Vai falir? Como tupperware perdeu relevância até pedir recuperação judicial
A fabricante americana dos populares potes de plástico Tupperware, que já vinha enfrentando dificuldades financeiras há algum tempo, anunciou na quarta-feira (18) que vai entrar com um pedido de recuperação judicial.
A companhia e algumas de suas subsidiárias deram início voluntário aos processos previstos no capítulo 11 da Lei de Falências dos Estados Unidos, que corresponde à recuperação judicial no Brasil. A empresa listou entre 50 mil e 100 mil credores, indicando a gravidade de sua situação financeira.
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"Nos últimos anos, as finanças da empresa foram fortemente impactadas por um cenário econômico desafiador", afirmou Laurie Ann Goldman, presidente da Tupperware.
O que aconteceu
Nos últimos anos, a Tupperware enfrentou uma série de desafios financeiros. A empresa teve problemas de liquidez, aumento da concorrência e queda na demanda por seus produtos, o que afetou significativamente suas operações.
No ano de 2022, as vendas anuais totalizaram US$ 1,3 bilhão, uma redução de 18% em relação ao ano anterior. O prejuízo foi de US$ 35,7 milhões. Para comparação, em 2013, a empresa havia registrado uma receita de US$ 2,7 bilhões.
Em março de 2023, a empresa atrasou a divulgação de seus resultados financeiros anuais devido a falhas no controle interno. Em junho, a situação se agravou quando a Tupperware anunciou o fechamento de sua única fábrica nos Estados Unidos, localizada na Carolina do Sul, o que resultou na demissão de 148 funcionários.
Em abril de 2023, as ações da Tupperware desabaram mais de 90% na Bolsa de Nova York em um período de 12 meses. A queda das receitas e a necessidade de renegociar dívidas pressionavam ainda mais a empresa, que já sofria com a perda de competitividade no mercado de utensílios de cozinha. A crise chegou ao ponto de a empresa considerar o encerramento de suas atividades.
O desempenho financeiro da Tupperware continuou a cair nos meses seguintes. No trimestre encerrado em setembro de 2023, a empresa registrou receitas de US$ 259,6 milhões, uma queda de 14% em comparação com o mesmo período do ano anterior. Além disso, o prejuízo líquido foi de US$ 55,8 milhões, reforçando o cenário negativo.
Como a empresa chegou aqui
Tupperware perdeu popularidade entre os mais jovens. Enquanto no passado seus produtos eram uma referência, atualmente a empresa enfrenta dificuldades em competir com marcas que se adaptaram melhor às novas demandas do mercado, como a preocupação com a sustentabilidade e a digitalização.
Especialistas acreditam que a revitalização da marca será um grande desafio. Susannah Streeter, chefe de dinheiro e mercados da Hargreaves Lansdown, destacou que, embora ainda haja a possibilidade de encontrar um comprador para a empresa, a imagem negativa do plástico entre consumidores ecologicamente conscientes torna esse processo mais difícil. "A festa acabou para a Tupperware", disse Streeter, indicando a gravidade da situação.
Tupperware busca compradores que possam ajudar na transformação digital da empresa. Os executivos afirmaram que estão à procura de investidores que possam proteger a marca icônica e apoiar a transição da Tupperware para uma operação mais voltada ao uso de tecnologia e ao ambiente digital, em um esforço para modernizar e salvar o negócio.
65% dos brasileiros utilizam redes sociais para compras online. Uma pesquisa realizada pela Adyen em 2024 revelou que 65% dos consumidores brasileiros compraram via redes sociais nos últimos 12 meses. O estudo identificou que as gerações Z e Millennials são os principais adeptos desse comportamento, com uma taxa de adesão de 72% em cada grupo. Entre as redes sociais, o Instagram lidera, seguido pelo Facebook e TikTok.
O social commerce é amplamente adotado por consumidores, mas varejistas continuam aquém. Apesar da alta adesão entre os consumidores, apenas 29% das empresas brasileiras oferecem compras via redes sociais. "O varejo tradicional foi muito reticente em adotar o online, similar ao que ocorreu com a fotografia digital", afirmou Leonardo Cyreno, Head de Eficiência Comercial e Growth da AGR Consultores.
Toda empresa passa por um ciclo de vida: nascimento, desenvolvimento, maturidade e declínio. Se a gestão não identificar o momento certo para se adaptar e manter a competitividade, as receitas e os resultados tendem a cair, levando a empresa a não cumprir suas obrigações, o que culmina na necessidade de pedir recuperação judicial.
André Rocha, especialista em reestruturação, gestão de crise, melhoria de performance e estratégia, sócio-fundador da Triunfae
Empresas que não se adaptam ao digital tendem a enfrentar dificuldades. Rocha destaca que empresas que não se atualizam enfrentam desafios significativos. "O DNA da Tupperware sempre foi baseado na venda direta, com consultoras visitando residências e realizando reuniões. A Tupperware é um exemplo disso. A empresa se perdeu com a digitalização da economia e agora enfrenta dificuldades para se reposicionar", afirmou André Rocha, especialista em reestruturação, gestão de crise, melhoria de performance e estratégia, sócio-fundador da Triunfae.
Comércio eletrônico deve crescer exponencialmente nos próximos anos. Estudo da Alter Agents de 2023 indica que as compras em lojas virtuais devem crescer 229% nos próximos cinco anos, enquanto compras virtuais com amigos devem aumentar 141%. Esse cenário mostra o potencial de crescimento do social commerce no Brasil.
Especialistas reforçam a importância de uma estratégia diferenciada para o comércio digital. "O online tem uma margem de lucro mais baixa, mas oferece elasticidade e penetração no mercado", concluiu Cyreno. "É importante que varejistas entendam as peculiaridades do comércio eletrônico para otimizar sua eficiência."
Geração Z tem forte inclinação por produtos sustentáveis. Pesquisas mostram que essa geração valoriza a sustentabilidade em suas decisões de compra, preferindo produtos duráveis e que causem menos impacto ambiental. De acordo com especialistas, essa preocupação está ligada ao aumento da conscientização sobre questões climáticas e sociais. "A Geração Z busca alinhar suas escolhas de consumo com seus valores, o que impulsiona a demanda por empresas que adotam práticas sustentáveis", destacou Leonardo Cyreno.
China tem se destacado em atender a demanda por produtos sustentáveis. Nos últimos anos, o país ajustou sua produção para oferecer produtos de alta qualidade com foco em sustentabilidade, respondendo à crescente demanda da Geração Z. Com inovações tecnológicas e um modelo de produção mais eficiente, a China passou a fornecer itens com melhor relação custo-benefício e menor impacto ambiental. "Atualmente, os produtos chineses têm se destacado pela sua qualidade e excelente relação custo-benefício, em parte devido a uma capacidade tecnológica cada vez mais sofisticada", afirmou Cyren.
Preço elevado da Tupperware contrasta com a demanda por produtos sustentáveis e acessíveis. Embora a marca seja reconhecida por sua qualidade e durabilidade, o alto custo de seus produtos dificulta a competitividade, especialmente diante da oferta crescente de alternativas mais baratas e sustentáveis vindas de países como a China. "A Tupperware perdeu espaço ao não se adaptar rapidamente às novas exigências do mercado, como preços acessíveis e práticas sustentáveis", explicou Leonardo Cyreno. Esse descompasso entre preço e demanda reforça a necessidade de uma reestruturação no modelo de negócios da empresa.