Brasil tem déficit primário recorde em setembro e indica que meta não deve ser cumprida
Por Luciana Otoni
BRASÍLIA, 31 Out (Reuters) - O setor público registrou um déficit primário de 9,048 bilhões de reais em setembro, o pior resultado para o mês na série histórica do Banco Central, praticamente jogando uma pá de cal no cumprimento da meta ajustada para 2013.
O resultado, abatido pelo mau desempenho da Previdência, foi muito pior que o esperado por analistas consultados pela Reuters, cuja mediana apontava superávit de 100 milhões de reais e tinha como pior visão um déficit de 2,6 bilhões de reais.
Mesmo diante da fragilidade das contas públicas, que podem piorar a avaliação de risco do país, o BC mantém a sua visão de que a política fiscal caminha para a neutralidade, depois de passar algum tempo classificando-a como expansionista.
Em 12 meses até setembro, segundo informou o BC nesta quinta-feira, a economia feita para pagamento de juros foi equivalente a 1,58 por cento do Produto Interno Bruto (PIB), afastando-se da meta ajustada de 2,3 por cento.
No acumulado do ano, o superávit primário somou 44,965 bilhões de reais. Para chegar à meta ajustada será necessária economia de cerca de 65 bilhões de reais no último trimestre.
A meta cheia de superávit primário para este ano era de 155,9 bilhões de reais, cerca de 3,1 por cento do PIB, mas foi reduzida diante da economia fraca e da elevada renúncia tributária decorrente das desonerações.
Em agosto, as contas públicas brasileiras já haviam sido ruins, com o primeiro déficit primário --de 432 milhões de reais-- para o mês.
"Nós esperamos que o superávit primário fique entre 1,5 e 2,0 por cento do PIB em 2013, com o governo devendo continuar a utilizar o orçamento para estimular a economia", afirmou o economista-chefe para a América Latina do Goldman Sachs, Alberto Ramos.
PREVIDÊNCIA E NEUTRALIDADE FISCAL
O pagamento do 13º salário de aposentados e pensionistas pesou na conta e, como avançou sobre setembro, continuou refletindo negativamente, elevando o rombo da Previdência e o déficit fiscal no mês.
No mês passado, segundo o BC, a maior influência sobre o resultado fiscal veio do governo central --formado pelo governo federal, Previdência Social e BC-- que apresentou déficit de 10,760 bilhões de reais. Só com a Previdência, o rombo foi de 11,763 bilhões de reais, o dobro de agosto.
As empresas estatais também apresentaram déficit de 38 milhões de reais em setembro, enquanto Estados e municípios tiveram superávit de 1,750 bilhão de reais.
Mais cedo, o Tesouro Nacional informou que os gastos com custeio ficaram em 15,5 bilhões de reais em setembro, 12,3 por cento a mais do que em agosto. Nos nove primeiros meses do ano, os gastos chegam a 134,4 bilhões de reais, 21,1 por cento a mais do que igual período de 2012.
"Em termos de dinâmica, o resultado que temos para este ano não afeta a perspectiva de neutralidade da política fiscal no horizonte relevante. O resultado até agora não muda essa perspectiva... que depende de diversos fatores, sobre como vai se desenrolar o cenário fiscal em 2014 e 2015", afirmou nesta quinta-feira o chefe do Departamento Econômico do BC, Tulio Maciel.
A avaliação do BC de que a política fiscal caminha para neutralidade foi apresentada pela primeira vez na ata do Comitê de Política Monetária (Copom) de setembro.
JUROS SOBEM
Até o fim do ano, haverá ingresso de algumas receitas extraordinárias, mas mesmo assim ela não são garantia de que a meta de superávit primário será cumprida.
Serão 15 bilhões de reais em novembro como pagamento do bônus do leilão do campo de petróleo de Libra e até outros 12 bilhões de reais nos últimos meses do ano em receita tributária extra com a recuperação de dívidas.
Na avaliação do economista-chefe da Confederação Nacional do Comércio (CNC) e ex-diretor do BC, Carlos Thadeu de Freitas, não há tempo para o governo cumprir a meta ajustada de superávit, ainda que a área econômica conte com receitas extras.
Por isso, acrescentou ele, seria importante o governo dar um sinal claro de que voltará a cumprir a meta cheia de superávit em 2014 para evitar rebaixamento no rating brasileiro.
"As agências de classificação de risco estão prontas para baixar o rating brasileiro. Se isso ocorrer, as taxas de juros vão subir ainda mais e o dólar também vai subir. Agora é hora de se evitar que haja essa tempestade perfeita."
O BC informou ainda que o déficit nominal -- receita menos despesas, incluindo o pagamento de juros da dívida-- ficou em 22,896 bilhões de reais no mês passado, enquanto a dívida pública representou 35,0 por cento do PIB. Para outubro, a projeção do BC é que a dívida líquida continue representando 35 por cento do PIB.
Os dados fiscais piores, potencialmente inflacionários pelo gastos públicos maiores, repercutiram no mercado de juros futuros, fazendo com que os contratos de DIs subissem mais e reforçando ainda mais as apostas de que a Selic --hoje a 9,50 por cento ao ano-- voltará a dois dígitos no final de novembro.
(Reportagem adicional de Anthony Boadle)
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