significa que o varejista precisa se adequar, seja na forma de comunicação, seja na forma de vender também. Muito provavelmente vamos migrar de uma forma ainda experimental para algo como assinatura de eletrodoméstico. Quebrou meu micro-ondas, eu ligo para o meu varejista e ele vai me dar outro em troca de uma mensalidade.
Esse consumidor é quase um nômade porque muda de emprego e de cidade de uma forma muito rápida, e os varejistas terão de acompanhar. Como ele muda rapidamente, não quer ter três televisões ou uma geladeira grande porque não sabe se na próxima casa caberão a geladeira ou as televisões.
Esse movimento já vai começar na próxima década?
Acredito que sim. No mundo atual, é difícil prever 10 anos, mas vendo o comportamento deste consumidor hoje, que é um consumidor de assinatura, assina qualquer serviço, mas não adquire, com certeza o padrão de consumo vai mudar.
Esse consumidor se importa muito com a ética, o meio ambiente, a sustentabilidade. Falando da Ricardo Eletro, em Minas Gerais, todas as nossas lojas são sustentáveis. Temos comprado energia limpa para neutralizar a nossa emissão de poluentes. Pretendemos fazer isso em todas as nossas lojas.
Trabalhamos com a questão da diversidade, incentivando a contratação de pessoas com deficiência e contratando as mães dessas pessoas, porque muitas vezes elas não conseguem emprego.
A crise mudou o hábito de consumo dos brasileiros. O que elas estão comprando agora?
Mudou porque o mundo de hoje é um mundo quase que descartável. A minha mãe, dos anos 1980 aos 2000, tinha a mesma máquina de lavar roupa, a geladeira também. Isso acontece porque a durabilidade dos produtos e a tecnologia mudaram de forma significativa.
As pessoas estão menos preocupadas com a duração dos produtos, mas querem que eles funcionem enquanto estão usando. Os produtos precisam ser mais versáteis, ocupar menos espaço porque as casas são menores. Produtos mais pesados e com pouca versatilidade ficam nas prateleiras por mais tempo.
Os produtos nacionais têm condição de competir com os importados?
Esse é um tema muito difícil. Ainda que tenhamos uma indústria nacional que, muitas vezes, depende de matéria-prima importada, especialmente, da China.
É uma dificuldade da indústria brasileira e precisamos entender se esse liberalismo total dentro de um ambiente de guerra comercial ainda funciona no Brasil.
É preciso olhar com atenção para a indústria nacional, pois é uma indústria geradora de empregos, que tem qualidade, e os nossos produtos nacionais não têm nada a dever aos produtos importados.
Existe uma diferença entre o consumidor brasileiro e os de outros mercados?
Existe. O consumidor brasileiro gosta muito de marca aspiracional. É importante para o consumidor brasileiro ter acesso à marca X ou Y porque essa marca traz embutido um sonho de consumo.
Muitas vezes ele ainda olha a marca. Em mercados mais maduros, a marca é menos importante. Eles olham mais o que o produto tem e suas vantagens.
Qual o objetivo da Ricardo Eletro nos próximos anos?
O nosso objetivo para 2020 é abrir 100 lojas em cidades de 50 mil a 80 mil habitantes, com dois a três colaboradores e um mix de produtos que vendem de forma rápida. O que não tivermos em estoque o consumidor poderá acessar o site e comprar o produto dentro da própria loja.
Ainda há espaço para o crescimento dos grandes grupos de varejo no país?
Há espaço, mas o diferencial dos grandes grupos não é ter a televisão de modelo A ou o aparelho celular modelo B. Atualmente o diferencial é a experiência do consumidor, com serviços agregados e como facilitar para que esse consumidor tenha aquele produto, seja com crédito, com uma entrega rápida, um serviço de pós-venda.
Como a Ricardo Eletro está trabalhando a experiência de compra na internet?
A Ricardo Eletro entende que é um modelo híbrido. O acesso a um refrigerador ou a uma televisão é uma conquista, um sonho, não é um clique apenas.
O consumidor, em especial o brasileiro, ainda requer a necessidade de tocar o produto, da loja física, do atendimento. Mesmo porque, muitas vezes, esse consumidor não tem a sofisticação de acessar a internet, do cartão de crédito para fazer o pagamento.
A loja física e a virtual vão ter preços iguais?
Sim, com certeza. O custo da loja física é maior porque há uma estrutura de aluguel, funcionários, mas esse custo vem sendo reduzido cada vez mais.
O ponto ainda é determinante para o varejo? A localização, o tamanho?
Ainda é, mas cada vez menos. É lógico que você estar em uma rua com comércio elevado e bastante movimento traz mais visibilidade. Mas com a maior facilidade de deslocamento, o ponto tem sido menos relevante.
A Inteligência Artificial vai dominar o varejo?
Acredito que sim, mas o vendedor não vai deixar de existir. O relacionamento e a humanização do vendedor ainda é um diferencial.
Eu acredito que a Inteligência Artificial e todos os sistemas em torno dela vão ajudar o vendedor a explicar o produto, a entender o que o consumidor quer, mas o olho no olho ainda é insubstituível.