Alimentação em alta: delivery está melhor e comer fora ficou mais barato
Colaboração para o UOL, em São Paulo
08/07/2024 04h00
Se você sonha em ser dono de um negócio de alimentação, saiba que o segmento está em alta. O delivery está se consolidando, e as pessoas têm novos hábitos de consumo.
O UOL ouviu especialistas da área sobre o assunto, que falam sobre tendências e desafios do segmento.
Mudança no comportamento do consumidor
Há três fatores principais que ajudam a explicar a alta do segmento, diz Tom Moreira Leite, presidente da ABF (Associação Brasileira de Franchising).
Recuperação da renda das pessoas. A massa salarial real voltou aos níveis de 2013/2014. "Isso é um fato importante para o setor de alimentação, porque, no final, aumenta o que nós chamamos de renda discricionária", afirma. É um dinheiro que sobra depois do pagamento de contas e obrigações, que pode ser usado de acordo com o que as pessoas quiserem. Por isso, afeta tanto os padrões de consumo.
O consumidor está mais confortável com a digitalização do segmento. "Não só no que se refere à operação de delivery, mas digitalização dentro das operações de food service, como o uso de totem de autoatendimento. E isso leva a um aumento da capacidade dos restaurantes de atender um número maior de clientes por hora", diz.
As cozinhas dos restaurantes vêm adotando tecnologias para atender o público presencial e o delivery. Na pré-pandemia, diz Leite, as cozinhas não estavam prontas para isso. "Temos a demanda do consumidor e, agora, os estabelecimentos com operações adequadas para atender esse novo momento", afirma.
O que está levando ao crescimento do segmento é a soma do atendimento presencial e do delivery, que segue crescendo e se consolidando. O segmento é diretamente impactado pelo crescimento do setor de turismo. Afinal, o indivíduo que está viajando a lazer também está consumindo nos restaurantes daquelas regiões. Então, hotelaria e turismo vêm sendo positivamente impactados desde a pandemia, refletindo também no food service.
Tom Moreira Leite, presidente da ABF
E por que as pessoas estão comendo mais fora?
As pessoas estão cozinhando menos em casa. Mulheres no mercado de trabalho não são uma novidade, mas com as jornadas mais longas (com trabalho, academia, cursos, etc.), as famílias menores fazem menos refeições em casa. "O novo estilo de vida e trabalho substitui refeições que seriam feitas em casa", afirma João Caetano, CEO da Mapfry, startup especializada em estudos de mercado para expansão de negócios.
Além disso, a alimentação fora do lar ficou mais barata. Regiane Rabelo, consultora de negócios do Sebrae-SP, diz que, quando se considera tempo versus praticidade, essa conta parece que sai mais barato comer fora. "No entanto, é importante considerar que a qualidade e a saúde dos alimentos consumidos fora podem não ser equivalentes ao que se prepara em casa. Além disso, a experiência social e cultural de comer fora é um fator significativo para muitos", afirma.
O delivery veio para ficar
O delivery é utilizado por 95% das redes de franquias de alimentação. Representa 31% do faturamento para quem adota a ferramenta. Os dados constam da 13ª edição da Pesquisa Anual Setorial de Foodservice 2024. A pesquisa, divulgada em junho, é uma parceria da ABF com a Galunion, consultoria especializada no mercado food service.
Traz praticidade ao consumidor que busca por culinárias diversas em diferentes momentos. "O delivery ainda é um forte agregador, por ter se tornado um hábito regular na vida dos consumidores de diferentes faixas etárias", afirmou Simone Galante, fundadora e CEO da Galunion.
Houve um aumento na adoção do delivery e do take away (pedir antes para retirar no local). Segundo Simone, a pesquisa "Delivery 360" da Galunion sobre o assunto mostrou que, em abril de 2024, 88% das pessoas faziam pedidos de foodservice por delivery e 64% para retirar —em abril de 2020, a pesquisa apontava número menor: 61% pediam delivery e 46% para retirar.
Quais as motivações do consumidor para pedir comida por delivery ou para retirar? De acordo com a pesquisa, 64% responderam "não consigo ou não quero cozinhar" e 57%, "variar a rotina alimentar ou comer algo novo.
Há franquias focadas 100% no delivery. Uma delas é a ATW, dona de marcas como N1 Chicken e Brasileirinho Delivery. "Antigamente, o delivery era uma venda extra; não era o foco principal. Hoje, as grandes marcas estão olhando para o delivery", diz Thiago Salla, sócio-fundador da ATW. A empresa foi criada em 2017 em Vitória (ES). A rede tem hoje 180 dark kitchens em operação.
O mercado está evoluindo, e o nível de exigência do cliente também, comparado a antes da pandemia. O cliente não quer só preço. Não adianta pagar barato, se, na hora da entrega, ele tem problema. Hoje, ele abre o aplicativo e vê uma diversidade enorme de restaurantes que atendem na casa dele, no trabalho ou onde estiver, em um tempo melhor e com boa qualidade.
Thiago Salla, sócio-fundador da ATW
Crescimento das franquias de alimentação
Em 2023, o segmento Alimentação/Food Service foi o que mais cresceu (17,9%), em relação a 2022, entre os 11 segmentos do franchising. No primeiro trimestre deste ano, o segmento continuou em ascensão. Alimentação/Food Service teve o crescimento de receita de 26,6%, enquanto Alimentação/Comércio e Distribuição cresceu 43,9%. Os dados constam de pesquisas recentes da ABF.
Novas marcas operando também é um motivo do crescimento. A pesquisa também identificou forte demanda nos nichos de sorveterias e franquias de açaí. "A forte onda de calor pela qual passamos fez com que a busca por sorvetes, açaí e seus produtos derivados, e bebidas geladas também disparasse", diz Leite, da ABF.
Existe a força das franquias. "Uma pessoa que empreende sozinha em alimentação pode ser talentosa, mas a partir do momento em que ela expande e detém mais de uma cozinha, a marca tem que ser bem gerenciada. Essa é a força das franquias. Por isso, a tendência é que boas operações independentes entrem no franchising", afirma Caetano, da Mapfry.
Franquias têm muito mais força para captar a alta na demanda do mercado porque são boas em repetição. Elas dominam processos, métodos, treinamentos, além de ser uma marca consolidada. Por isso, o segmento de franquias de alimentação cresce tanto.
João Caetano, CEO da Mapfry
Falta de mão de obra é desafio do setor
A falta de mão de obra qualificada (57%) é o principal desafio dos operadores de food service neste ano. É o que aponta a pesquisa "Alimentação Hoje: a visão dos operadores de foodservice", lançada em março pela Associação Nacional de Restaurantes, Galunion e Associação Brasileira da Indústria de Alimentos. "O primeiro desafio apontado foi gente. Falta de gente qualificada. Apesar de a frequência de treinamento ser muito grande, os operadores querem tornar a operação cada vez mais fácil e atrativa para seus colaboradores", declara Simone.
Em segundo lugar, aparece o desafio de "atrair clientes e manter/crescer vendas" (53%). Na sequência, aparece "ajustar o modelo de negócio para que ele se torne lucrativo" (51%), seguido de "inflação em geral" (47%).
Tendências do food service
Existem três tendências fortes no segmento de alimentação/food service.
Uma delas é "nutrir para viver". "As pessoas querem comer de forma mais saudável, mas também querem viver com intensidade, com experiências e momentos de celebração. Por isso, além da saudabilidade, de produtos frescos, naturais e orgânicos, as pessoas também merecem momentos de consumo de produtos de 'comfort food'. A tendência é buscar esse equilíbrio", afirma Simone, da Galunion.
A pesquisa sobre tendências mostrou que 44% das pessoas querem consumir comfort food (pizza, refrigerante, lasanha, hambúrguer, etc.). "O novo comfort food aparece como a resposta a uma crescente nostalgia e necessidade de experiências reconhecíveis e que tragam conforto. Mas a tendência é comer para viver ao máximo e comer para nutrir o corpo e a mente de forma saudável, que traga saúde física e mental, proporcionando longevidade. Essa balança pode estar em equilíbrio", declara.
Outra tendência é o "fácil e conveniente". Simone diz que as operações de food service precisam ser simples, fluidas e sem erros. Mas é preciso otimizar a operação para atender o consumidor com mais facilidade e conveniência na entrega. "Isso pode se traduzir em soluções que trazem mais velocidade à preparação dos alimentos, na otimização de processos e em modelos de negócios que explorem a facilidade de compra", afirma ela. O uso de tecnologia é fundamental neste quesito.
"Tech + Touch" é a terceira tendência. A tecnologia deve ser incorporada às operações, mas aliada ao lado humano do negócio. Para Simone, em um mercado com falta de mão de obra qualificada, a tecnologia vem sendo pensada como uma maneira de automatizar processos e liberar os times para atender bem. Os robôs de automação, que servem para facilitar o dia a dia e evitar tarefas repetitivas, são um exemplo.
A tecnologia capacita mais pessoas a atender clientes e realizar atividades, não substituindo trabalhadores, mas os empoderando.
Simone Galante, fundadora e CEO da Galunion
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