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Fabricantes de lingerie 'Made in France' tentam sobreviver a produtos da China

Propaganda da marca francesa de lingerie feminina Ma P"tite Culotte - Divulgação
Propaganda da marca francesa de lingerie feminina Ma P'tite Culotte Imagem: Divulgação

Angeline Benoit e Harumi Ichikura

14/11/2014 16h14

14 de novembro (Bloomberg) - Ma P'tite Culotte e Garçon Français estão apostando na ideia de que ninguém sabe fazer roupas íntimas como os franceses.

As duas startups --a coquete "Minha pequena calcinha" para mulheres e "Rapaz francês", cujo site afirma simbolizar o "amante francês"-- estão entre as empresas que vão exibir seus produtos no fórum "Made in France" que começa nesta sexta-feira (14) em Paris.

Elas participarão junto com fabricantes tradicionais de lingerie de seda e renda, como a Allande, para tentar mostrar que o país ainda tem seus truques na arte da sedução.

"A imagem de moda e de luxo da França é uma força que seria uma pena perder", disse Charline Goutal, 27, que começou a Ma P'tite Culotte no ano passado, em entrevista.

Goutal e Vicky Caffet, 30, criador da Garçon Français, são alguns dos empreendedores que estão resistindo à tendência de fuga dos produtores, que provocou um encolhimento de 15% da produção industrial e de 25% dos empregos desse setor desde o ano 2000 na segunda maior economia da zona do euro.

Desafio de empreender

Como o presidente François Hollande está fazendo de tudo para reativar o crescimento e inverter o recorde de desemprego, mais do que nunca ele precisa de pessoas como Goutal e Caffet.

Empreendedores como eles estão enfrentando os altos encargos trabalhistas, os desafios de montar uma empresa em um país que ocupa o 31º lugar do mundo em relação à facilidade para fazer negócios e um regulamento de 3.200 páginas chamado "código de trabalho", que define desde a classificação dos trabalhos e o treinamento até a demissão.

Com a certeza de que com a alta qualidade, o famoso toque francês e apoiando os empregos locais eles conquistarão clientes, Goutal e Caffet estão segurando a onda e lidando com custos que fizeram com que muitos concorrentes preferissem desistir.

Batalha perdida?

Decididos a fabricar os produtos localmente, Caffet e Goutal estão enfrentando uma batalha quase perdida, ao mesmo tempo em que a concorrência apresentada por países como Tunísia e China ameaça extinguir o setor. A produção francesa de roupa íntima caiu 98% desde 1990, de acordo com os dados do instituto de estatísticas INSEE.

Philippe Lefebvre, que criou a Allande em 1994, diz que o custo de um trabalhador francês para sua empresa é de cerca de 40 a 44 centavos de euro por minuto, em comparação com 4 centavos de euro na China.

Marcas como a Lise Charmel e a Lejaby, e inclusive algumas que foram fundadas no século 19, reduziram as operações locais à confecção de protótipos e ao marketing. Algumas foram compradas por empresas estrangeiras. A Aubade agora está sob o comando da suíça Calida Holdings, e a Barbara foi comprada pela sul-coreana Namyeung Vivien.

Globalização clássica

As mulheres francesas gastam, em média, 100 euros (US$ 125) por ano em lingerie e modeladores, mais do que nos EUA e nos cinco maiores mercados da Europa, de acordo com um estudo do Instituto Francês da Moda.

No entanto, apenas uma fração dos 2 bilhões de euros gastos em compras no ano passado foram para produtos fabricados na França. O resto foi importado do leste europeu, do norte da África e da Ásia, onde os encargos trabalhistas são menores.

"É um exemplo clássico de globalização", disse Frédéric Godart, especialista em moda que dá aulas na faculdade de Administração Insead, em Fontainebleau, perto de Paris. "Atualmente, as marcas de lingerie têm poucos vínculos com a França além do nome e da história. Pode ser que ainda exista um mercado para a verdadeira lingerie 'Made in France'. Seria necessário seguir a experiência dos relojoeiros suíços".

Enquanto isso, Goutal está conversando com investidores anjos para arrecadar mais fundos depois de superar as expectativas de vendas no primeiro ano de sua empresa.

Negócio arriscado

As roupas íntimas são fabricadas por Les Atelières, empresa fundada perto de Lyon por ex-trabalhadores da Lejaby.

Goutal --como outros fabricantes franceses-- quer ajuda do governo para manter os empregos no país. O ministro da Economia de Hollande, Emmanuel Macron, um ex-banqueiro nomeado em agosto, prometeu reduzir os impostos e as regulações para reativar a estagnada economia da França.

Enquanto isso, no entanto, produzir na França continua sendo um negócio arriscado, disse Goutal, que já viu alguns provedores falirem, enquanto outros, como Les Atelières, escaparam por um triz.

"Meus provedores estão sofrendo porque os encargos trabalhistas estão paralisando a França", disse ela.