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Incerteza sobre Belo Monte após decisão do Ibama reduz liquidez no mercado de energia

29/01/2021 17h24

Por Luciano Costa

SÃO PAULO (Reuters) - Incertezas sobre o nível de produção da hidrelétrica de Belo Monte nos próximos meses depois de uma recente decisão do Ibama sobre a vazão no rio Xingu têm afetado as transações no mercado livre de eletricidade, que sofreram redução na liquidez, disseram representantes do setor à Reuters.

Operadores do mercado livre elétrico, onde grandes empresas negociam contratos de suprimento diretamente com geradores ou comercializadoras, estão preocupados com a possibilidade de que o órgão ambiental determine uma redução na produção da usina por questões ambientais.

O Ibama já exigiu que a Norte Energia, responsável por Belo Monte, aumentasse a água liberada para o Xingu em janeiro, e avalia agora se a decisão valerá para fevereiro e o restante do ano, algo que impactaria os preços no mercado de energia.

"O que vejo é que os negócios estão um pouco parados, todo mundo esperando para ver o que acontece", disse Vitor Kodka, conselheiro do BBCE, plataforma eletrônica de negociação de contratos de energia.

"Deu uma diminuída na liquidez... diria que caiu em torno de 20%, 25% no máximo", acrescentou ele, em conversa por telefone.

Ele acrescentou que o mercado não chegou a "travar", mas comercializadoras e outros agentes do mercado têm evitado fechar operações com grandes volumes ou prazos longos.

O Ibama definiu que Belo Monte precisaria operar em janeiro liberando uma vazão de 3.100 metros cúbicos por segundo para a chamada Volta Grande do Xingu, o triplo da atual, o que segundo o órgão ambiental mitigaria efeitos negativos do empreendimento sobre o meio ambiente local e comunidades ribeirinhas.

Se o órgão ambiental seguir demandando mudanças na vazão em fevereiro, o impacto já seria bem maior, uma vez que o chamado "hidrograma" proposto pelos técnicos do Ibama exigiria liberação de 10,9 mil m³/s, contra 1,6 mil m³/s na configuração atual.

Uma mudança tão brusca reduziria fortemente a geração da hidrelétrica e poderia impactar a oferta de energia não somente no curto prazo, mas mesmo no próximo ano, ao prejudicar o ritmo de recuperação dos reservatórios no país em geral, disse à Reuters o sócio da comercializadora Tempo Energia, Henrique Nagayoshi.

"Em março, a faixa de preços (no mercado de energia) ficaria em 180 reais por megawatt-hora com o hidrograma atual de Belo Monte. Com o hidrograma do Ibama, aumentaria para 290 reais. Mas se o preço ficar mais alto por um cenário mais baixo de chuva, iria de 230 reais para 430 reais...tem potencial de explodir", estimou ele.

"O mercado está apreensivo devido a essas incertezas regulatórias", acrescentou. "Enquanto não definirem o hidrograma para o ano e até para os próximos anos fica essa indecisão".

A usina no rio Xingu costuma contribuir significativamente com a geração de energia neste período, ao ajudar hidrelétricas do Sudeste a recuperarem reservatórios, o que não ocorreria se a usina precisar aumentar a vazão, explicou Nagayoshi.

O presidente da comercializadora de energia Bolt, Gustavo Ayala, disse que as tradigs de energia costumam gostar de volatilidade nos preços, que abrem oportunidades de ganhos, mas ao mesmo tempo se assustam quando esses movimentos estão atrelados a decisões de órgãos de governo, por exemplo.

"Esse tipo de volatilidade ninguém gosta, o mercado não gosta. É uma volatilidade regulatória. Ninguém gosta de ficar operando no mercado, comercializando, apostando se vai ou não ser considerada uma restrição hídrica...então as tradings tendem a diminuir a liquidez", afirmou.

"Não é uma questão de oferta e demanda...é uma decisão puramente dos órgãos reguladores".

Questionado, o Ibama não respondeu de imediato se a determinação para que Belo Monte aumente a vazão no Xingu será mantida.

Uma eventual redução na produção da usina neste momento exigiria ainda o acionamento de mais termelétricas para atendimento à demanda, o que geraria custo adicional de cerca de 1,3 bilhão para os consumidores de energia somente nos dois primeiros meses do ano, disse a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) na quarta-feira.

O Ibama, por outro lado, disse que verificou "aumento na intensidade de alguns impactos ambientais já previstos" no projeto de Belo Monte, incluindo "alteração nas populações de peixes, navegação, dentre outros", o que poderia justificar as mudanças na operação da usina.

A hidrelétrica de Belo Monte recebeu investimentos de mais de 30 bilhões de reais. A Norte Energia, responsável pelo empreendimento, tem como principais sócios empresas da estatal Eletrobras e elétricas como Neoenergia, Cemig e Light, além da Vale e de fundos de pensão.

(Por Luciano Costa; edição de Nayara Figueiredo)