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Cade avalia como proteger mercado digital do domínio das empresas gigantes

João José Oliveira

Do UOL, em São Paulo

05/09/2020 04h00

Resumo da notícia

  • Conselho Administrativo de Defesa Econômica analisou 21 estudos no mundo sobre concorrência digital
  • Estudos listam vantagens que novos mercados digitais proporcionam a consumidores
  • Documentos também revelam riscos que os novos serviços representam à livre concorrência
  • Órgão do governo responsável pela livre concorrência investiga mudanças necessárias para julgar disputas nos mercados digitais

O Cade (Conselho Administrativo de Defesa Econômica), órgão do governo responsável por zelar pela livre concorrência no mercado brasileiro, está de olho nas disputas envolvendo os novos mercados digitais. Em um amplo estudo, de 137 páginas, analisou 21 documentos de diversos países sobre o tema, para checar como as autoridades antitruste e centros de pesquisa internacionais veem os benefícios e os riscos criados pelas empresas que atuam na Internet —de redes sociais e de mídia a plataformas financeiras e de comércio eletrônico.

As sugestões dadas nos documentos citados pelo Cade vão desde a revisão dos critérios usados para decidir se um negócio representa ameaça ou não à livre concorrência até a criação de um órgão específico para acompanhar o mercado digital.

Os autores do estudo do Cade —Filippo Maria Lancieri (consultor PNUD no Cade) e Patrícia Alessandra Morita Sakowski (superintendente-adjunta do Cade)— destacaram que o documento não representa a visão da autarquia.

"Este documento de trabalho buscou sumarizar os principais estudos internacionais que analisam as dinâmicas competitivas de mercados digitais. Trata-se de uma revisão dessa literatura, que não necessariamente reflete a visão do Cade. De modo geral, verifica-se que estes mercados podem apresentar diversos problemas de natureza concorrencial, justificando uma atenção especial por autoridades antitruste ao redor do mundo", conclui o estudo.

Para especialistas no assunto, apenas o fato de o órgão estar se debruçando sobre o tema já é uma sinalização importante.

"Muito embora não traga um posicionamento oficial do Cade sobre os diferentes temas discutidos, o estudo traz um apanhado bem completo sobre as principais questões que estão hoje em discussão no Cade e no mundo, e pode vir a informar a política antitruste brasileira nos mercados digitais", escreveu em nota o escritório Mattos Filho, Veiga Filho, Marrey Jr e Quiroga Advogados.

Benefícios dos mercados digitais

O estudo do Cade lista diversos benefícios que os mercados digitais já representam para os consumidores no mundo. De maneira geral, as plataformas digitais permitem economias de rede, ganhos de escala e de escopo. Isso tudo cria condições para a redução dos custos para o consumidor final.

Os mercados digitais permitem que mais pessoas possam comprar mais produtos e serviços, a preços acessíveis, democratizando o acesso das famílias à atividade econômica, aponta o Cade.

Potenciais riscos à concorrência

Por outro lado, os responsáveis pelos estudos analisados pelo Cade dizem que essa nova realidade proporcionada pelas empresas do mercado digital também traz novos riscos à concorrência. Assim, as grandes corporações têm hoje diferentes armas para atrapalhar ou mesmo barrar o surgimento de pequenos empreendedores, por exemplo:

Falsa gratuidade: O fato de as plataformas darem gratuidade aos clientes não significa que não exista o risco de os usuários finais serem lesados. Os estudos mostraram que aumento de custos do lado da plataforma de quem vende —o lojista que comercializa produtos numa grande plataforma de e-commerce, por exemplo— tende a ser repassado para os consumidores por meio do aumento do preço do produto final.

Uso de dados: Outra forma de risco aos consumidores é a coleta descontrolada de dados, que pode reduzir a privacidade dos usuários. Com essas informações, as plataformas podem manter os consumidores amarrados.

Aquisições: O estudo do Cade aponta que, em todo o mundo, aumentaram os casos de grandes plataformas comprando concorrentes menores apenas para garantir a manutenção de suas lideranças, evitando o surgimento de novos rivais.

Soluções possíveis

O Cade listou medidas e estratégias que órgãos antitruste estão avaliando ou adotando em diferentes países para enfrentar os riscos à livre concorrência nesse novo mundo das plataformas digitais.

O objetivo dos órgãos antitruste é impedir que empresas líderes usem mecanismos que impeçam o crescimento de competidores potenciais ou que fortaleçam sua presença no segmento em que atuam por meio, por exemplo, da aquisição de fornecedores e mercados secundários.

Medidas cautelares: Impor limites antes que determinado negócio leve à criação de uma grande companhia que controle definitivamente um certo mercado.

Provas: Inversão do ônus da prova. Em vez de uma pequena empresa provar que um negócio criado por uma grande companha —uma aquisição de concorrente, por exemplo— vai afetar o setor, é a grande empresa que deve provar que o negócio não afetará os consumidores daquele mercado.

Além de preços: Além dos custos para os consumidores, os órgãos antitruste devem prestar atenção em outras condições de mercado que precisam ser preservadas, como portabilidade e interoperabilidade dos dados.

Propagandas: Os órgãos antitruste devem criar métodos que investiguem os negócios baseados em propaganda online para verificar o poder de negociação de grandes empresas digitais que dominam a internet hoje.

Órgão especial: Os estudos analisados pelo Cade mostram que, em alguns países, existe a discussão sobre a necessidade de se criar um novo órgão de concorrência especial e focado nos mercados digitais.