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Carla Araújo

Diplomatas admitem falha com Índia e China e tentam reverter desgaste

O presidente Jair Bolsonaro conversa com o chancele Ernesto Araújo, no Itamaraty - MATEUS BONOMI/AGIF/ESTADÃO CONTEÚDO
O presidente Jair Bolsonaro conversa com o chancele Ernesto Araújo, no Itamaraty Imagem: MATEUS BONOMI/AGIF/ESTADÃO CONTEÚDO

Do UOL, em Brasília

19/01/2021 16h58Atualizada em 20/01/2021 13h37

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Apesar de o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, ser considerado da chamada ala ideológica do governo, dentro do Itamaraty há um esforço diplomático para que os impasses com a Índia e com a China, em torno das vacinas e dos insumos para os imunizantes, sejam resolvidos "nos próximos dias".

Embaixadores ouvidos pela coluna e que acompanham as negociações reconhecem que o governo agiu de forma equivocada na comunicação. A avaliação feita no MRE é de que os anúncios do governo fizeram "muito barulho" sem os produtos estarem já em mãos brasileiras.

"Lamentamos que tenha havido esse ruído de comunicação e a culpa é do governo", disse um diplomata.

Araújo fez contatos com os chanceleres de Índia e China, mas são os embaixadores do Brasil nos dois países que estão sendo considerados, no momento, os principais negociadores do impasse.

No caso da Índia, o diplomata André Aranha Corrêa do Lago tem chegado a um entendimento e afirmou às autoridades brasileiras que acredita no fim do impasse — ou seja na entrega dos dois milhões de doses das vacinas já adquiridas pelo Brasil — "em poucos dias". A ordem, no entanto, é não fazer anúncios e nem antecipar as tratativas justamente para evitar repetir os mesmos erros e voltar a frustrar as expectativas.

Em relação ao argumento indiano de que o Brasil teria contribuído para a carência de vacinas ao se posicionar de forma contrária à quebra de patentes, diplomatas tentaram minimizar a questão e ressaltam que a AstraZeneca tem seus interesses comerciais de manutenção de patente.

Além disso, afirmam que a Índia fez escolhas políticas condizentes com sua política externa ao atender países vizinhos e mais carentes.

Outro argumento usado pelo Itamaraty é de que há "um fato inelutável" de que a demanda pelas vacinas supera em muito a oferta atual no mundo e Índia e China são os principais produtores e não estão "dando conta". "Hoje os dois países são as fábricas do mundo", diz um diplomata.

Esforço diplomático

No caso da China, além de questões internas e comerciais, há um esforço de diplomatas de carreira para minimizar o desgaste entre o governo de Pequim e o do presidente Jair Bolsonaro.

O embaixador do Brasil em Pequim, Paulo Estivallet de Mesquita, está em contato com as autoridades chinesas para superar as burocracias em torno da demora na chegada dos IFAs (Ingrediente Farmacêutico ativo) que serão usados para a fabricação tanto da CoronaVac/Butantan como da Oxford/Astrrazeneca.

Diplomatas reconhecem que há um ponto de desgaste pela postura do presidente e também de aliados da ala ideológica, que já fizeram acusações de que a China é a culpada pelo coronavírus e também já descredenciaram o país na fabricação de vacinas.

A tentativa de diplomatas de carreira é tentar separar a postura errática do governo de atuações de diplomacia de Estado. "Há um esforço enorme de não deixar que essa disputa interna pelo poder no governo não contamine as relações diplomáticas", disse uma fonte do Itamaraty. "É papel do Estado resolver isso o quanto antes".

Despedida de Maia

O Itamaraty não comentou a iniciativa do presidente da Câmara, Rodrigo Maia, de tentar estreitar laço com os chineses, ao convidar o embaixador do país asiático para uma conversa para tentar resolver o problema.

Apesar disso, aliados do presidente Jair Bolsonaro dizem que o presidente da Câmara quer aproveitar os holofotes para "se despedir do protagonismo", já que seu mandato acaba em fevereiro.

Força-tarefa

Sobre uma suposta força-tarefa com outras áreas do governo, incluindo a presença do vice-presidente Hamilton Mourão, para ajudar nos contatos com a Índia e a China, diplomatas dizem que neste momento apenas as embaixadas estão falando em nome do governo e que não há nenhuma decisão sobre criar ou não um grupo para atuar em outras frentes.

Questionado pela coluna se já estaria escalado para ajudar no contato com os dois países, o vice-presidente disse apenas que não possuía maiores dados a respeito do tema. Apesar disso, auxiliares do Planalto admitem que Mourão tem um canal diplomático que pode vir a colaborar com o imbróglio.