Afinal, o que o governo e o BC podem fazer para conter a alta do dólar?
O dólar comercial tem mais um dia de alta nesta terça-feira (2), após o presidente Luiz Inácio Lula da Silva dizer que o governo precisa tomar alguma atitude para conter a elevação da moeda americana. Mas o que Lula e o BC podem fazer para deter essa escalada? Economistas ouvidos pelo UOL respondem.
O que acontece com o dólar
Dólar vem subindo no mundo todo por conta do momento econômico dos Estados Unidos. O principal motivo para a alta do dólar está nos juros americanos, que se mantêm em patamar elevado, levando a uma depreciação das moedas de países emergentes como o Brasil.
No Brasil, a valorização do dólar foi mais acentuada, porém. Enquanto o real se desvalorizou cerca de 13,8% em 2024, o peso teve queda de 12,7%, e o peso mexicano, 8%.
O que o governo pode fazer
Há estresse no mercado devido à questão fiscal. Um dos principais motivos do tombo maior do real frente ao dólar está na falta de uma sinalização clara do governo sobre a questão fiscal. O presidente Lula disse que não tomará decisões de cortes de gastos que afetem a população mais pobre, como a desvinculação de benefícios do reajuste do salário mínimo.
A base é a questão fiscal. E quando o governo começa a interditar possíveis portas de saída, o mercado começa a ficar estressado e o câmbio se comporta dessa maneira. Precisaria haver uma mudança de discurso do Lula, de dizer que o governo precisa olhar para a estrutura de gastos.
Sergio Vale, sócio e economista-chefe da MB Associados
Falas recentes do presidente Lula aumentaram a tensão do mercado. Uma medida para acalmar os ânimos seria mudar o tom do presidente tanto na questão fiscal quanto nas críticas ao Banco Central, dizem economistas. "Foi essa postura do governo e do presidente que deu esse impulso para a variável do câmbio", diz Silvio Campos Neto, sócio e economista sênior da Tendências Consultoria.
Falas de Lula contrastam com falta de sinal claro do Ministério da Fazenda sobre a meta fiscal. Isso gera um ruído na comunicação e aumenta a sensação de incerteza, o que leva o mercado a trabalhar com um cenário de maior risco.
O presidente tem direito de defender sua agenda. Porém, quando ele fala todo dia sobre o assunto, e não há da parte do Ministério da Fazenda um sinal claro de que o governo confia no arcabouço e vai fazer tudo que for necessário para atingir a meta, o mercado vê nisso um motivo para especular contra a moeda. Não é porque ele quer derrubar a moeda. É porque há incerteza, e então os agentes tendem a ter um comportamento de manada, e a desvalorização da moeda fica mais aguda.
André Roncaglia, economista e professor da Unifesp
Banco Central pode intervir
O Banco Central pode atuar para segurar o câmbio. A autarquia tem poder para colocar dólar no mercado e segurar a desvalorização do real, e há uma pressão para que ela atue no cenário atual.
Para isso, o BC faz leilões da moeda americana. Os principais instrumentos para isso são o leilão de dólar à vista, que é a venda da moeda diretamente, e o leilão de swap cambial, que permite que o investidor ganhe com a valorização do dólar sem ter que comprar a moeda, o que na prática reduz a pressão no câmbio.
Intervenção do BC poderia gerar queima de reservas sem resultado efetivo. Para Sérgio Vale, da MB Associados, a venda de dólares pelo BC precisaria ser muito bem pensada com foco em reduzir a volatilidade. Caso contrário, seria como "enxugar gelo", e poderia levar à perda de reservas sem gerar o efeito esperado.
Atuação do BC deve ser coordenada com as sinalizações do governo. "A atuação do BC pode conter alguma coisa, mas de nada vai adiantar se o governo não sinalizar controle de despesas e não mudar a postura de guerra com o BC", diz Neto, da Tendências. Para Roncaglia, da Unifesp, a ação isolada do BC poderia até causar algum efeito, mas seria algo incerto. "Com o alinhamento das falas, tende a ser algo certo, seguro e persistente", diz.
Ainda assim, a desvalorização do dólar seria moderada. Mesmo com essa atuação coordenada entre governo e Banco Central, o dólar não teria uma trajetória de queda acentuada. Isso porque o cenário americano continua pressionando as moedas emergentes. Segundo Silvio Neto, da Tendências, se o real tivesse um comportamento em linha com a média das moedas de emergentes em 2024 até junho, estaria hoje no patamar de R$ 5,10.
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