Como eleição na França muda a relação comercial do país com o Brasil
Alexandre Novais Garcia
Do UOL, em São Paulo (SP)
14/07/2024 04h00
A vitória da coalizão formada por partidos de esquerda e centro na eleição legislativa da França ocorreu após reviravoltas. Ainda assim, a frente republicana não conquistou maioria dos assentos no parlamento. O resultado tende a causar pouco impacto na relação comercial entre a França e o Brasil, mas mantém travado o acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Europeia.
O que aconteceu
Frente republicana derrotou a extrema-direita na eleição da França. A Coalizão de Esquerda, formada em um pacto entre partidos de centro, ecologistas e de esquerda, impediu a Reunião Nacional, grupo de extrema-direita, de vencer s eleição legislativa. O pleito deixou o parlamento do país extremamente dividido, o que deve dificultar novidades na política econômica.
Relação comercial da França com o Brasil deve seguir alinhada. A vitória de um grupo mais ligado à esquerda é vista como positiva por manter os acordos de investimento firmados com Emmanuel Macron no início deste ano. A parceria envolve um plano para arrecadar mais de R$ 5 bilhões para investir em projetos de economia sustentável na Amazônia Legal.
A extrema-direita na França tem um descaso com relação às questões ambientais. Se a houvesse esse contraponto político ideológico, poderíamos ter algumas dificuldades na implementação desse acordo enorme com a França.
Carla Beni, economista e professora da FGV (Fundação Getúlio Vargas)
Aliança
Balança comercial do Brasil com a França está negativa em US$ 1.45 bilhão em 2024. O resultado é oriundo de US$ 2,98 bilhões importados do país europeu e US$ 1,52 bilhões exportados no primeiro semestre de 2024. Os dados do Comex Stat, do MDIC (Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços). Os principais envios nacionais envolvem petróleo, alimentos e, principalmente, o minério de ferro.
A França é apenas o 27º principal destino das exportações brasileiras, com embarque de US$ 452,1 milhões até junho. Por outro lado, o país europeu foi a oitava origem preferida para as importações nacionais no primeiro semestre. "Como Macron e Lula têm uma relação excelente, espero que Lula convença o presidente francês a estimular a compra de mais produtos industriais brasileiros", diz Paulo Feldmann, professor da FIA Business School.
Há oportunidades de expansão das exportações no setor de produtos manufaturados como máquinas e equipamentos de transporte, setor de moda, alimentos, bebidas e produtos do agronegócio.
Fernanda Brandão, professora de relações internacionais Faculdade Mackenzie
Volume de investimento é mais expressivo do que as exportações. Beni destaca que a França é o terceiro país com maior volume de aportes no Brasil, com mais de 860 empresas que empregam 500 mil pessoas. "Esse ponto é crucial, porque resulta na criação de emprego e renda", avalia ela ao ver a relação comercial mais importante do que a união diplomática entre os países.
A principal barreira para a ampliação dos negócios envolve o protecionismo agrícola. Assim como o Brasil, a França tem um agronegócio bem desenvolvido, criando um alerta com a possibilidade de abertura do mercado. "O Brasil possui um setor agrícola competitivo, o que faz dos produtos brasileiros um potencial concorrente para os bens produzidos nacionalmente na França", ressalta Brandão.
Mercosul
O acordo de livre comércio entre o Mercosul e União Europeia deve seguir travado. Após a conclusão das eleições francesas, o presidente Emmanuel Macron recusou a exoneração do primeiro-ministro Gabriel Attal, que colocou o cargo à disposição. Sem alterações na cúpula do comando francês, o acordo bilateral tende a permanecer estagnado.
A França é o maior oponente deste acordo e vai continuar com essa posição, porque ela é quase unânime no país.
Paulo Feldmann, professor da FIA Business School
O presidente francês já se posicionou contra o acordo entre os blocos econômicos. Em passagem pelo Brasil no mês de março, Macron criticou o modelo da parceria bilateral. "No modelo atual, é um acordo muito ruim para vocês e para nós", ressaltou durante o Fórum Econômico Brasil-França, realizado na Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo).
A França vai ser a principal voz contra esse acordo entre o Mercosul e a União Europeia. Veremos como isso vai ficar agora, porque a pressão dos agricultores na França é muito grande e a chance deles assinarem esse acordo é mínima.
Carla Beni, economista e professora da FGV
Brasil seria o principal beneficiado pela parceira comercial. Um estudo desenvolvido pelo Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) mostra que o acordo resultaria em um crescimento de 0,46% no PIB brasileiro entre 2024 e 2040. Os ganhos são maiores do que os previstos para a União Europeia () e os demais países do Mercosul, com altas estimadas em, respectivamente, 0,06% e 0,2% do PIB.