Por que Lesoto e São Pedro e Miquelão receberam maiores tarifas de Trump?


Colaboração para o UOL
03/04/2025 12h26
Parceiros econômicos dos EUA que são "nanicos" no xadrez geopolítico, como São Pedro e Miquelão, Lesoto e Camboja, receberam as maiores tarifas do pacote anunciado pelo presidente Donald Trump ontem.
O que aconteceu
Tarifas chegam a 50%. Lesoto, na África, e São Pedro e Miquelão, território francês na América do Norte, receberam 50% de taxas. Já o Camboja foi taxado em 49%. Outros países "nanicos" como Laos e Madagascar serão cobrados em 48% e 47%, respectivamente.
A Casa Branca justificou as tarifas como uma necessidade para equilibrar a balança comercial. As tarifas teriam sido calculadas como forma de compensar déficits dos EUA, que ocorreriam por "uma combinação de fatores tarifários e não tarifários", admitiu a presidência. Déficits costumam acontecer quando um país importa mais do que exporta para outro.
Americanos teriam usado uma fórmula aparentemente complexa para calcular as taxas. A tarifa de cada país foi obtida assim: o valor do déficit comercial dos EUA com aquele país foi dividido pelo total de produtos importados de lá e, depois, dividido por dois. Por exemplo, os EUA compram mais produtos chineses do que vendem a eles - são US$ 440 bilhões em importações e um déficit de US$ 295 bilhões. Ao dividir 295 por 440, eles obtêm 67%. Este número dividido por dois dá a tarifa imposta à China: 34%.
Trump estabeleceu uma tarifa mínima de 10%. O governo dos EUA justificou que "valores mínimos mais altos fossem necessários para limitar a heterogeneidade nas taxas e reduzir transbordo". Foi cobrado um mínimo "médio" de diversos países para evitar a transferência de carga de um meio para o outro, com diferentes paradas no caminho, o que poderia criar um corredor de importações que entrassem nos EUA passando por um último país cujas tarifas eram menores - burlando o esquema tributário americano.
Isso significa que tarifas não são recíprocas, como Trump diz. Os EUA não têm déficit comercial com o Reino Unido atualmente, mas a terra do rei Charles recebeu 10% de tarifas em seus produtos, assim como o Brasil. Mais de cem países foram taxados no pacote de ontem. O presidente americano ainda apontou que o Brasil impõe 10% de taxas a produtos americanos, mas a média apurada pelo UOL é de 2,7%.
Economistas consideram o cálculo "sem sentido". Especialistas ouvidos pela reportagem apontaram discrepância nos quadros apresentados por Trump durante a assinatura do pacote tarifário e questionaram a efetividade da estratégia.
A gente não cria setores econômicos do dia para noite, impondo uma tarifa e outra ali. Os setores econômicos dependem de uma história. Pega o exemplo do seu automobilístico: é um setor onde há muita penetração de importados. Por mais que você consiga trazer de volta a indústria para os EUA, que é o plano dele, vários elementos, insumos, serão importados. Então, a chance disso dar certo - ou seja, de colocar indústria automobilística de pé e competitiva - é nula. Pedro Rossi, economista, ao UOL News
A situação dos três países mais taxados
Lesoto: 50%
Balança comercial: EUA importaram US$ 237,3 milhões em produtos do Lesoto em 2024, enquanto o Lesoto importou apenas US$ 2,8 milhões dos EUA, segundo dados do Escritório do Representante de Comércio dos EUA, agência da presidência.
Por que a diferença? O pequeno país africano tem uma economia movida pela exportação, principalmente, segundo a ITA (International Trade Administration), agência federal de comércio dos EUA. Eles vendem principalmente roupas, diamantes, água, eletricidade, lã comum e lã angorá.
São Pedro e Miquelão: 50%
Balança comercial: Os EUA importaram US$ 3,4 milhões de produtos do pequeno território ultramarino francês, próximo ao Canadá. Já as ilhas importaram US$ 100 mil em produtos dos EUA, de acordo com dados do escritório do Censo dos EUA.
Por que a diferença? Com uma população de cerca de 5.000 pessoas, a economia de São Pedro e Miquelão é lucrativa, mas baseada na exportação de peixes, segundo a CIA (agência de inteligência dos EUA).
Camboja: 49%
Balança comercial: Os EUA importaram US$ 12,7 bilhões de produtos cambojanos em 2024, enquanto o país asiático importou US$ 321,6 milhões de produtos americanos.
Por que a diferença? Os EUA são o principal parceiro comercial do Camboja em exportações, recebendo cerca de 40% de tudo que sai de lá, especialmente roupas, calçados e produtos de viagem, segundo a ITA.