Plano Safra 24/25 deve ter novo recorde, mas setor aguarda seguro maior
Danielle Castro
Colaboração para o UOL, de São Paulo
31/05/2024 04h00
O Plano Safra 2024/2025 federal deve ter novo recorde em linhas de crédito rural e juros melhores. Com os efeitos das mudanças climáticas e quedas de commodities no ciclo anterior, porém, a expectativa do setor para esta edição é alta, sobretudo para o seguro de socorro da produção e recursos para investimento.
O UOL Economia entrou em contato com o Mapa (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), mas a pasta não se manifestou até o fechamento desta edição. Já o Ministério do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar informou que só deve se pronunciar na segunda quinzena de junho, quando for feito o lançamento oficial do próximo Plano Safra.
O que o setor espera
Aumento de 26,2% em relação a 2023. Nos bastidores do setor, entretanto, já se fala em um total próximo de R$ 550 bilhões, valor 26,2% maior que os R$ 435,8 bilhões disponibilizados na safra 2023/2024, e até em um aumento que chegue a 30,8% em relação ao ano anterior.
Novo recorde. O montante seria um novo recorde da principal política de financiamento da agropecuária brasileira, que ano passado já havia atingido seu maior índice histórico e apresentado crescimento de 27%.
Atenção aos produtores gaúchos neste Plano Safra. A preocupação com a gravidade das enchentes no Rio Grande do Sul é outro tópico que membros do governo têm deixado escapar em eventos. No último dia 14, durante a apresentação da colheita de grãos 2023/2024 pela Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), o governo federal sinalizou que está prevista atenção especial aos produtores gaúchos neste Plano Safra.
Impacto das mudanças climáticas. Durante a Agrishow, realizada no começo do mês, o ministro Carlos Fávaro, do Mapa, declarou que a produção de 2023/2024 tem sido "uma safra difícil por [conta das] mudanças climáticas" e que o governo daria este ano "total prioridade ao novo Plano Safra", inclusive com oferta de "juros mais compatíveis" e que evitem levar o setor à inadimplência.
Apoio ao avanço da mecanização no campo. No mesmo evento, o ministro Paulo Teixeira, do Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar, disse que o próximo Plano Safra deve "desenhar" um avanço de mecanização para pequenos e médios produtores com a meta de subir de 18% para 70% o uso de maquinários no campo de propriedades familiares.
Novos desafios
Plano safra é um 'pilar' para o agro. João Marchesan, presidente da Agrishow e membro da Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos) disse na abertura da feira que "há 21 anos o Plano Safra tem sido um pilar fundamental para o desenvolvimento agrícola brasileiro" e que os juros controlados para atender a demanda o agro de forma compatível com o retorno são um desafio hoje no Brasil.
Mas governo precisa fazer direcionamentos. Com a chegada do anúncio do Plano e frente às grandes perdas nas culturas gaúchas, entretanto, Pedro Estevão Bastos de Oliveira, vice-presidente da Abag (Associação Brasileira do Agronegócio) afirma que esta edição precisa focar em alguns pontos. "O Plano é sempre muito esperado e estão falando de algo em torno de R$ 550 bilhões em recursos. É bastante dinheiro, mas, basicamente, cobre um terço das necessidades, não cobre tudo. Então cabe ao governo fazer alguns direcionamentos", pontua.
Valor do seguro é um ponto que precisa ser observado. Segundo o vice-presidente da Abag, o restante dos recursos do setor é dividido entre as trades de financiamento e o capital de giro próprio dos agricultores."Temos alguns itens que estão prementes, pedindo mais atenção. O primeiro é o seguro. Esse ano o governo colocou R$ 900 milhões para seguro, e o pessoal tem pedido para a próxima safra R$ 4 bilhões, lembrando que a safra 23/24 teve um problema climático muito grande no Brasil", diz Oliveira.
Necessidade de armazenamento melhor. Outro ponto importante é a armazenagem, uma vez que pede investimentos altos e os juros mais baixos do Safra podem ser um diferencial. "Nós temos um déficit de 120 milhões de toneladas. Isso é um problema muito sério para o agricultor, porque às vezes deixa ao ar livre e perde [colheita] por chuva. Há dois anos que o governo tem colocado muito pouco dinheiro no investimento", afirma o vice da Abag.
Práticas sustentáveis. Oliveira reforçou ainda que a catástrofe no Rio Grande do Sul deixou "claro para todos" que o Brasil tem um problema climático em mãos. "Ano passado o governo já tinha falado em dar crédito diferenciado para produtores com práticas sustentáveis, esse é um bom caminho, que a médio e longo prazo pode mitigar [efeitos da] mudanças climáticas", avalia o vice.
Setor aguarda o aceite de proposta. Almir Torcato, gestor corporativo da Canaoeste (Associação dos Plantadores de Cana do Oeste do Estado de São Paulo), diz que o setor aguarda o aceite da proposta elaborada pela CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil) em conjunto com as federações, sindicatos, produtores e entidades setoriais. O documento, entregue em 24 de abril ao ministro Fávaro, segundo Torcato, solicita, entre outros pontos, "R$ 570 bilhões em recursos financiáveis para a temporada, um aumento de 30,8% em relação aos R$ 435,8 bilhões anunciados para o ciclo 2023/24, destinados a produtores de todos os portes (pequenos, médios e grandes)".
Valor é essencial para manter o desenvolvimento do setor. Para o gestor, esse aumento no volume financeiro é agora essencial para manter o desenvolvimento do setor, bem como a equalização dos juros, pois "linhas de crédito com taxas em dois dígitos pesam para o produtor".
Na última edição da Fenasucro & Agrocana, o volume de negócios movimentados foi de cerca de R$ 8,3 bilhões, demonstrando a pujança do segmento. Com melhores taxas, nossa expectativa é que o volume de negócios na feira deste ano, que completa 30 anos em agosto, seja ainda maior.
Almir Torcato, gestor corporativo da Canaoeste
Fundo de Catástrofe. Em relação ao Rio Grande do Sul, o Oliveira diz que a tragédia evidenciou a necessidade de regulamentar a Lei Complementar 137/2020, que cria o Fundo de Catástrofe, para que os recursos sejam disponibilizados com maior brevidade, minimizando grandes prejuízos e permitindo a retomada da produção. "Além disso, os recursos devem ser aplicados em novas tecnologias e práticas de manejo. Este tipo de demanda é crucial para aumentar a resiliência do setor agro frente às mudanças climáticas e garantir a continuidade da produção em situações adversas", reforça.
Retomada em 2024
Crise no setor. Sobre o quadro atual de crise do setor, o economista Felipe Borba, assessor de investimentos da RP Capital, explica que vários setores da cadeia, principalmente os de insumos e implementos, tiveram aumento significativo de estoques com custos maiores em relação ao preço praticado no mercado. "O que torna inviável manter as margens e sustentar as operações", afirma Borba.
Impacto das chuvas. A queda significativa na cotação dos grãos sem que o custo de produção tenha caído na mesma proporção somaram-se, então, ao cenário das condições climáticas desfavoráveis, como atraso das chuvas nas principais regiões produtoras, levando a um plantio tardio e até ao replantio.
Concessão de crédito. Já os períodos de chuva fora de época também prejudicaram a colheita e pioraram "a qualidade do produto", causando descontos nos preços de venda e menor retorno. Para Borba, provavelmente, o governo precisará utilizar recursos de bancos públicos, do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), e também incentivar bancos privados a oferecerem melhores condições para concessão de crédito.
O que o setor espera para 2024 é uma recuperação nos preços das commodities e um comportamento mais previsível do clima. É necessário que o governo forneça um amparo maior na oferta de crédito [nesse momento], principalmente em relação aos produtores, para garantir que consigam continuar a expandir áreas de plantio e manter suas operações.
Felipe Borba, assessor de investimentos da RP Capital