Filosofia pode ser profissão do futuro, diz autor do best-seller 'Sapiens'
Já parou para dar uma olhada nas listas com as possíveis profissões do futuro? Elas geralmente apresentam ocupações nas áreas de tecnologia e engenharia, como especialista em big data, analista de IoT (internet das coisas) e engenheiro de cibersegurança.
Mas, segundo o historiador israelense Yuval Noah Harari, autor do best-seller autor do livro "Sapiens - Uma Breve História da Humanidade", um profissional até então sem muito valor no mercado pode ganhar espaço nos próximos anos: o filósofo. A ideia foi apresentada por ele em seu novo livro, "21 lições para o século 21" (Companhia das Letras).
A valorização do filósofo, segundo ele, deve ocorrer por causa da inteligência artificial, área que, segundo a Intel, deve movimentar US$ 36,8 bilhões (R$ 139,8 bilhões) no mundo até 2025. Os filósofos, escreveu Harari, ajudariam na programação de máquinas inteligentes, principalmente aquelas que, no futuro, precisem lidar com "dilemas morais".
Por exemplo, no caso de um veículo sem motorista, se duas crianças entrarem na frente do carro, questionou o autor, o que o automóvel deve fazer? Atingir os meninos ou desviar para o lado, arriscando colidir com um caminhão na direção oposta e matar os ocupantes?
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Harari afirmou no livro, ainda, que os "algoritmos filosóficos" dificilmente serão perfeitos e que, pela primeira vez na história, será possível processar um filósofo "pelos infelizes resultados de suas teorias".
"Vimos que o surgimento da inteligência artificial pode expulsar muitos humanos do mercado de trabalho -inclusive motoristas e guardas de trânsito. No entanto, poderá haver algumas novas aberturas para os filósofos, haverá subitamente grande demanda por suas qualificações -até agora destituídas de quase todo valor de mercado. Assim, se você quer estudar algo que lhe assegure um bom emprego no futuro, talvez a filosofia não seja uma aposta tão ruim", escreveu.
Só que para esse cenário se concretizar, relatou ele, é preciso encontrar "uma maneira de codificar a ética em números e estatísticas precisas". E é aí que mora o problema, segundo profissionais ouvidos pelo UOL.
É possível ensinar moral e ética às máquinas?
Sempre que houver uma necessidade mais reflexiva, como no caso de juízos morais, estéticos e epistemológicos, o filósofo será necessário, afirmou Eduardo Barra, professor de filosofia e pró-reitor de graduação da Universidade Federal do Paraná (UFPR). No entanto, ele não acredita que será possível ensinar essas questões às máquinas, pois elas são sintéticas e não conseguiriam avançar nesses domínios.
"Esses equipamentos, no futuro, podem até aprender novas regras, mas, invariavelmente, vão agir conforme o que foi dito a eles", disse.
Moral e ética não são questões que se definem exclusivamente com base em um sistema pré-programado. São decisões que precisam ser consideradas caso a caso, conforme contextos específicos
Eduardo Barra, professor de filosofia na UFPR
Davi Sidnei de Lima, professor de filosofia e psicologia da Faculdade Bagozzi (PR), tem opinião semelhante. Para ele, as máquinas são capazes de trabalhar com infinitos algoritmos, e daí vem a capacidade de apresentarem soluções, preverem problemas e encontrarem respostas, o que as torna inteligentes.
A moral, no entanto, envolve o dinamismo da existência, a qual não é possível de ser abarcada pelas infindas possibilidades dos algoritmos. Ela vai além da técnica e da lógica
Davi Sidnei, professor de filosofia e psicologia
Como filósofos podem ajudar?
Juliano Tebinka Gonçalves, CEO da Softinova, braço da PGMais (grupo que oferece soluções em inteligência artificial), afirmou ter gostado da ideia do autor best-seller. Ele disse que parte de sua equipe, formada por 20 pessoas, entre contratados e terceirizados, é responsável pelo script, conjunto de instruções dadas aos robôs, e pelo algoritmo, que interpreta as interações deles com as pessoas.
"Hoje, fazemos isso de forma empírica, acompanhando o dia a dia, mas com certeza seria interessante ter alguém com mais bagagem em ética e moral nessa função. Se treinarmos as máquinas de forma inadequada, poderemos criar robôs com comportamentos ruins, como o Tay, da Microsoft."
A ferramenta da multinacional de tecnologia, após um dia interagindo na internet com adolescentes, passou a publicar conteúdos racistas, sexistas e antisemitas.
Outro exemplo aconteceu com a Amazon, que tentou usar inteligência artificial para criar programas de computador que revisassem os currículos dos candidatos a emprego. O objetivo era automatizar a busca por talentos. O problema: o sistema era "machista", e dava preferência a candidatos do sexo masculino.
Gonçalves disse acreditar, no entanto, que a procura por filósofos possa demorar um pouco, porque, no momento, o mercado ainda está focado em criar aplicações para trabalhos burocráticos e específicos. A empresa, por exemplo, tem a robô Sofia, que faz agendamentos de consultas e não tem que lidar, ainda, com nenhum dilema moral e ético.
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