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Ela teve dívidas de R$ 80 mil, pagou tudo e hoje dá dicas de finanças

Hoje, Tatiane Fernandes, 37, é consultora e educadora financeira com pós-graduação na área - Divulgação
Hoje, Tatiane Fernandes, 37, é consultora e educadora financeira com pós-graduação na área Imagem: Divulgação

Fernando Barbosa

Colaboração para o UOL, em São Paulo

19/08/2022 04h00

Tatiane Fernandes, 37, hoje é consultora e educadora financeira com pós-graduação na área. Mas sua história no mundo das finanças já foi bastante diferente. Ela chegou a dever R$ 80 mil, mas conseguiu pagar tudo e agora ajuda outras pessoas a cuidarem melhor de seu bolso.

Aos 19, engravidou do primeiro filho, Luiz. Logo, o pequeno passou a ser a prioridade nas finanças da mãe solo. Para dar a melhor educação, matriculou o filho na rede particular e, para bancar as mensalidades, passou a dar aulas de biologia e matemática na escola onde sua mãe trabalhava fazendo limpeza.

"Comecei a me enrolar com o cheque especial antes de terminar a faculdade", diz Tati, como é conhecida, ao UOL. Aos 25, quando veio a segunda filha, Maria Eduarda, a situação já era pior. "Eu terminava um empréstimo e pegava outro. Quanto mais limite tinha, mais eu pegava. A educação financeira não fez parte da minha vida de jeito nenhum. Achava que, quanto mais crédito tivesse disponível, mais deveria usar", declara.

Natural de Curvelo (MG), cidade com 80 mil habitantes a cerca de 160 quilômetros da capital Belo Horizonte, era contratada da prefeitura para atuar nas salas de aulas. Até que o então governador Aécio Neves (PSDB) sancionou a Lei 100 (100/2007), o que efetivou milhares de servidores sem concurso público.

Empréstimos estão na origem do descontrole

Assim que a lei entrou em vigor, Tatiane passou a ser bombardeada com ofertas de crédito consignado de várias instituições financeiras. O financiamento do carro e a escola dos dois filhos foram pagos dessa forma. Com o tempo, a situação foi ficando mais crítica. A prioridade era manter os dois no ensino particular. Por isso, resolveu dar aulas nas instituições em que os filhos estudavam.

Naquele período, Tati comprava de tudo com empréstimos: roupas, calçados, produtos para cabelo, brinquedos e material escolar. Chegou a ter R$ 80 mil em dívidas. Gostava de ter uma quantidade farta de frutas em casa. No entanto, o dinheiro da conta de água era usado para bancar os alimentos.

Logo, seus filhos precisaram ser mudados para a escola municipal. Mas, quando as crianças migraram de escola, ao invés de quitar os compromissos, Tati encontrou espaço para mais despesas. Dos colegas professores, adquiria roupas, semijoias e produtos de beleza em encartes de revistas. Também entrou em alguns consórcios. "Nunca fui de ostentar em uma vida de luxo, mas queria sempre o melhor", diz.

Problema com a filha causou correção na rota

A falta de organização nas finanças gerou diversas privações aos filhos por muitos anos. "Os coleguinhas deles ganhavam presentes, mas eles não. O pior não era eu estar em dificuldades, mas não poder oferecer o melhor para os meus filhos. Falava que um dia a situação estaria melhor. Era só uma promessa da boca para fora, para acalmá-los", afirma.

Ela não esquece a ocasião em que uma amiga comprou ovos de Páscoa para Luiz e Maria Eduarda, enquanto Tati estava em graves apuros financeiros. A amiga dissera que fora presente da própria Tati. Pelo gesto, a mãe é grata até hoje. "São atitudes que mostram com quem podemos contar", declara.

Até que um dia Maria Eduarda, então com 6 anos, desmaiou na rua. Ao levá-la de manhã para o SUS, o médico disse que a menina estava convulsionando. Entretanto, a mãe ficou com receio porque o profissional não parecia certo do diagnóstico. Assim, o então namorado e hoje marido, Fábio, resolveu bancar as despesas e levar Maria Eduarda para ser atendida na rede particular. A menina fez todos os exames, passou em consulta com o neurologista e se recuperou.

Depois de um tempo, o companheiro tocou no assunto. "Ele disse: 'você tem a mim e a sua mãe, mas se você não tivesse ninguém, como poderia se sustentar?' Eu fiquei muito brava. Mas não consegui argumentar, pois estava errada", afirma.

Outra amiga também deu um toque importante e indicou que Tati pesquisasse sobre como fazer um "pé-de-meia" na internet.

Pesquisas na internet foram o início da transformação

Tati encontrou vídeos do influenciador Thiago Nigro, o "Primo Rico", que fala sobre investimentos e educação financeira, e de Nathalia Arcuri, também especialista em finanças. Começou a separar seu salário para cada despesa em envelopes na hora do pagamento, a exemplo de alimentação e combustível.

"Para ter dinheiro para tudo, eu dividia a renda pelos 30 dias. Isso ajudava a definir o limite para pagar alguém", diz. Mas Tati admite que não foi um processo fácil. "Não adianta começar a anotar as despesas. Primeiro, precisamos mudar a mentalidade. É a parte onde eu tinha mais resistência", afirma.

Ela começou a resolver primeiro as pendências com amigos e colegas. Pagava uma dívida em um mês e guardava um pouco de dinheiro no período seguinte. Os compromissos com bancos e instituições financeiras foram solucionados de maneira gradativa em uma segunda etapa.

Mas ainda estava longe de resolver toda a sua situação e uma nova mudança dificultou sua vida ainda mais. No final de 2014, o Supremo Tribunal Federal (STF) considerou a Lei 100 inconstitucional, e os servidores efetivados pela medida perderam a estabilidade. Assim, a renda da professora caiu de três para apenas um salário mínimo. Por isso, além da organização, ela também teve que reduzir os gastos da família com roupas e começou a andar mais de bicicleta do que com o carro.

O início nos investimentos

Em 2018, quando havia pago metade de suas dívidas, Tati foi procurar informações para investir no Tesouro Direto, título público de renda fixa oferecido pelo governo federal. Antes de investir, porém, começou a dar aulas para estudantes do ensino técnico, em cursos preparatórios para concursos e também para quem visava o ingresso no ensino superior. Isso ajudou a triplicar os ganhos mensais.

O primeiro aporte no Tesouro veio com a compra de uma quota no valor de R$ 92. Em menos de um ano, ela tinha cerca de R$ 1.000 investido. "Foi muito bacana porque minha conta estava sempre no vermelho. Vi que se mantivesse a mesma disciplina conseguiria alcançar os meus objetivos", declara.

Até hoje ela mantém as rendas extras. Os ensinamentos na internet, palestras e consultorias se tornaram a fonte principal de sustento. "Todo mundo precisa ter mais uma fonte de renda, caso a renda principal venha a faltar", afirma.

Em 2020, com uma boa reserva financeira, surgiu o interesse na renda variável. Seguiu a mesma disciplina do passado de estudar por um tempo antes de colocar dinheiro. Foi saber mais sobre análise gráfica, que considera o histórico de desempenho de uma ação na Bolsa, e análise fundamentalista, que verifica os fundamentos de um negócio, por exemplo.

Depois, separou R$ 100 por mês para a compra de ações de empresas como Itaú e Itaúsa, apenas para entender como a teoria poderia ser aplicada na prática. Mais tarde fez o mesmo com os fundos imobiliários. Hoje, ela investe em bitcoin e em ações de empresas americanas como Amazon e Microsoft.

Aprendizado doeu, mas ficou

Tati afirma que a pandemia foi um aprendizado "fantástico, mas doído". Durante o isolamento social, perdeu cerca de 30% do capital alocado na renda variável. Sem dinheiro em caixa, não pôde aproveitar os momentos de queda acentuada do mercado. "A lição que fica é nunca colocar todo o dinheiro que a gente tem em investimento. É necessário ter caixa para oportunidades."

Em setembro do ano passado, foi fazer mestrado em Inovação e Educação em Portugal para continuar se aperfeiçoando na área. Nessa fase, tirou um tempo para viajar e curtir a vida com Luiz, Maria Eduarda e Fábio —uma forma de recompensar a família pelos anos mais difíceis. No futuro, também pretende fazer doutorado em Portugal ou na Espanha.

Espera enriquecer para ajudar as pessoas e contribuir com a educação dos filhos. Neste sentido diz que é sempre importante ter uma meta de vida para continuar poupando. "A gente só guarda dinheiro quando quer fazer algo. Senão, não tem sentido guardar. Precisa de algum sonho a ser realizado", declara.

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