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Acampamento contra capitalismo em Londres tem espaço de meditação, biblioteca e até almoço grátis

Juliana Carpanez

Especial para o UOL Economia <br> Em Londres

29/10/2011 07h00

Tradicional ponto turístico de Londres, a catedral de Saint Paul --onde o príncipe Charles e a princesa Diana se casaram em 1981-- vem recebendo nos últimos dias uma quantidade muito maior de visitantes que a normal. Essas pessoas, no entanto, não querem necessariamente conhecer a igreja, mas sim conferir de perto a manifestação contra o capitalismo iniciada no último dia 15, que levou cerca de 200 pessoas a acamparem no local. "Me sinto no zoológico", brincou o britânico Robin Smith, 48, ao posar para a foto que ilustra esta reportagem --veja no álbum.

Engenheiro de formação, Smith está há 13 dias no acampamento que tem cozinha cheia de doações, oferece refeições gratuitas (contrariando a máxima de que "não há almoço grátis"), conta com centro de informações, biblioteca, espaço para meditação e área de primeiros socorros. Essa estrutura é organizada em barracas, onde os manifestantes deixam seus pertencem e dormem --todos os entrevistados garantiram dormir no local, sim, esbravejando contra a reportagem do "Daily Mail" que sugere a troca das barracas por hotéis durante a noite.

Havia também banheiros químicos no local até alguns dias atrás, mas eles foram levados embora. Agora resta aos manifestantes contar com banheiros públicos e de estabelecimentos comerciais da redondeza.

A vida no acampamento, garante Smith enquanto toma um café comprado por ele na rede Starbuck's, não é das piores. Depois de duas noites, ele se acostumou a dormir na barraca e, na semana passada, quando a temperatura chegou a 2ºC durante a madrugada, ele conseguiu se proteger do frio entrando no saco de dormir. Banho ele toma na casa de amigos, em uma estação de trem ou em sua própria casa, em Workingham. E o engenheiro continua acessando a internet e postando em seu blog via conexão 3G do computador tablet que levou ao acampamento urbano.

A manifestação não tem data certa de encerramento, mas fala-se que pode chegar até o Natal.

Emprego

Assim como os outros entrevistados, Smith não deixou seu trabalho para protestar. Ele tem uma fundação de análise econômica e, à reportagem do UOL, disse viver com o dinheiro que ganhou com ações durante a bolha da internet (estourada em 2000). "Estou aqui em solidariedade à classe média deste país e de todo o mundo, que está cada vez mais pobre."

O alemão Marvin, que não quis dar seu sobrenome, tem 19 anos e trabalha no ramo de construção em seu país, onde ganha 7,5 euros por hora. Ele está de férias, mas considera continuar no acampamento e não voltar ao trabalho. "Depois arrumo outro. Lá eles me pagam o mínimo e é importante que eu fique aqui", disse.

A entrevista com Marvin tem de fundo um músico que consegue empolgar manifestantes e atrair turistas com seu violão tocando "Get up, Stand up", de Bob Marley. O ápice é o trecho em que o cantor anônimo pede, usando a letra do famoso reggae, para que não desistam da luta.

Assistindo ao show na entrada de sua própria barraca estavam os franceses Thomas Jah, 19, e Andy, de 20 anos, que também não quis dar o sobrenome à reportagem (o argumento é a preocupação com as buscas online). Os dois se mudaram para a Inglaterra há cerca de um mês para aprender a falar inglês e, há onze dias, estão acampados em frente à catedral de Saint Paul.

"Estamos protestando contra o capitalismo, o sistema, a política e aqueles que têm muito dinheiro, enquanto não temos nada", disse Jah, num discurso bastante genérico. Apesar de viver no alojamento e tomar banho na casa de amigos, o jovem trabalha como garçom no sofisticado bairro do Soho. Seu amigo Andy diz que vai esperar o fim da manifestação --e do acampamento onde mora-- para procurar emprego.

A artista plástica britânica LG White, 35, é uma das poucas mulheres encontradas pela reportagem que está vivendo no local. Acampada desde o início do movimento,  ela afirma que o mais interessante do acampamento é ver as pessoas debatendo assuntos importantes para a sociedade, que estavam sendo deixados de lado. "Muitos de nós somos da classe média, trabalhadores. Não somos um monte de hippies", afirmou.