Economista: 'Mercado tenta domesticar quem está na cadeira presidencial'
Do UOL, em São Paulo
19/12/2024 18h21
Em meio à crise de alta do dólar, o mercado financeiro tenta domesticar quem senta na cadeira presidencial, opinou a professora e economista Juliane Furno, no UOL News, do Canal UOL, nesta quinta-feira (19).
Acho que [o mercado tem agido propositadamente contra o governo Lula] sim. Embora seja algo mais fluido do que uma instituição monolítica, com uma orientação muito clara, o mercado tem uma posição com relação aos seus ganhos financeiros, os detentores da riqueza financeira têm opções políticas, tanto é que costumam se orientar por uma candidatura ou outra durante o eleitoral do período eleitoral e eles procuram domesticar quem senta na cadeira presidencial, seja de esquerda, seja de direita, para que opere uma política conforme os seus interesses. Juliane Furno, professora e economista
No último domingo (15), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) concedeu entrevista ao "Fantástico", da TV Globo, na qual ele reclama abertamente do mercado financeiro, que tem reagido, de forma negativa, ao pacote de ajuste fiscal sugerido por seu governo. Na entrevista, Lula atacou agentes financeiros e disse que eles "não têm que se preocupar com os gastos do governo".
Relacionadas
Com isso, o dólar bateu recorde histórico, com cinco altas seguidas, mas recuou e fechou hoje em queda de 2,32%, influenciado pela atuação do BC (Banco Central). Apenas em 2024, a desvalorização do real frente ao dólar chega a 21%.
Como eles [agentes financeiros] domesticam se eles não têm poder institucional? Ou fazendo pressão para que haja uma maior autonomia da política econômica com relação à presidência da República. [Por exemplo], o teto de gastos que existia anteriormente, a própria independência do Banco Central, são formas de você retirar do Estado — no último grau, a democracia, porque é no presidente que a gente vota — a capacidade de atribuição sobre essas políticas fundamentais.
É o segundo: é fazer o famoso terrorismo, terrorismo fiscal, prioritariamente, que é você atuar sobre aqueles capitais especulativos de curto prazo, apreciando e depreciando a moeda conforme falas que agradam, desagradam ou mais os operadores do mercado. Mas, veja, isso é muito circunstancial, onde o mercado que quer sinalizar para o Presidente da República e para a sociedade que ele tem formas de fazer pressão.
Mas acho que a política econômica do governo Lula tá indo na direção certa e isso se manifesta em dados. Se a sua geração é economia real, a taxa de desemprego em queda, o aumento da formalidade, o aumento da renda média, o crescimento do PIB, uma inflação estabilizada, reservas cambiais e a possibilidade inclusive de ainda em 2025, na pior da história, ter um reequilíbrio das contas públicas.
Juliane Furno, professora e economista
A professora concluiu o raciocínio dizendo que o mercado financeiro tem feito uma "tempestade no copo d'água".
Não sem propósito, mas porque tem interesses em desestabilizar, inclusive, indicadores da economia real. Eu acho que tem alguma coisa de ataque especulativo, mas não é o principal. Acho que há alguma coisa de exportadores que não internalizam em dólar para fazer pressão da moeda. Mas eu diria que o principal é o cenário econômico internacional.
Juliane Furno, professora e economista
Kupfer: Real é moeda que mais desvaloriza no mundo, e isso não é novidade
O real brasileiro é a moeda que mais se desvaloriza no mundo em relação ao dólar, neste momento, e isso não é novidade, avaliou o colunista José Paulo Kupfer, mais cedo, durante o UOL News - 1ª Edição.
Kupfer explicou que há três fatores que alavancam a alta do dólar. Um deles seria o peculiar mercado cambial brasileiro.
O nosso mercado de dólar à vista, de compra e venda, é um mercado pequeno, não está nem entre os 20 maiores do mundo em volume diário. Porém, o mercado de derivativos de dólar, de contratos de dólar na bolsa brasileira, na B3, é o segundo maior do mundo. Só perde para os Estados Unidos.
Então, o que acontece? Esse mercado de derivativos de dólar, onde se negocia contratos de dólar em reais, não entra dólar nesse mercado, ele por ser muito mais líquido, muito maior do que o mercado à vista, e isso é uma jabuticaba brasileira, ele é que forma o preço do mercado à vista.
Então, a moeda brasileira, o real, neste momento, é a que mais desvaloriza no mundo. Isso aí não é novidade. Toda vez que o dólar tem movimento de valorização no mundo inteiro a moeda brasileira é a que mais valoriza ou pelo menos uma das três que mais valoriza porque tem essa peculiaridade: mercado de derivativos de contratos de dólar em real na bolsa brasileira. José Paulo Kupfer, colunista do UOL
Assista ao comentário:
Sakamoto: Mercado não é entidade divina e parte dele também faz terrorismo
No UOL News - 1ª Edição, Leonardo Sakamoto disse que o mercado não é uma entidade divina e intocável e que parte dele também realiza terrorismo.
Discordar do mercado não é pecado. Até porque o mercado não detém o monopólio da certeza e da razão.
Você tem gente no mercado que está preocupada com o futuro da economia, gente que está 'panicada', gente seguindo fake news e gente especulando loucamente para ganhar dinheiro em cima do sofrimento do país também. E gente que está usando a força de suas operações para fazer pressão contra a taxação de dividendos. Não dá para dizer que todos os operadores do mercado tenham a escala racional que o ex-ministro [Maílson da Nóbrega] colocou.
Quando aqueles 17 setores conseguiram a prorrogação dos subsídios, o mercado não jogou o dólar para R$ 6,30 pensando que o Brasil iria quebrar, apesar do tamanho da pancada para as contas públicas que aquilo significava. O Brasil estava com um problema naquele momento, o Congresso passou uma coisa que não faz sentido na atual conjuntura. Temos uma bolsa-empresário no Brasil que precisa ser cortada, mas o mercado não surta com isso.
A única solução aceita é só tascar na cabeça do trabalhador. Qualquer coisa fora disso, não agrada as elites, não agrada o poder econômico. O que acontece no final das contas? O mercado só surta quando o governo tentar algo além de cortar dos pobres. O mercado não é uma figura, não é uma pessoa, é uma confluência de interesses. Infelizmente, muitas vezes esses interesses não são os interesses do Brasil.
Leonardo Sakamoto, colunista do UOL
Assista ao comentário abaixo:
O UOL News vai ao ar de segunda a sexta-feira em duas edições: às 10h, com apresentação de Fabíola Cidral, e às 17h, com Diego Sarza. Aos sábados, o programa é exibido às 11h e 17h, e aos domingos, às 17h.
Onde assistir: Ao vivo na home UOL, UOL no YouTube e Facebook do UOL. O Canal UOL também está disponível na Claro (canal nº 549), Vivo TV (canal nº 613), Sky (canal nº 88), Oi TV (canal nº 140), TVRO Embratel (canal nº 546), Zapping (canal nº 64), Samsung TV Plus (canal nº 2074) e no UOL Play.