Taxação de compra até US$ 50 opõe varejo local e chinesas; votação é adiada

A possibilidade de mudanças nas regras de tributação de produtos importados com valor de até US$ 50, aventada há semanas, tem gerado uma guerra de versões. De um lado, estão a indústria e o varejo nacionais. Do outro, plataformas de e-commerce hoje internacionais e que nasceram na China, como Shein e AliExpress. Incluído no projeto de lei do Mover (Programa Mobilidade Verde e Inovação), de incentivo para veículos sustentáveis, o tema seria votado nesta quarta-feira (22) na Câmara, mas a apreciação pelos deputados acabou adiada.

Votação

Câmara adia votação de projeto mais uma vez. Sem acordo sobre o fim da isenção para as compras internacionais, o relator da proposta, Átila Lira (PP-PI), disse que está analisando uma solução.

A taxação das compras internacionais está condicionada à aprovação do programa Mover. Na mesa de discussão, está a possibilidade de estabelecer uma alíquota diferente dos 60% que seriam cobrados com o fim a isenção. O governo e o PT brigam para que o tema seja tratado em outra proposta.

O que diz o varejo brasileiro

O modelo atual é uma "injustiça que beira a irresponsabilidade", diz André Farber, CEO da Riachuelo. Pelas regras atuais do Remessa Conforme, compras internacionais de até US$ 50 são isentas de imposto de importação — que seria de 60%. Elas pagam apenas o ICMS de 17%. O programa está em vigor desde o ano passado.

Temos grande esperança que a Justiça prevaleça. A indústria e o comércio nacional não estão pedindo vantagens, mas sim isonomia. O Brasil tem um nível alto de tributos. Para vender qualquer produto, dependendo da categoria, pagamos de 80% a 100% de imposto. E eles estão com uma taxa de 17%. É uma vantagem competitiva injusta. A gente está falando de um risco gigante de desindustrialização do Brasil.
André Farber, CEO da Riachuelo

Se a política continuar, Riachuelo diz que vai ter que fechar postos de trabalho. "O que está acontecendo é uma injustiça que beira a irresponsabilidade. Chegou num ponto que está difícil de conter. Se essa for a política, vou ter que fechar postos aqui e começar a importar. Estamos na esperança de que o bom senso vai voltar", disse Farber ao UOL.

Nesse caso, os mais prejudicados serão as pequenas e médias empresas, diz Fernando Yunes, CEO do Mercado Livre. "As grandes vão se mobilizar para criar áreas de cross border, mas os pequenos não vão conseguir criar essa estrutura", diz.

Segundo Yunes, dados do setor já mostram queda nas vendas online do segmento de moda, enquanto o e-commerce como um todo cresceu. Yunes diz que há vendedores que usam o Remessa Conforme no Mercado Livre, mas que é um percentual muito pequeno das vendas.

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Com certeza quem está sendo mais afetado com essa falta de isonomia são as pequenas e médias empresas. É como se reduzisse a demanda dos produtores aqui e passasse para a Ásia por uma questão fiscal.
Fernando Yunes, CEO do Mercado Livre

O que dizem a Shein e a AliExpress

A Shein diz que o consumidor tem que ser considerado. A empresa diz que está aberta a debater, mas que a discussão deve ser fundamentada e baseada em dados, não feita às pressas. "Queremos que essa discussão seja fundamentada e que leve em conta esse cenário complexo. E não que seja feita em cima da hora", diz Felipe Feistler, diretor da Shein no Brasil.

Não estão colocando o principal ator no centro da discussão, que é o consumidor. O público principal de todas as plataformas é classe C, D e E. São as pessoas que mais ganham nesse cenário de disponibilização de produtos antes nunca disponibilizados. Elas não tinham acesso e hoje têm.
Felipe Feistler, diretor da Shein no Brasil

As vendas internacionais sofreriam impacto se o imposto de importação de 60% estivesse valendo. Segundo a Shein, quando foi aplicado o ICMS de 17%, as vendas de importados tiveram queda da ordem de 30%. Mas a empresa diz que está comprometida com o Brasil, e que o seu marketplace, com produtos nacionais, já representa 55% das vendas no país.

Já a AliExpress se manifestou por meio de nota. A empresa afirma que "permanece disponível e colaborativa com o governo brasileiro e outros setores envolvidos para trabalharem juntos, levando em consideração quem mais importa, o consumidor brasileiro", e que entende que "o debate sobre a tributação de compras internacionais necessita de uma discussão mais aprofundada, ouvindo todos os lados envolvidos".

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Compras no exterior não são taxadas. A AliExpress diz ainda que "nada altera a isenção para viagens internacionais, que permite que quem viaja para fora do país compre uma variedade de produtos isentos de qualquer imposto no valor total de R$ 5 mil a cada 30 dias". Afirma também, com a mudança, a tributação de itens importados de qualquer valor comprados via e-commerce será de 92%, "a maior taxa praticada em todo o mundo".

Guerra de dados

A iminência da votação gerou uma guerra de dados sobre o tema. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), citou nesta terça-feira, 21, uma pesquisa segundo a qual a maioria dos consumidores de sites asiáticos que seriam atingidos com o fim da isenção para compras no exterior de até US$ 50 são de classe alta.

A Shein divulgou então um levantamento com dado oposto. Segundo o estudo, a maior parte dos seus consumidores são das camadas mais pobres da população. Segundo o levantamento, o percentual de consumidores das classes C, D e E que adquirem produtos internacionais na plataforma da empresa é de 88%.

O que acontece agora

Não foi marcada nova data para a votação ainda. A votação estava prevista para o início desta semana, mas já tinha sido adiada justamente por conta da polêmica envolvendo o Remessa Conforme.

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