Há carência? Precisa ir ao SUS? Os direitos de gestantes no plano de saúde
Marcela Schiavon
Colaboração para o UOL, em Santo André (SP)
05/07/2024 04h00
Muitas famílias têm dúvidas sobre o plano ou seguro de saúde durante a gestação, o parto e o nascimento do bebê. A seguir, especialistas esclarecem as questões mais comuns a respeito do assunto.
Há diferença nos direitos para planos individuais e coletivos empresariais ou por adesão?
Em geral, não, pois as regras de cobertura assistencial obstétrica são as mesmas. Contudo, pode haver diferenças nas regras para aplicação das carências, como a redução do prazo, prazos menores e portabilidade. Por isso, é importante analisar cada caso, sobretudo a verificação das cláusulas antes da contratação.
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Uma mudança importante é a carência. No plano privado de assistência à saúde coletivo empresarial com número de participantes igual ou superior a 30 beneficiários, não poderá ser exigido o cumprimento de prazos de carência, desde que o beneficiário formalize o pedido de ingresso em até 30 dias da celebração do contrato coletivo ou da contratação. É o que diz uma resolução da ANS.
Já nos planos individuais e familiares, por outro lado, os períodos de carência incidem para os contratantes.
O plano de saúde exige carência para cobrir o parto?
Depende do tipo de plano.
Atualmente, a lei ainda exige carência de 300 dias para a cobertura de partos a termo nos planos individuais e familiares. Ou seja, se o parto acontecer no tempo esperado, a aplicação do prazo de carência contratual de até 300 dias está correta. Para outros casos, incluindo partos prematuros, a lei prevê carência de 180 dias.
Porém, no plano privado de assistência à saúde coletivo empresarial com número de participantes igual ou superior a 30 beneficiários não há carência. Isso desde que o beneficiário formalize o pedido de ingresso em até 30 dias da celebração do contrato coletivo ou de sua vinculação a pessoa jurídica contratante, segundo uma Resolução Normativa da ANS.
Porém, os Tribunais defendem que o contrato não pode excluir a cobertura de procedimentos urgentes. Ou seja: para partos de emergência, antes do programado, a carência não pode ser superior a 24 horas, desde a data da assinatura do contrato.
Projeto de lei prevê redução da carência para planos familiares ou individuais. Tramita no Senado Federal o Projeto de Lei nº 6040, de 2019, que visa alterar a Lei nº 9.656, de 3 de junho de 1998, que "dispõe sobre os planos e seguros privados de assistência à saúde". O intuito do projeto é garantir que as mulheres até a 18ª semana de gestação contratem planos de saúde hospitalares com cobertura obstétrica e tenham direito a atendimento integral. Inclusive com a realização de cirurgias, em caso de necessidade de assistência médica hospitalar decorrente da condição gestacional em situações de urgência, sem a necessidade de obedecer à carência de 300 dias.
Para casos de urgência e emergência, a carência prevista em lei é de 24 horas. No entanto, a ANS (Agência Nacional de Saúde) prevê que, se a gestante ainda não cumpriu o período de carência de no mínimo 180 dias, o atendimento de urgência poderá ser limitado até as 12 primeiras horas. Após esse período, se persistir a necessidade de internação ou de procedimentos exclusivos de cobertura hospitalar, a gestante terá que custeá-los com recursos próprios. O artigo 135-A do Código Penal tipifica como crime a exigência prévia de qualquer garantia ou caução pelo serviço de saúde em casos de atendimento médico emergencial.
E se a gestante não puder esperar a carência ou arcar com custos de internação?
Segundo a ANS, nesses casos, e sempre que o caso clínico permitir, deve haver a remoção da paciente para o SUS. Entretanto, pode a gestante optar por ficar no serviço particular, posteriormente exigindo judicialmente que o plano de saúde seja compelido a custear o seu atendimento urgente ou emergencial naquele local.
O plano cobre a internação do recém-nascido?
Sim, assegurada por lei nos 30 dias após o parto. Porém, os Tribunais admitem que o plano seja condenado a manter o bebê com assistência mesmo após o 30º dia, em situações nas quais a continuidade do tratamento seja indispensável à vida e integridade do recém-nascido.
A cobertura obstétrica cobre qualquer tipo de parto?
Em regra, sim, desde que os procedimentos sejam devidamente reconhecidos pela medicina, atestando a segurança dos pacientes. No caso de procedimentos reconhecidos mas fora do rol da ANS, como por exemplo o parto domiciliar, eles devem ser analisados pela efetiva necessidade para o quadro clínico apresentado (por exemplo, condições psiquiátricas da parturiente), possivelmente exigindo judicialização.
O plano de saúde cobre o parto domiciliar?
O parto domiciliar não está previsto no rol de procedimentos de cobertura obrigatória pela ANS. Contudo, em casos peculiares, em que fique demonstrado a necessidade do parto domiciliar do ponto de vista médico, a cobertura deve ser buscada judicialmente. É o caso de parturientes com algum tipo de comprometimento intelectual que precisam de um ambiente familiar para estabilização emocional. Isso sobretudo pelo princípio da função social do contrato de assistência suplementar à saúde.
Toda gestante tem direito à taxa de disponibilidade obstétrica?
Uma consumidora de plano hospitalar com obstetrícia tem o direito garantido de que o parto, normal ou por cesárea, está no seu plano. Assim, todos os custos médicos serão em sua totalidade cobertos pela operadora. Qualquer taxa cobrada pelo obstetra à gestante é ilegal e deve ser denunciada à ANS.
Se a gestante não conseguir chegar à maternidade credenciada, há reembolso?
Apenas haverá reembolso se existir essa previsão no contrato.
A empresa do plano de saúde pode cancelar o contrato no meio da gravidez?
Depende da modalidade de contratação.
- Para planos de saúde contratados na modalidade individual, o cancelamento pode ser feito pela seguradora apenas em caso de inadimplência ou fraude.
- Já planos coletivos podem ser cancelados pela operadora após 12 meses de duração, desde que o beneficiário seja notificado com antecedência de 60 dias.
Mas, se houver risco à vida, plano não pode ser cancelado. Uma decisão do STJ, proferida em caráter vinculante, proíbe o cancelamento de planos de saúde de pacientes que estejam internados, ou realizando tratamento com risco de vida. Se o caso da gestante se enquadrar nesses casos, o plano não pode ser cancelado pela seguradora.
É possível trocar de plano de saúde no meio da gestação?
É possível. Contudo, a contratação de novo plano pode levar ao cumprimento de carências por parte da gestante. Apenas estará isenta das carências a pessoa que, pelo contrato, aproveitar as carências anteriores ou realizar portabilidade.
O plano de saúde cobre o acompanhante da gestante na hora do parto?
As beneficiárias de planos hospitalares com obstetrícia têm direito a um acompanhante de sua escolha durante o trabalho de pré-parto, parto e pós-parto imediato. A operadora deverá cobrir despesas da alimentação que o prestador de serviços disponibiliza, além das taxas básicas necessárias à permanência do acompanhante, inclusive aquelas relativas à roupa apropriada para entrar em centro cirúrgico, sala de parto ou UTI.
O que acontece se a beneficiária não cumpriu o tempo de carência? Tem que ser atendida no SUS?
Se o parto for a termo, a carência é de no máximo 300 dias. A gestante que não cumpriu os prazos de carência deverá custear os tratamentos com recursos próprios, ou ser atendida pelo SUS.
Contudo, a situação muda nos casos de atendimento de urgência ou emergência. Em casos de parto de emergência, o plano de saúde deve cobrar carência de apenas 24 horas para a contratante. Como dito anteriormente, há projeto de lei para alterar essa situação e suprimir esses períodos de carência para as gestantes, dando-lhes cobertura mais ampla.
Fontes consultadas:
Ricardo Yamin é advogado especializado em saúde suplementar, gerente jurídico da Qsaúde, mestre e doutor em direito pela PUC-SP. É também professor assistente na matéria de direito processual civil, na graduação da PUC-SP e membro da Abdpro (Associação Brasileira de Direito Processual) e do Ibdp (Instituto Brasileiro de Direito Processual).
Beatriz Lameira Carrico Nimer é doutora e mestre em direito do Estado pela USP. É "recognised student" do Centro de Estudos Latino-Americanos da Universidade de Oxford, advogada e professora de direito na PUC/SP e na EPD.
Denys Chippnik Baltaduonis é especialista em direito médico e da saúde. É sócio do escritório Haddad & Haddad Filho Advogados.