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Plantas não convencionais diversificam cardápios e impulsionam novas empresas

29/07/2017 15h00

Otávio Nadaleto.

São Paulo, 29 jul (EFE).- No Brasil, uma das maiores potências agrícolas mundiais, Plantas Alimentícias Não Convencionais (Pancs) despertam a atenção da sociedade e dos órgãos públicos, surgindo como alternativa para diversificar a alimentação e criar novas empresas.

O termo diz respeito a espécies pouco presentes no dia a dia da população, mas cujas partes da planta podem ser utilizadas como alimento ou em preparações culinárias diversas, como temperos e especiarias.

Normalmente, elas não têm cadeia produtiva estabelecida, fato que se percebe, por exemplo, por não se encontrar sementes destas espécies na rede convencional de insumos agrícolas.

Como cada região possui diferentes tipos de Pancs, a variedade dessa categoria é muito grande. Alguns exemplo são a ora-pro-nóbis, em Minas Gerais e no Paraná, a taioba, no Espírito Santo, e o jambu, no Amazonas.

Segundo o professor do Instituto Federal de Educação do Amazonas (Ifam), Valdely Ferreira Kinupp, das principais espécies vegetais consumidas mundialmente, 52% vieram da Europa e da Ásia, o que impõem uma preocupante "monotonia alimentar" sobre nossa dieta.

"Hoje, nós comemos no máximo cem espécies de plantas anualmente. Porém em minha pesquisa de doutorado encontramos 21% de taxa de comestibilidade somente nos biomas brasileiros", revelou o professor à Agência Efe.

"Considerando que há 46 mil plantas catalogadas no país, isso nos daria cerca de 10 mil espécies comestíveis em números conservadores", explicou Kinupp.

De acordo com o pesquisador, as Pancs se propagam em terrenos acidentados e pouco aproveitados para cultivos tradicionais, como encostas e áreas degradadas, o que, na necessidade de se aproveitar território, é altamente relevante.

"Geralmente elas também são mais nutritivas do que plantas altamente domesticadas. São boas para a memória, o funcionamento sexual, reprodutivo e não estão no mercado ou na merenda escolar", criticou.

Para o pesquisador, os consumidores estão cada vez mais interessados nesses cultivos, a mesma conclusão à qual chegou Clarissa Taguchi, que aproveitou a oportunidade para empreender e fundou a PANCS Brasil, autointitulada a primeira empresa nacional a explorar comercialmente tais plantas.

Ela trabalhava com gastronomia orgânica e conta que, para melhorar sua lucratividade, estudou o livro de Kinupp e passou um ano só testando sabores. A empresa, que começou apenas com temperos, expandiu o portfólio para molhos, maioneses e manteigas e hoje conta com mais de 40 produtos.

"Como tive um restaurante vegano, as vendas começaram com meus contatos e em feiras. Também fizemos testes vendendo para food trucks, mas, nesse caso, há um certo preconceito, se você fala que é vegano nem sempre eles compram", lamentou.

O crescimento anima: com investimento de cerca de R$ 10 mil, eles "saíram do vermelho" em cinco meses. Atualmente, ela recebe ofertas de representação comercial e encomendas de diversas lojas, mas tais avanços ainda devem demorar.

Atento às mudanças, o setor público também manifestou interesse pelas Pancs. Em junho, a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) realizou o "I Encontro Nacional de Hortaliças Não Convencionais" (HortPanc), em Brasília.

"Nosso objetivo tem sido preservar as hortaliças Pancs, mantendo a coleção base na Embrapa e fortalecendo iniciativas para promoção de sua produção e do consumo no Brasil", explicou Nuno Rodrigo Madeira, da Embrapa Hortaliças.

"Alguns consumidores, muitas vezes também produtores, ajudam a valorizá-las e divulgá-las. Além dos sabores, a gastronomia também tem interesse por seus valores decorativos. Tudo está ligado: a pesquisa, as políticas públicas, assim por diante", destacou Neide Botrel, também da Embrapa Hortaliças.

Apesar de contribuírem para a oferta de alimentos, Kinupp adverte que as Pancs sozinhas não são a solução para a questão da segurança alimentar, como sugerem algumas pessoas.

"Precisamos pensar que mesmo com uma crescente população, atualmente de 7 bilhões de pessoas, nós temos excesso de comida. O que precisa ser solucionado é o desperdício de alimentos e de áreas agricultáveis", concluiu o especialista.