UOL - O brasileiro é caloteiro?
José Luiz Rossi - Não acho. O nosso perfil é muito semelhante ao de outros países, como, por exemplo, os Estados Unidos. O mais curioso é que não só não acho que ele é caloteiro, como também não é "privilégio" de um extrato social. O percentual da população que é inadimplente é igual nas classes A, B, C, D e E.
A diferença é que na classe E é uma inadimplência de alguém que comprou um tênis e não conseguiu pagar. Na classe A, o produto é um carro, que ele não conseguiu pagar. Mas os percentuais são iguais. Está mais ligado a um descontrole de gestão financeira do que efetivamente com o poder aquisitivo.
Por que as pessoas acabam entrando em grandes dívidas?
É preciso ter disciplina financeira. O conhecimento hoje é difundido, todo mundo sabe que, se não pagar uma conta, terá juros. A atitude também é conhecida. Se gastar mais do que ganha é uma má atitude. Você tem o conhecimento, mas a atitude e o comportamento são inadequados. Esse perfil independe de classe social.
Por que existe esse comportamento inadequado?
Por várias razões. Primeiro, uma parte da inadimplência é estrutural, com o desemprego, mesmo com o comportamento adequado. Sem reservas e sem emprego, a pessoa fica incapaz de cumprir com seus compromissos.
Mas há aqueles que têm o comportamento inadequado. É uma questão, talvez, de educação financeira. Nunca foi um valor ensinado em casa. O descontrole financeiro era uma coisa normal na família, e a pessoa nunca deu valor a isso.
Para resolver esse problema, seria muito importante que educação financeira fosse algo ensinado nas escolas, para que as pessoas soubessem como gerenciar um orçamento. Aprender que, se você não se planejar, não fizer uma reserva para eventos fortuitos, se você não se preparar para isso, vai chegar à vida adulta e não vai ter condições de ter disciplina financeira. Se a gente quiser resolver isso no longo prazo, é preciso incutir nas crianças essa ideia do raciocínio financeiro.
Como diminuir a inadimplência com mais de 13 milhões de desempregados?
Esse é um problema sério. Temos 62 milhões de pessoas no cadastro negativo da Serasa. Com o cadastro positivo, vamos receber dados de 137 milhões de pessoas, então cerca de 45%, que são economicamente ativas estão no cadastro negativo. Uma das principais razões para estar inadimplente é o desemprego.
Com mais 13 milhões de desempregados, reduzir esse número de inadimplentes é um desafio. Mas se a economia melhorar, se as pessoas voltarem a ter emprego formal ou informal, naturalmente isso vai diminuir. Essa situação de fragilidade econômica gera outros tipos de problema, como estresse social, baixa autoestima. É um desafio.
Se a economia melhorar, em quanto tempo a inadimplência deve diminuir?
Nesse conjunto de pessoas, há um grupo que está lá por alguma situação fortuita, mudou de apartamento e não recebeu a última conta de gás e acabou não pagando. Não é um devedor contumaz, mas está devendo, representando um percentual da população. Mas, se a economia começar a melhorar e houver uma redução do número de desemprego, podemos voltar ao patamar de 50 milhões ou 45 milhões de pessoas com dívidas.
Sempre haverá um volume de pessoas inadimplentes. Isso não é um "privilégio" do brasileiro, acontece em todas as sociedades que têm um mercado de créditos desenvolvido.
O brasileiro poupa pouco?
Essa percepção é correta. No Brasil, realmente há um nível de poupança menor do que o desejado. Em alguns casos, isso acontece porque a renda é muito baixa, e a capacidade de poupança é tão pequena que não faz diferença, e a pessoa prefere não poupar. Esse é um problema.
Eu diria que, mesmo tendo uma capacidade muito baixa, alguma reserva é importante ter. O fato é que o Brasil está entre os países que poupa menos, diferente de alguns países da Ásia onde o nível de poupança é muito maior. Se você olhar o Japão, o problema lá é que os japoneses poupam muito e têm pouco consumo.
Há outros fatores que fazem com que o brasileiro poupe menos?
Acho que o principal é a renda muito baixa. O custo para manter uma família, para viver e ter uma vida digna praticamente bate na sua renda, sobra muito pouco. E poupar R$ 10 ao mês não faz diferença. A pessoa corre o risco de não ter reserva.
Esses 62 milhões de inadimplentes mostram que muitos brasileiros não têm reservas, e é porque não poupam, e não poupam porque a renda é baixa. Só aumentando a renda é que vamos ter também uma capacidade de poupança maior da sociedade.
Como se livrar do círculo vicioso?
Não existe nenhum distribuidor de renda melhor do que o crescimento econômico. Enquanto os países emergentes, nos últimos 15, 20 anos, cresceram mais de 100%, os Estados Unidos mais de 40%, o Brasil cresceu menos de 20%.
Infelizmente é um país pobre. Precisamos aumentar o crescimento econômico para que a população tenha uma renda maior. Não dá para continuar em crescimento de 1%, 1,5%. Temos que passar ao patamar de 3%, 4%. Se não mudarmos isso, não vejo como vamos conseguir aumentar a renda da população de uma forma geral.