Preços devem subir com reoneração, mas não se sabe tamanho do repasse

A reoneração do imposto sobre a folha de pagamentos deve fazer com que produtos e serviços fiquem mais caros. No entanto, não dá para saber o tamanho do repasse — que pode variar segundo o setor.

O que aconteceu

O governo federal propôs uma alternativa à desoneração da folha de pagamentos. Especialistas ouvidos pelo UOL dizem que o brasileiro deve sentir um aumento no preço de produtos e serviços que vão ter a nova cobrança de imposto, mas que não dá para medir o tamanho do aumento.

Volta do imposto vai aumentar o custo das empresas. Guilherme Tinoco, pesquisador associado do FGV Ibre, afirma que impacto financeiro ao consumidor pode variar de acordo com o setor em que a empresa está inserida. Setores mais competitivos devem ter mais dificuldades para repassar o preço, enquanto os menos competitivos podem aumentar mais os valores finais sem prejuízos de vendas.

Em mercados mais competitivos talvez a empresa precise absorver custos, o que vai implicar em menor lucro. Empresas em ambientes menos competitivos conseguem repassar preço para o consumidor final ou para a próxima indústria da cadeia.
Guilherme Tinoco, pesquisador associado do FGV Ibre

Na teoria, aumento de imposto na folha de pagamento não deveria impactar o preço ao consumidor final. Gustavo Fossati, professor da FGV Direito Rio, afirma que isto não acontece porque é difícil quantificar o impacto da tributação em cada uma das vendas isoladamente — diferentemente de quando há um aumento em impostos ligados diretamente a determinado bem ou serviço. No entanto, neste caso as empresas devem fazer repasses, porque haverá um aumento no custo das empresas, que precisará ser compensado de alguma forma.

O custo empresarial vai ficar mais caro [com reoneração]. O empresário vai ter que tomar providências. Uma das medidas é fazer um novo cálculo da mercadoria e serviço e não significa que vai repassar os 20%, porque não vai vender. Vai repassar um percentual.
Gustavo Fossati, professor da FGV Direito Rio

Valquíria Fiuza, sócia de consultoria tributária da Mazars, afirma que a tendência é que haja um aumento nos preços. Mesmo que os setores repassem os aumentos ao consumidor, não será total, na visão da especialista.

É esperado que esse aumento do custo seja equilibrado em parte com o repasse no preço, mas, principalmente (com base na sinalização dos setores), na redução de pessoas.
Valquíria Fiuza, sócia de consultoria tributária da Mazars

O que é a desoneração?

A desoneração da folha foi introduzida há 12 anos, em 2011, em caráter temporário. A medida substituiu a contribuição previdenciária patronal (CPP), de 20% sobre a folha de salários, por alíquotas de 1% a 4,5% sobre a receita bruta.

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A CPP é o recolhimento de contribuições sociais, pela empresa, ao INSS. Ou seja, é o que o empregador paga para financiar a Seguridade Social. A nova alíquota, estabelecida pela desoneração, é a CPRB (Contribuição Previdenciária sobre a Receita Bruta).

Qual a proposta atual do governo?

O governo federal apresentou uma "reoneração gradual" da folha de pagamentos. A partir de abril, as empresas vão começar a pagar uma alíquota de imposto por ano até 2027. Em 2028, volta a cobrança dos 20% de CPP. De acordo com a MP, a cobrança em 2024 começa em 10% e até 2027 chega a 18,75%, dependendo do setor.

As cobranças foram divididas em dois grupos. O primeiro deles, que inclui atividades de transporte e tecnologia da informação, tem as seguintes alíquotas:

  • 2024: 10%
  • 2025: 12,5%
  • 2026: 15%
  • 2027: 17,5%

O segundo grupo inclui setores da indústria têxtil, de calçados, obras de urbanização e edição de livros, jornais e revistas. As alíquotas são:

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  • 2024: 15%
  • 2025: 16,25%
  • 2026: 17,5%
  • 2027: 18,75%

As alíquotas reduzidas valem apenas para remunerações de até um salário mínimo (R$ 1.412). Na prática, se um trabalhador recebe um salário mínimo, a empresa vai pagar apenas a alíquota reduzida. No caso de funcionários que recebem mais, o imposto mais baixo é cobrado sobre o mínimo e o restante tem cobrança dos 20% de imposto.

Medida já está valendo?

A MP foi publicada no dia 29 de dezembro de 2023 e começou a valer a partir de então. No entanto, a reoneração gradual começa a valer no dia 1º de abril deste ano, de acordo com o texto. Na prática, as empresas vão ter a isenção do imposto até março e, em abril, começam a pagar a nova alíquota de imposto.

O Congresso Nacional vai avaliar a MP. Se os parlamentares não avaliarem o texto, a MP deixa de valer depois de 120 dias e voltam a valer as regras anteriores, ou seja, o fim da cobrança do imposto previdenciário sobre a folha de pagamento.

Redução de preços

A reoneração pode trazer redução nos preços para outros setores. É o que diz Marcos Hecksher, pesquisador do Ipea. Para Hecksher, a reoneração pode ajudar na melhora fiscal e com o fim de uma distorção que existe em favor dos setores desonerados.

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Manter esses setores desonerados exige cobrar mais tributos das empresas dos outros setores, o que aumenta os preços e reduz o emprego no resto da economia. A alternativa seria aumentar o déficit público, o que também atrapalharia toda a economia.
Marcos Hecksher, pesquisador do Ipea

A política não gerou o volume de empregos esperado. Uma pesquisa do Ipea diz que os setores desonerados fecharam vagas nos últimos anos e que empresas privadas de outros setores tiveram um aumento de 6,3% (1,7 milhão) nos empregos com carteira assinada de 2012 a 2022, enquanto os setores desonerados tiveram uma queda de 13%, o que representa menos 960 mil postos de trabalho.

Os setores desonerados tiveram queda no emprego, segundo a pesquisa. No mesmo período, todos os setores com folha desonerada reduziram suas participações nos totais de ocupados (de 20,1% para 18,9%), ocupados contribuintes da Previdência (de 17,9% para 16,2%) e empregados com carteira do setor privado (de 22,4% para 19,7%).

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