Investir em ações de fora

Dá para aplicar em papéis de gigantes estrangeiras via BDRs ou fundos; veja vantagens e cuidados

Rejane Aguiar Colaboração para o UOL, em São Paulo Getty Images
Aly Song/Reuters

Não seria por falta de opções que os investidores brasileiros deixariam de diversificar as aplicações. Hoje a oferta de produtos e ativos é tão ampla que inclui a possibilidade de investimento em grandes empresas estrangeiras, algo impensável para as pessoas físicas até há pouco tempo.

De maneira fácil e nada burocrática, os brasileiros já podem ser sócios de companhias gigantes que fazem parte da vida cotidiana. Nomes como Apple, Amazon, Disney, Facebook, Uber, dentre muitos outros, estão na cesta à disposição dos investidores nacionais.

A oferta variada e a facilidade cada vez maior do investimento em ativos estrangeiros de Bolsa são uma ótima notícia, mas que deve ser acompanhada de cautela redobrada, recomendam os especialistas. Por dois motivos principais:

  • 1

    Avaliação

    Primeiro porque a seleção de boas empresas exige um trabalho minucioso de avaliação de suas operações, considerando o cenário atual e as perspectivas para o setor, dentre muitos outros fatores.

  • 2

    Câmbio

    Em segundo lugar, investir em empresas de outros países insere na equação a questão do câmbio, em geral bastante complexa.

Mercado em ascensão

Faz parte da agenda regulatória da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o órgão responsável pela regulamentação e pela fiscalização do mercado de capitais no Brasil, a flexibilização dos investimentos de pessoas físicas em ativos estrangeiros.

O investimento em alguns tipos de "Brazilian Depositary Receipts" (BDRs), por exemplo, recentemente foi autorizado para pequenos investidores. Antes, alguns desses papéis só podiam ser comprados por investidores de maior porte (chamados de qualificados). Os BDRs são recibos negociados na B3 que representam ações de empresas listadas em mercados internacionais.

Fundos de investimentos em ações no exterior

Também por causa da queda do rendimento da renda fixa, com a Selic em 2% ao ano, os fundos de investimento em ações no exterior têm se apresentado como alternativa de diversificação para os investidores brasileiros.

Os números da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) comprovam a alta, superior à apresentada pela indústria de fundos em geral.

Patrimônio líquido (PL)

  • Agosto 2019: R$ 72,382 bilhões
  • Agosto 2020: R$ 89,093 bilhões
  • Variação: 23,08%
  • Variação do PL da indústria brasileira de fundos no período: 10,4%

Fonte: Anbima

Alvin Chan/SOPA Images/LightRocket via Getty Images

O caminho da compra direta de BDRs

Há alguns caminhos possíveis para um investidor brasileiro diversificar sua carteira com ações de empresas estrangeiras. Tendo uma conta em uma corretora de valores, ele pode comprar diretamente na B3 (a Bolsa de Valores brasileira) os BDRs.

Por exemplo, para se tornar sócio da Disney, o investidor compra na Bolsa brasileira o BDR cujo código é DISB34. Esse ativo, embora não seja a ação propriamente dita da empresa, é um recibo que representa esse papel. Assim, o BDR DISB34 acompanha as variações do preço da ação no mercado americano, onde a The Walt Disney Company está listada.

Vaivém de preços + câmbio

Isso não significa, no entanto, que o retorno para o investidor está vinculado apenas a essas variações. A rentabilidade em determinado período inclui a alta ou baixa do papel no exterior mais a variação das cotações do dólar no Brasil.

A combinação dessas duas variáveis —vaivém de preços e câmbio— pode ser boa ou ruim. Imagine que a ação da Disney subiu muito num certo mês, mas que o dólar se valorizou ainda mais no Brasil. No fim das contas, nessa hipótese, o investidor sai perdendo.

Investidor precisa ter muito conhecimento

A complexidade da administração dessas variáveis pelo investidor é o principal fator que leva muitos especialistas a desaconselhar a compra direta de BDRs.

Segundo Gisele Colombo de Andrade, CFP, planejadora financeira e membro do conselho de administração da Associação Brasileira dos Planejadores Financeiros (Planejar), o investidor precisa ter muito conhecimento —e muito tempo disponível— para avaliar as empresas e escolher as que se encaixam na sua carteira e no seu horizonte de investimento.

Afinal, a seleção de empresas requer interpretação de relatórios, de balanços, de profundas análises sobre as perspectivas do seu setor de atuação, entre outros documentos. E, no caso dos BDRs, todo esse material normalmente está em inglês e é referente a operações globais gigantescas.

É muito difícil para o investidor fazer todo esse trabalho sozinho. Como poder avaliar as centenas de empresas integrantes do Standard&Poor's 500 ou as milhares listadas na Nasdaq? A análise de ações é uma tarefa muito complexa, mais recomendável para especialistas.

Gisele Colombo de Andrade, planejadora financeira CFP

Guilherme Dionízio/Estadão Conteúdo

A mordida do Leão

Gisele Andrade também ressalta que, comprando diretamente os BDRs, o investidor vai ter que colocar na conta os impostos. Segundo ela, o custo tributário para o investidor envolve:

  • Entre 15% e 22% de imposto sobre ganho de capital (que ocorre quando o investidor vende uma ação a um preço mais alto do que comprou)
  • 15% sobre a variação cambial
  • 27,5% no recebimento de dividendos (já que se trata de empresas estrangeiras)

Assim, além de escolher as melhores empresas e analisar as possibilidades do câmbio, o investidor terá que fazer um planejamento tributário adequado.

Getty Images/iStock

A via indireta dos fundos

Então, se os BDRs estão na B3, mas é aconselhável que a pessoa física evite a compra direta se não tiver tempo e conhecimento de mercado suficientes, qual o caminho para as ações das gigantes globais? A alternativa são fundos de investimento no exterior, especificamente fundos de ações no exterior.

O acesso às gigantes mundiais por meio de fundos tem algumas vantagens. A mais evidente é o fato de as gestoras contarem com experientes equipes de analistas, vivência diária nos mercados, algoritmos que ajudam na seleção dos melhores ativos e amparo de times especializados no exterior.

Fundo escolhe cerca de 40 BDRs

É o caso, por exemplo, da Western Asset, que faz parte de um conglomerado internacional do mercado financeiro. De acordo com Maurício Lima, gestor de portfólio, é minucioso o trabalho de análise para a escolha dos cerca de 40 BDRs de grandes empresas que fazem parte do fundo Western Asset FIA BDR Nível I. O objetivo é que a carteira gere valor para o investidor também considerando a questão do câmbio.

Os analistas observam em profundidade as operações das empresas —muitas delas com atuação em várias partes do globo, com realidades muito diferentes—, os resultados financeiros, as possibilidades de crescimento e o preço a que a ação está sendo negociada no mercado, para citar apenas alguns pontos de atenção.

Lima ressalta que a expertise da equipe de análise é fundamental: os profissionais conseguem acompanhar detalhes da operação das empresas que poderiam passar despercebidos pelos investidores que compram diretamente BDRs.

Ele dá um exemplo, do recibo da ação da Nvidia, empresa que atua no mercado de chips gráficos. Uma gestão profissional consegue perceber, nesse caso, que a ação da Nvidia é uma boa oportunidade de investimento no setor de games, detalhe que o investidor sozinho poderia não captar —ele poderia achar que é mais uma das muitas empresas fabricantes de chips.

Facilidade ao investir e liquidez

A facilidade de aporte é outra vantagem dos fundos quando se fala em investimento no exterior. Existem muitos fundos desse tipo em plataformas.

Comprar a cota de um fundo de BDR dá o mesmo trabalho de investir em um fundo DI.
Maurício Lima, gestor de portfólio da Western Asset Management

Há, ainda, a questão da liquidez. Depois do pedido do resgate de cota, o investidor recebe o dinheiro na conta em pouco tempo (D+5).

Atenção a taxas e impostos

Em contrapartida, todo esse trabalho das gestoras tem um preço —e ele atende pelo nome de taxa de administração. No caso dos fundos de ações que investem em ativos no exterior essa taxa varia muito dependendo da gestora, mas, em geral, fica entre zero e 1,5% ao ano.

Essa taxa é todo dia descontada do valor das cotas, de maneira proporcional à taxa anual. Assim, quando o gestor divulga a cota do dia, ela já está descontada da taxa de administração.

Taxa para o gestor que teve bom desempenho

É importante, ainda, que o investidor esteja atento à eventual cobrança da chamada taxa de performance. Ela é um percentual que fica com o gestor caso ele consiga superar um índice de referência em determinado período, proporcional a esse adicional. Funciona como uma espécie de prêmio para o gestor que conseguiu se sair bem.

As informações sobre taxas de administração e taxas de performance têm que estar na documentação referente ao fundo.

Mensalmente, a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima) divulga um balanço completo da indústria brasileira de fundos, que tem informações sobre essas cobranças. É recomendável, no entanto, que o investidor tome cuidado ao fazer comparações simplistas entre as taxas —afinal, elas são referentes a fundos que podem ter muitas diferenças entre si.

A mordida do Leão

E, assim como na compra direta de BDRs, os fundos não escapam do Fisco. A mordida do leão é de 15% para os fundos de renda variável —incluindo os fundos de BDRs—, montante que incide sobre o rendimento e que o investidor só paga no resgate.

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