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Carla Araújo

REPORTAGEM

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Ordem no Planalto é tratar rachadinhas como assunto "de fora do governo"

Flavio, Jair e Carlos Bolsonaro, a suspeita de rachadinha em família - Reprodução/Flickr
Flavio, Jair e Carlos Bolsonaro, a suspeita de rachadinha em família Imagem: Reprodução/Flickr

Eduardo Militão e Luciana Amaral, do UOL, em Brasília

15/03/2021 12h33Atualizada em 15/03/2021 14h14

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Ministros e auxiliares do presidente Jair Bolsonaro minimizaram as suspeitas de que o esquema de rachadinhas acontenciam também no gabinete de Bolsonaro quando ele era deputado.

A avaliação é que por se tratar de supostos crimes cometidos no passado, o ideal é deixar o assunto o mais distante do Palácio do Planalto possível. A argumentação, porém, nem sempre bate com a realidade da história de escândalos de corrupção, inclusive na gestão de Bolsonaro.

Reportagem exclusiva do UOL aponta que a quebra de sigilos bancário e fiscal de pessoas e empresas ligadas ao senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) revela indícios de que o esquema da rachadinha também ocorria nos gabinetes do pai quando este era deputado federal, e do irmão, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ).

Segundo a reportagem, funcionários do então deputado federal sacavam 72% do que recebiam em espécie e que uma conta da então cunhada do presidente foi zerada pela ex-mulher dele.

Ministros ouvidos pela coluna disseram que o presidente não tratou do tema nas conversas de hoje cedo e tentaram reforçar a tese de que não há razão para pronunciamentos já que "isso não é problema do governo".

Alguns auxiliares que comentaram o teor das reportagens disseram que dificilmente haverá algum posicionamento oficial do Planalto. Para eles, por mais que se tenham fortes indícios, ainda faltaria uma "prova mais concreta" do esquema.

Um interlocutor lembrou que Bolsonaro costuma reagir com impulsividade e até agressividade quando há suspeitas em relação aos seus filhos. Agora, porém, essa mesma fonte diz que a estratégia do presidente, se ele seguir o conselho dos auxiliares, deve ser a de ignorar as acusações.

Do ponto de vista jurídico, Bolsonaro está em situação confortável. Crimes cometidos fora do mandato só podem ser investigados depois que o presidente deixa o cargo.

Um general ouvido pela coluna, mas que não atua mais no Planalto, considerou as acusações "gravíssimas", mas afirmou que "carecem de provas".

O UOL pediu novos esclarecimentos à Secretaria de Comunicação da Presidência. Eles serão publicados se forem recebidos.

Ala ideológica ataca

Enquanto a lei do silêncio ainda impera entre os principais auxiliares do presidente, alguns membros do governo ligados a chamada ala ideológica optaram por tentar desqualificar a reportagem.

A percepção é de que o tema tira a atenção de movimentos de apoio ao governo. Essa foi a avaliação do secretário de Cultura do governo, Mário Frias, e um subordinado dele, André Porciúncula, que foram às redes sociais comentar a reportagem.

As revelações das informações seriam "clara tentativa de pautar a opinião pública para longe dos protestos de ontem", disse Porciúncula. Frias retransmitiu a mensagem e acrescentou: "Narrativas pobres".

Apoio do Congresso

Líderes do governo no Congresso Nacional também adotaram o discurso de dizer que o assunto não é uma questão relacionada à atuação do Planalto no Parlamento e de minimizar o impacto das revelações perante a opinião pública.

Um líder do governo falou que a investigação está na "esfera da Justiça do Rio de Janeiro e vai se resolver por lá".

O parlamentar lembra que o Conselho de Ética ainda não abriu processo contra o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) e defende que o entendimento atual é de que ele não deve ser investigado no Senado por atos anteriores à sua chegada na Casa.

A oposição, porém, discorda desse argumento e afirma haver uma blindagem do governo a Flávio.

Casos fora de governo costumam atrapalhar gestão

Apesar do discurso dos auxiliares do presidente, é fato que supostos crimes cometidos por membros de um governo fora de uma gestão atrapalham a administração.

Em 2004, o escândalo Waldomiro Diniz arranhou a imagem da Casa Civil, comandada pelo então ministro José Dirceu, apesar de os fatos terem ocorrido no Rio de Janeiro em 2002, antes da gestão de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) na presidência.

O governo Bolsonaro já acumulou sete casos de corrupção. O presidente mostrou uma contradição ao lidar com alguns destes episódios.

Bolsonaro chegou a dizer que mandaria embora assessores envolvidos em crimes. Um ministro, Marcelo Álvaro, foi denunciado pelo Ministério Público no caso do "laranjal". O presidente disse que tomaria uma decisão sobre o cargo dele se ele fosse apenas indiciado pela polícia. Porém, Álvaro permaneceu no posto normalmente e só saiu após um desentendimento com o colega Luiz Eduardo Ramos.