'Para inglês ver': Mapa desagrada ao atrasar plataforma Agro+ Sustentável
Em 31 de dezembro de 2024, entra em vigor a European Union Deforestation Regulation, regulamento da União Europeia para produtos livres de desmatamento. A EUDR, como é chamada, prevê que os 27 países do bloco deixarão de comprar quaisquer produtos provenientes de áreas desmatadas. Aplicada para o mundo todo, a regra recai sobre sete cadeias agropecuárias aqui no Brasil: soja, carne bovina, café, borracha, madeira, cacau e óleo de palma.
Para fornecer transparência à Europa sobre a origem da produção, o Ministério da Agricultura e Pecuária anunciou no começo do ano a plataforma BrasilAgro+ Sustentável. Reuniões foram feitas com países do continente e com a China, e a expectativa era que o lançamento oficial fosse em julho. Só que isso não aconteceu.
A proposta é disponibilizar informações organizadas ao comprador estrangeiro. A quatro meses da entrada da EUDR em vigor, atores ligados à agropecuária relatam a desorganização do tema dentro do Mapa, sem informações sobre o funcionamento da plataforma e, principalmente, como o Brasil pretende cumprir esta demanda do mercado.
Se a União Europeia não é um destino tão relevante para a soja, a realidade é diferente para o café. O bloco europeu é responsável por comprar quase 50% de toda a produção brasileira que é exportada. Uma fonte ligada ao Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé) afirma que o segmento está pronto para atender às regras de transparência, mas falta diretriz em relação à parte prática de cadastros e acessos à Plataforma Agro+ Sustentável.
A situação ficou ainda mais confusa com a saída de Renata Miranda, até então chefia da secretaria de Inovação, Desenvolvimento Sustentável, Irrigação e Cooperativismo, e responsável pela plataforma dentro do Mapa. Diante de sua saída no mês de julho — exatamente quando estava previsto o lançamento —, o receio é de que a plataforma não tenha avançado nos bastidores como deveria.
Pedro Alves Corrêa Neto assumiu o cargo de secretário. Ele é ex-diretor do Serviço Florestal Brasileiro, do período de Jair Bolsonaro na presidência, e ex-diretor do Departamento de Desenvolvimento das Cadeias Produtivas e da Produção Sustentável, na gestão do ministro Blairo Maggi.
Os trâmites da plataforma também são tratados por Clecivaldo de Sousa Ribeiro, diretor do Departamento de Desenvolvimento das Cadeias Produtivas e de Indicações Geográficas. No entanto, não há esclarecimentos no site do Ministério da Agricultura quanto à atuação deles e quais tarefas competem a cada um.
Procurado para saber os próximos passos da iniciativa, qual a nova data para o lançamento da Agro+ Sustentável e as funções incumbidas para secretário e diretor, o Mapa não respondeu aos questionamentos. Enquanto isso, produtores e indústrias ficam sem saber como deverão exportar os sete produtos listados para a União Europeia a partir de 2025.
Transparência voluntária
O Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro) está elaborando a plataforma em conjunto com o Mapa. Em resposta à coluna, a entidade esclarece que a adesão à plataforma é voluntária aos produtores interessados em exportar. Após login e preenchimento de dados básicos no site gov.br, a plataforma cruza informações autodeclaradas pelos produtores com as bases oficiais do governo.
"Incluindo coordenadas geográficas obtidas através do Incra e do CAR, bem como o desenho do talhão feito pelo produtor durante o cadastro. Essas informações são comparadas com bases geoespaciais, como áreas de preservação e reservas indígenas, e com o PRODES, para verificar se houve desmatamento na área especificada. As condições validadas asseguram a procedência sustentável dos produtos", explica Bruno Ferreira Vilela, superintendente de relacionamento com clientes do Serpro.
O fato de ser voluntário e trazer dados do CAR incomoda algumas pessoas ligadas à Mesa Brasileira da Pecuária Sustentável. "O CAR ainda não é sinônimo de conformidade ambiental. E, se for voluntário, voltaremos ao que é o SisBov, que era uma promessa de rastreabilidade e depois ficou limitado", diz a fonte que opta por não se identificar.
A Associação Brasileira do Agronegócio (ABAG) prefere acreditar que o novo parlamento europeu fará uma readequação na EUDR. Ingo Plöger, vice-presidente da ABAG, avalia a hipótese de o bloco estar criando "novas demandas mundiais e não ter controle sobre isso". Então, ele analisa que a União Europeia poderia recorrer "rapidamente a um acordo com o Mercosul e tentar uma demanda que já se conhece", afrouxando as regras antidesmatamento.
Por via das dúvidas, o país segue apostando em novas alianças comerciais para não depender das regras europeias. Só falta esclarecer se a Plataforma AgroBrasil+Sustentável sai do papel, ou foi anunciada só para inglês ver.
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