UOL - Quais as dificuldades que o varejo tem em relação à logística?
Luiza Helena Trajano - É um país muito grande e, por isso, é muito difícil. Ainda que tenhamos transportes como as rodovias, é apenas um sistema de transporte. Temos rodovias no interior do Norte e Nordeste que são muito difíceis. Há também os Correios, que para mim é o maior distribuir do Brasil, ainda precisando de muita coisa para dar certo. Os Correios vão a qualquer lugar deste Brasil, mas precisa ser um órgão que realmente funcione, digitalize, e compre avião [para distribuição].
É melhor manter os Correios com o setor público ou privatizar?
Acredito que a parte de transporte tem de privatizar. Poderia funcionar como o Banco do Brasil, que consegue prestar um serviço sendo um tanto do governo e um tanto de fora. Não defendo a privatização da área de correspondências, a parte popular, mas apenas a parte de logística. Sou totalmente a favor de criar o Correio Logística e privatizar.
Ele tem um valor de distribuição logística impressionante. Sou a favor de pegar o Correio na parte logística e profissionalizar e não vejo outra forma senão dividindo um pouco esse pacote.
Estamos vivendo um ano conturbado em relação à educação. O que a senhora acha que temos que fazer para melhorar a educação no país?
Os programas não são ruins, as pessoas que trabalham no MEC [Ministério da Educação] não são ruins, mas uma área não conversa com a outra e, a cada quatro anos, temos um ministro diferente. Nós não temos um plano a ser cumprido independentemente de quem está lá. Há muita gente boa, há muita reforma boa e muito professor maravilhoso.
Mas não existe uma meta do Brasil em dizer que queremos estar entre os dez melhores na educação em cinco anos, como há nas empresas. Não existe uma medição, não há um programa. Há muita gente boa, mas que não se conversa.
Aí a cada quatro anos entra um ministro, quando não é em menos tempo. Temos que ter um plano de educação, não apenas metodologia. O que precisa é, ao mesmo tempo, ter avaliação de professores. Aqui na empresa quem é melhor ganha mais, quem consegue mais resultado. Falta isso, faltam incentivo com medição e uma meta de onde queremos chegar.
É difícil administrar uma empresa familiar?
Sempre acreditei em empresa familiar. A empresa familiar tem de ser profissional. Nunca ninguém entrou aqui de cima para baixo. Somos poucos, venho de uma família pequena. Eu entrei de baixo, não entrei como a herdeira. Meu filho trabalhou oito anos fora. Quando ele entrou, teve que respeitar meus sobrinhos que estão aqui, que entraram de baixo, tinham horário.
Uma empresa familiar dura, e a Bolsa está vendo isso. Mas a empresa familiar não pode ser cabide de empregos de filhos de sócios. Ser dono é diferente de ser executivo.
É muito importante a empresa familiar, eu acredito muito nela, mas ela tem que ter coragem de tomar algumas medidas e, às vezes, o pai, para não prejudicar um, coloca os três filhos no mesmo nível sendo que um tem mais facilidade para ser gestor, os outros dois podem sem muito bons donos, mas eles talvez não sejam bons gestores.
É preferível ser bom dono, participar do conselho da família, do que ficar em gestão. Mas está provado no mundo inteiro que as empresas que estão durando mais são empresas de família, quem têm dono, mas com um nível profissional. É difícil porque no domingo você almoça com a família.
Qual o futuro do varejo quando falamos de tecnologia?
Queremos sair de uma empresa com pontos físicos e uma área digital (há seis anos trabalhamos nisso) para uma empresa digital com pontos físicos e calor humano. Acreditamos que ponto físico não vai morrer, ele vai se transformar em outras coisas. Ele é mais entretenimento, é acolhimento para o cliente que está precisando de alguma coisa ou que está tendo dúvidas e é também o lugar para você retirar o produto.
O ponto físico passa a ser um lugar onde a pessoa se sente bem, tem um café, um pão de queijo porque nós somos da região de Minas, tem entretenimento para as crianças. Acredito que ele vá mudando de figura, mas não acredito de jeito nenhum que o físico vai morrer.
O que agrada mais o consumidor?
Preço é uma coisa que o consumidor vê, mas eu nunca acreditei que o preço é que segura a venda. O que segura é atendimento, é ser tratado como único. Ele realmente quer ser atendido na hora que precisa reclamar, isso dá fidelidade. Agora, o preço ainda é uma coisa importante, mas eu nunca acreditei que o preço sozinho mantivesse um carisma, uma marca. Tanto é importante que durante muitos anos assumi o SAC [Serviço de Atendimento ao Consumidor] da empresa. Se você se dispõe a falar com o consumidor, ele te respeita muito.
E o que desagrada?
Hoje ele está se sentido muito desagradado e se vê no direito de reclamar. O que mais desagrada é quando ele é discriminado. E isso é muito sério, quando ele não é respeitado nas suas reivindicações, principalmente no varejo após a compra.
Qual é a fórmula para transformar uma rede de lojas em Franca em uma das maiores redes de varejo do país?
Não existe fórmula nenhuma. O que posso dizer quando as pessoas perguntam "onde você errou?", eu falo "onde eu acertei". Porque onde eu errei para mim é um exercício diário: aceitar e direcionar os erros, mas continuo errando muito. Primeiro, venho de uma família para a qual o trabalho é sagrado. Há um respeito total à instituição.
Nunca misturamos o nosso dinheiro com o dinheiro da empresa. Nunca compramos nada esperando o Magazine. Segundo, acho que como gostamos muito da instituição, nunca pensamos a curto prazo. E uma coisa muito importante, que parece retórica, é quando digo que o propósito da companhia sempre foi muito forte.
As pessoas estão em primeiro lugar dentro da empresa. Alguns falam que não vou dar conta, que cresceu muito. Primeiro, tínhamos 2.000 funcionários, chegamos a 10 mil e estamos agora com 30 mil.