BC corta Selic a 3,75% por coronavírus e indica manutenção da taxa
Por Marcela Ayres
BRASÍLIA (Reuters) - O Banco Central cortou nesta quarta-feira a Selic em 0,5 ponto, à nova mínima histórica de 3,75%, aumentando o ritmo de afrouxamento monetário em resposta aos impactos econômicos com o coronavírus, mas indicando que este deve ser o novo nível dos juros básicos daqui para frente.
No comunicado sobre a decisão, o Comitê de Política Monetária (Copom) ponderou, no entanto, que a leitura sobre suas próximas decisões pode mudar em meio ao novo quadro que se descortina com a disseminação do Covid-19.
"O Copom entende que a atual conjuntura prescreve cautela na condução da política monetária, e neste momento vê como adequada a manutenção da taxa Selic em seu novo patamar. No entanto, o Comitê reconhece que se elevou a variância do seu balanço de riscos e novas informações sobre a conjuntura econômica serão essenciais para definir seus próximos passos", disse.
"O Banco Central do Brasil ressalta que continuará fazendo uso de todo o seu arsenal de medidas de políticas monetária, cambial e de estabilidade financeira no enfrentamento da crise atual", completou.
A próxima reunião do Copom acontece em 5 e 6 de maio.
Após o ímpeto reformista do governo ficar em segundo plano com o mundo sendo engolfado pelo coronavírus, o BC voltou a reforçar a importância das reformas na economia seguirem adiante, frisando que questionamentos sobre sua continuidade e mudanças de caráter permanente no processo de ajuste nas contas públicas têm o potencial de elevar a taxa de juros estrutural da economia.
"Nessa situação, relaxamentos monetários adicionais podem tornar-se contraproducentes se resultarem em aperto nas condições financeiras", afirmou o BC.
Para o economista sênior do Banco MUFG Brasil, Carlos Pedroso, o BC indicou estar olhando para a inclinação da curva de juros, que aumentou recentemente.
"Parece que depois desse comunicado o BC cortou 0,50 ponto e vai parar", avaliou.
O sócio da Portofino Investimentos Adriano Cantreva, por outro lado, considerou que porta para novas reduções não está fechada.
"Se necessário eles (BC) vão fazer algo mais forte. Porém, caso o pacote de ajuda econômica nos Estados Unidos seja fechado, pode ser que o mercado acalme nas próximas semanas e o BC não seja forçado a reduzir mais a Selic", disse.
A autoridade monetária afirmou que o ambiente para as economias emergentes tornou-se desafiador com a pandemia causada pelo coronavírus, que provocou desaceleração significativa do crescimento global, queda no preço das commodities e elevação da volatilidade nos mercados.
O coronavírus, inclusive, passou a figurar no balanço de riscos do BC, ao lado da ociosidade da economia, como um fator baixista para a inflação caso o surto da doença se agrave e "provoque aumento da incerteza e redução da demanda com maior magnitude ou duração do que o estimado".
Por outro lado, o aumento da potência da política monetária, a deterioração do cenário externo ou frustrações em relação à continuidade das reformas são apontados como riscos para gerar uma trajetória da inflação acima do projetado para 2020 e 2021.
CHOQUE RECESSIVO
Em pesquisa Reuters feita na semana passada, antes de nova rodada de intensa volatilidade disparada pela disseminação do Covid-19 pelo mundo, 13 de 26 analistas consultados pela Reuters haviam previsto uma redução de 0,25 ponto na Selic.
Oito dos analistas que responderam a sondagem previram uma redução mais agressiva, de 50 pontos-base, para 3,75%, enquanto cinco disseram que não esperavam nenhuma mudança.
Desde a realização da pesquisa, contudo, a adoção de quarentenas por diversos países como tentativa de retardar a velocidade de infecção pelo vírus evidenciou o impacto do coronavírus nas cadeias globais de produção, na demanda pelo consumo e nas perspectivas para os investimentos.
O próprio governo reconheceu nesta quarta-feira que não há como evitar o choque recessivo no curto prazo, que deve afetar a maioria dos países do mundo, inclusive o Brasil.
A mensagem veio em pedido enviado ao Congresso para adoção de estado de calamidade pública no país, condição que liberará o governo de cumprir a meta fiscal deste ano, pavimentando o caminho para um aumento nos gastos públicos.
O quadro com a perspectiva de isolamento dos cidadãos é de atividade econômica em ritmo ainda mais débil no Brasil, caminhando para o terreno negativo, o que diminui pressões inflacionárias.
Se, de um lado, o dólar segue batendo em sucessivas máximas nominais em meio à turbulência no mercado, de outro, importantes commodities para a economia brasileira, como o petróleo, têm registrado quedas expressivas, contrabalançando um eventual repasse da moeda norte-americana mais alta aos preços.
Nesta quarta-feira, o dólar fechou na inédita marca de 5,25 reais e o petróleo Brent, em 24,88 dólares o barril. No primeiro dia útil do ano, esses valores eram de 4,0258 reais e 66,25 dólares, respectivamente.
Pelas contas do BC divulgadas nesta quarta-feira, a inflação deve fechar 2020 com alta de 3,0% pelo cenário híbrido, que considera a trajetória dos juros da pesquisa Focus e a taxa de câmbio constante em 4,75 reais. Para 2021, a perspectiva é de alta de 3,6%.
Nos dois casos, as estimativas ficaram abaixo das projetadas na última reunião do Copom, no início de fevereiro, quando a autoridade monetária considerou um dólar constante mais baixo, em 4,25 reais, para os cálculos. À época, a perspectiva era de que o IPCA fechasse este ano em 3,5% e o próximo, em 3,7%.
A meta de inflação este ano é de 4,0% e para 2021, de 3,75%, sempre com margem de tolerância de 1,5 ponto para mais ou para menos.
(Com reportagem adicional de José de Castro)
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