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Dólar a R$ 3,20? Por que o mercado parece tão animado com o impeachment

Ruth Costas

Da BBC Brasil, em São Paulo

18/04/2016 17h07

Mergulhado numa das piores recessões de sua história, o Brasil está paralisado por uma intrincada crise política que pode levar a uma troca de governo. Como resultado, o desemprego aumenta mês a mês e há um número crescente de negócios fechando as portas.

Para completar, analistas políticos ressaltam que, se a presidente Dilma Rousseff for de fato afastada, a lista de "incertezas" sobre um eventual governo do vice Michel Temer (PMDB) ainda é grande. Vai desde o processo que pode resultar na impugnação da chapa Dilma-Temer no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) até a baixa popularidade do peemedebista (segundo o Datafolha, 58% da população aprova seu impeachment).

Mas quem olhava para os números do mercado financeiro brasileiro na contagem regressiva para a votação do impeachment na Câmara – e agora para a do Senado – pode ter a impressão de que os investidores e operadores estão enxergando o país sob outra perspectiva.

Desde o início do ano, a Bolsa brasileira subiu mais de 20% em reais – e 38% em dólares. Ou seja, as ações das empresas brasileiras subiram.
O real também se valorizou recentemente frente à moeda americana, com a cotação caindo de R$ 4 por dólar, em janeiro, para algo em torno de R$ 3,60 hoje. Foi a segunda moeda que mais subiu no mundo no período, atrás apenas do kwacha zambiano.

"E com o impeachment passando na Câmara, avaliamos que o dólar pode chegar até a R$ 3,20 já nesta semana", diz Raphael Figueredo, analista da Clear corretora.

Mas, afinal, por que o mercado parece tão animado em meio a decisão sobre o afastamento de Dilma? E como a aprovação do impeachment pela Câmara pode impactar a cotação do dólar e a Bolsa?

Fator externo

Para começar, segundo analistas consultados pela BBC Brasil, ao menos parte da explicação para a melhora recente das perspectivas dos investidores sobre o Brasil vem de fora, não de dentro das fronteiras do país.

"Há um cenário mais favorável para os emergentes em todo o mundo", diz André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos. "A bolsa colombiana, por exemplo, também subiu 18% desde janeiro e a da Turquia, 19%."

Nos últimos meses, os EUA vêm dando sinais de que devem demorar mais do que o esperado para começar a apertar sua política monetária – o que tem favorecido a desvalorização do dólar frente a outras moedas.

"Também há uma alta dos preços das commodities que favorece os emergentes. E o petróleo se recuperou um pouco, passando do patamar dos US$ 30 para os US$ 40", explica Wilber Colmerauer, diretor do Emerging Markets Funding, em Londres.

Mauro Schneider, economista da MCM Consultores, concorda que os fatores externos têm sido relevantes, mas ressalta que "ainda é, sem dúvida, o cenário local – e em especial, a perspectiva de um fim do governo Dilma – que prevalece como fator de impulso aos mercados."

Ele diz que os analistas há algum tempo já estavam apostando que o impeachment passaria na Câmara e esperam que sua aprovação seja mais fácil no Senado (onde é necessária uma maioria simples para que a presidente seja afastada de suas funções por 180 dias, enquanto aguardaria o julgamento final pela Casa).

"A sensação geral (nos mercados) é que qualquer coisa é melhor que o atual governo", diz Schneider.

"Espera-se que, mesmo sem conseguir passar reformas estruturais no Congresso, um governo Temer possa ao menos tomar algumas medidas que melhorem as expectativas sobre a economia. Por exemplo, anunciando nomes bem vistos (pelo mercado) para a Fazenda e Banco Central; ou avançando na costura de acordos comerciais e nas concessões."

Recuperação

Há quem veja a melhoria dessas percepções sobre o cenário brasileiro com mais cautela.

Para Colmerauer, por exemplo, os ativos do país estão experimentando, na realidade, "uma pequena recuperação" depois da grande queda sofrida desde o fim de 2014 e início de 2015.

"Desde outubro de 2014, só tivemos más notícias na economia e na política. A Bolsa brasileira chegou a cair 70% em dólar. Então é preciso considerar que a subida parte desse ponto mais baixo", diz ele.

"Não sei se podemos falar em 'animação' do mercado com a possibilidade de um impeachment. A questão é que um afastamento da presidente representaria no curto prazo alguma esperança de melhoria, ainda que ninguém espere que seja o ponto final da crise."

Colmerauer admite que também há muitas incertezas sobre um eventual governo Temer.

"O mercado está disposto a dar a ele um voto de confiança, espera que o vice seja uma espécie de Itamar (Franco) que fez um bom governo de transição. Mas é certo que, se Dilma de fato for afastada, ele precisará agir rápido, aprovando medidas que mostrem, por exemplo, que está comprometido com o ajuste fiscal. Porque essa lua de mel também pode acabar rapidamente."

Carlos Melo, cientista político do Insper, segue na mesma linha: "O mercado vive de humor, de curto prazo. Você compra hoje esperando uma coisa e, se não der certo, vende mais tarde. Por isso um melhor termômetro das expectativas de médio e longo prazo sobre o país são os investimentos diretos na economia. E esses não estão crescendo", diz.

Reações

Quanto às expectativas sobre uma reação dos mercados ao resultado da votação deste domingo, os especialistas se dividem.

Para Colmerauer, como a aprovação do impeachment na Câmara já estava precificada, é possível inclusive que nesta segunda-feira a Bolsa se mantenha estável.

"E ao longo dos dias até caia, conforme aumentem as especulações e notícias sobre as dificuldades que um eventual governo Temer terá pela frente. Passada a comemoração será a hora de pensar nos problemas", diz ele.

Para Figueredo, da Clear Corretora, e Schneider, da MCM Consultores, a reação seguramente será positiva – com uma alta da Bolsa e do real.

É esse tipo de reação faz com que os mercados financeiros sejam frequentemente acusados por economistas heterodoxos e figuras ligadas ao Planalto de "jogar contra" o governo para pressionar por políticas ortodoxas (que seriam de seu interesse porque lhe renderiam mais lucros com juros sobre títulos do governo).

Na estimativa da consultoria Tendências, por exemplo, com Dilma o dólar chega ao fim do ano a R$ 4,43. Sem Dilma, a R$ 3,72.

Segundo Figueredo e Schneider, porém, a reação dos mercados à votação da Câmara pode variar de acordo com a interpretação sobre o placar da votação, que foi 367 (a favor do impeachment) a 146 (contrários, abstenções e ausências).

"Se o mercado interpretar que o impeachment venceu com mais folga do que era esperado, a Bolsa tende a subir mais, porque isso será visto como um sinal de que Temer terá mais apoio para governar", opina Figueredo.