Apartamentos com preço do metro quadrado de NY: por que o Sul está tão caro

Na cidade turística de Canela, no Rio Grande do Sul, acaba de ser lançado um empreendimento da rede alemã Kempinski, famosa na Europa por seus hotéis de luxo. Previsto para ser inaugurado em 2026, o Kempinski Laje de Pedra Hotel e Residences, primeiro da grife na América do Sul, vai reunir apartamentos para hospedagem de curto prazo, para uso como segunda residência e também para compartilhamento de propriedade no sistema de rodízio. O metro quadrado de uma unidade pode chegar a custar R$ 98 mil, valor semelhante ao cobrado em Nova York, nos Estados Unidos, uma das cidades mais caras do mundo.

A valorização dos imóveis em regiões turísticas do Sul do Brasil tem chamado a atenção. A cidade de Balneário Camboriú, no litoral de Santa Catarina, é considerada a Dubai Brasileira, com seus arranha-céus na orla e o metro quadrado mais caro do país — R$ 12.335, segundo o índice Fipe/Zap. O preço de um apartamento no One Tower, o edifício residencial mais alto da América Latina, pode chegar a R$ 15 milhões.

O que justifica essa valorização? Para a coordenadora de projetos de construção do FGV Ibre, Ana Maria Castelo, há uma boa dose de marketing, somada à falta de terrenos disponíveis para novas construções.

O hotel de luxo na Serra Gaúcha

Metro quadrado por R$ 98 mil. O valor é referente à venda da última unidade com face para o Vale do Quilombo, da primeira fase do empreendimento. Questionada sobre o valor das demais unidades, a Kempinski informa que não há valor metro quadrado fixo, porque vai depender de alguns fatores como posição da unidade, fase da construção em que se der a compra, e forma de pagamento.

Apartamentos e propriedade compartilhada. Além do hotel, a rede oferece apartamentos com foco em uma segunda residência ou para investimento, com metragem que varia de 53m² até 220m², seguindo o padrão de decoração e as comodidades da bandeira alemã.

A ideia de lançar um hotel de altíssimo padrão na serra gaúcha surgiu durante a pandemia. José Ernesto Marino Neto, presidente e fundador da empresa de gestão de investimentos hoteleiros BSH International, que trouxe para o Brasil vários grupos internacionais como o Meliá, vislumbrou a possibilidade de construir o hotel mais luxuoso do país em Canela. "Na pandemia, procurei José Paim, da gestora de fundos de private equity líder no setor imobiliário Maxcap, que hoje é meu sócio, e apresentei a ideia de fazer um hotel de altíssimo padrão na serra gaúcha", conta José Ernesto Marino Neto, sócio do Kempinski Laje de Pedra.

Retrofit com bandeira internacional. O novo empreendimento não está sendo construído do zero: vai surgir de uma reforma (retrofit, no jargão do setor) do Hotel Laje de Pedra, em Canela, que no passado era o responsável por movimentar boa parte da economia da cidade. Além da importância histórica do prédio, a localização privilegiada e a vista para a serra eram atrativos. Marino Neto e Paim organizaram um plano de negócio e apresentaram para a Kempinski. "Eles viram a apresentação, que contou até com imagens captadas por drones, gostaram da proposta e assinaram o projeto sem terem ido ao local", conta Marino Neto.

O projeto tem um custo de R$ 1 bilhão. A ideia é manter traços arquitetônicos e características mais marcantes do prédio, mas com um ar mais contemporâneo. A transformação do local tem as assinaturas de nomes conhecidos da arquitetura brasileira, como os escritórios Perkins & Will, Anastassiadis Arquitetos e Sergio Santana.

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Kempinski Laje de Pedra Hotel e Residences
Kempinski Laje de Pedra Hotel e Residences Imagem: Divulgação

Requinte para um público seleto. A reforma do hotel segue rigorosamente as exigências do grupo estrangeiro, como explica Marino Neto. Entre as peculiaridades, tiveram de adequar "paredes de lã de vidro e refrigeradores embutidos, o que nos obrigou a importar da Alemanha e fazer de exaustão por dentro dos armários".

Um pedaço da Europa no Brasil. Para os empreendedores, o hotel "é um produto único, que traz um pouco da Europa para Serra."

Hotel e condomínio de altíssimo padrão. O complexo contará com nove restaurantes, entre eles um restaurante de especialidades com chefs internacionais da Kempinski, quatro piscinas, um spa com mais de mil metros quadrados, anfiteatro, teatro para 400 lugares e centro de convenções, entre outras comodidades.

Qual é o perfil de quem compra ou investe no hotel?

Pessoas de classe média alta em busca de uma segunda residência. Segundo o sócio do hotel, os principais compradores hoje são famílias que buscam uma casa de campo, mas com o conforto e serviço hoteleiro. "Podemos dizer que a maioria é da região — gaúchos e catarinense", explica Neto.

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Investimento em propriedade compartilhada. "Também temos um número de investidores interessados em comprar parte do apartamento, a chamada economia compartilhada — pode usufruir o imóvel em um período do ano e o tempo restante o apartamento é alugado", diz Marino Neto.

Dinheiro do agronegócio. Além dos investidores locais, uma parcela dos interessados em comprar apartamentos no Laje de Pedra é composta por proprietários rurais. "O PIB [Produto Interno Bruto] está concentrado no agronegócio. Além de ter recursos para investir, esse público que compra imóveis em Camboriú e na Serra busca qualidade de vida e segurança", destaca Neto.

Por que cidades turísticas do Sul estão tão valorizadas?

Demanda maior que a oferta. Houve um aumento da procura por imóveis na região, como observa Neto, o que faz com que os preços se elevem. Isso vale para Canela, mas também para Balneário Camboriú. Como destacam os especialistas, as cidades são pequenas e com poucos terrenos disponíveis para a construção de grandes empreendimentos.

Falta de terreno para novas construções e crescimento populacional. "A falta de terrenos disponíveis leva a construção de prédios cada vez mais altos e apartamentos menores, isso encarece o valor do imóvel", explica, Jean Michel Galiano, vice-presidência de Marketing do Secovi-PR e diretor da Apolar Imóveis. "Em dez anos, Santa Catarina teve um aumento significativo da população, o que aumentou a demanda", diz.

Interesse no Sul em busca de segurança e qualidade de vida. Para Galiano, investidores de outros estados, principalmente da região Centro-Oeste, compram imóveis na região Sul em busca de qualidade de vida e segurança. "Camboriú passou a ser uma alternativa ao Rio de Janeiro, por exemplo. Além disso, é uma possibilidade de investimento para quem quer colocar imóveis para alugar porque terá um bom retorno", diz Galiano.

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Investidores estrangeiros. Principalmente em Balneário Camboriú, o foco da publicidade foi direcionada a clientes do exterior, como explica o especialista.

Especulação imobiliária. Para a coordenadora de projetos de construção do FGV Ibre, Ana Maria Castelo, o que está acontecendo, principalmente em Camboriú, está associado à especulação imobiliária. "Uma celebridade compra um imóvel, há uma ação de marketing que chama a atenção das pessoas, e os preços vão às alturas."

Boom imobiliário aumenta custo de vida e leva ao êxodo de moradores. O aumento do valor do metro quadrado impacta diretamente a vida dos moradores da região. Com o aumento dos preços dos imóveis, há um aumento no valor do aluguel e do custo de vida, resultado, moradores mais antigos são obrigados a procurar um local mais barato para viver.

As pessoas não conseguem acompanhar o aumento do custo de vida se não houver uma política pública que proteja essa população, mas em cidades onde o turismo se sobrepõe pode haver um conflito de interesses, com a arrecadação e IPTU mais alto.
Ana Maria Castelo, Ibre-FGV

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