Inflação estável de agosto justificaria manter juros? Não é bem assim
A variação do IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo), em agosto, apresentou ligeiríssima deflação, na comparação com julho. Resultado divulgado nesta terça-feira (10) pelo IBGE mostra recuo de 0,02% no mês, também ligeiramente abaixo das previsões, com alta de 2,85% no ano, e de 4,24%, no acumulado em 12 meses, ainda bem próximo do teto do intervalo de tolerância do sistema de metas de inflação.
Não se pode, porém, concluir que a alta de preços tenha refluído para uma zona de conforto mais permanente e estrutural. Fatores pontuais levaram a inflação de agosto a estacionar. Mas há pressões à frente que, com quase certeza, vão limitar episódios de deflação mensal, provavelmente até o fim de 2025, a esta ocorrida em agosto.
Subir juros?
Ainda assim é duvidosa a necessidade de elevar a taxa básica de juros (taxa Selic) na reunião do Copom (Comitê de Política Monetária), marcada para a semana que vem. Muitas pressões sobre a inflação, nos próximos meses, também serão pontuais, e, além disso, sem falar no início de um ciclo de cortes de juros nos Estados Unidos, a expectativa já é de desaceleração da atividade no segundo semestre deste ano.
O uso da política monetária para derrubar a atividade econômica e, na sequência, aliviar a alta de preços, no caso atual, é um tiro de canhão que, para atacar itens específicos, corre o risco de detonar todo o ambiente em volta.
É provável, contudo, que uma alta da Selic — mais para 0,25 ponto percentual do que para 0,5 ponto —, seja determinada pelo Copom, até para também elevar um suposto grau de confiança na condução de uma política de juros mais comprometida com a convergência da inflação para o centro da meta.
Em agosto, a inflação ficou no zero a zero principalmente pelas quedas mais acentuadas em energia elétrica e passagens aéreas. Tarifas de energia recuaram 2,8%, com a adoção da bandeira verde. Os voláteis preços de passagens aéreas, depois do pico das férias de meio de ano, caíram quase 5%. O preço dos alimentos também registrou queda de 0,44%, mas a deflação no segmento está menos intensa a cada mês.
Dólar e estiagem
Depois da calmaria de agosto na inflação, virá não uma tempestade, mas uma chuvinha insistente, nos meses futuros. Para setembro, por exemplo, as projeções apontam alta mensal de preços entre 0,5% e 0,6%. Com acumulados em 12 meses, a cada mês até dezembro, sempre na fronteira de 4,5%, teto do intervalo de tolerância, nível em que fecharia 2024.
O repique da inflação em setembro será puxado pela retomada nas tarifas de energia, agora sob a pressão da bandeira vermelha nível 1. Também aumentos em cigarros e em alimentos, refletindo os primeiros efeitos da estiagem que atinge boa parte das regiões produtoras, contribuirão para um IPCA mais pressionado neste mês.
Para o restante do ano, nas projeções do economista Fábio Romão, experiente responsável pelo acompanhamento de preços na LCA Consultores, os preços dos alimentos passarão a pressionar a inflação, assim como os de bens industriais, estes refletindo as altas ocorridas na cotação do dólar, de R$ 5 para R$ 5,5 ao longo do ano.
"A severa estiagem é o principal fator de nossa projeção de alta de 6% em alimentos, neste ano, contra elevação de 1% em 2023, sendo que os preços da alimentação no domicilio, depois de recuo de 0,5%, no ano passado, devem subir 6,5% este ano. De outro lado, com a provável desaceleração no ritmo da atividade econômica, os preços dos serviços não serão tão pressionados, devendo subir 5,1%, em 2024, em marcha semelhante à verificada em 2023". Fábio Romão, economista da LCA Consultores
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