Com porco gordo e nobre, empresa do interior de SP faz 'jamón' tipo serrano
Uma empresa dirigida por três mulheres da mesma família em Catanduva (385 km de São Paulo) é a única do Brasil na produção de jamón (pronuncia-se "ramon") do tipo serrano, um presunto de origem espanhola, feito de forma artesanal, cujo tempo de preparo pode ultrapassar 12 meses. A empresa foi fundada em 1967.
Os porcos utilizados na produção do jamón devem ser de raças nobres, como a pietran e a duroc, e alimentados com muita proteína para desenvolverem gordura.
“O porco precisa ter uma camada de gordura para dar um sabor adocicado ao presunto”, afirma Maria Tereza. Os animais são fornecidos pela unidade do Frigoestrela de Tupã (514 km de São Paulo), que adquire animais de criadores de São Paulo, Paraná, Santa Catarina, Rio Grande do Sul, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul.
A Jamones Salamanca atualmente vende cerca de 2.000 peças de presunto por mês. Em novembro e dezembro, as vendas sobem para 4.000 peças por mês, em razão das festas de final de ano.
Maioria da produção é para SP
Cerca de 60% da produção vai para o mercado da capital paulista e 35% para as demais regiões do país, afirma a gerente de produção, Maria Tereza Bernardo Chumah, 52. Ela é filha de um dos fundadores, o espanhol Silvestre Bernardo Castro, que chegou ao Brasil em 1957.
As vendas online respondem pelos outros 5% da produção.
O jamón é preparado com pernis (as pernas traseiras) do porco, e comercializado de três maneiras: com osso, sem osso ou fatiado em porções que variam de cem a 500 gramas.
O preço da peça de 6 quilos com osso é de R$ 300.
O produto de Catanduva, de acordo com Maria Tereza, pode ser encontrado em algumas redes de supermercados, churrascarias, bufês e empórios.
Produto fica uma semana sob sal
A produção do jamón é dividida em várias etapas. A primeira começa quando as partes traseiras dos porcos, pesando de 10 a 13 quilos, são cobertas com sal grosso. Passam cerca de uma semana assim.
Depois, são lavadas para retirada do excesso de sal e estocadas em câmaras frias e escuras por até quatro meses.
Na próxima etapa, as peças passam por uma cura num local chamada secadeiro, onde ficam em temperatura ambiente e se desidratam, reduzindo o peso inicial a seis quilos. De acordo com Maria Tereza, esse processo leva de oito a doze meses, dependendo do tamanho e da quantidade de gordura do jamón a ser produzido.
Empresa fatura R$ 250 mil por mês
A empresa fatura R$ 250 mil mensais na comercialização de seus produtos, segundo a gerente da Salamanca. Os concorrentes são os presuntos importados.
O jamón é o carro-chefe e responde por 75% da produção. A empresa também produz linguiças, salames, copa e lombos curados.
A empresa possui uma loja de fábrica às margens da rodovia Washington Luís, sob a gerência de Flávia Ribeiro Bernardo, prima de Maria Tereza.
O setor financeiro do frigorífico está sob os cuidados de outra prima, Sandra Dias Bernardo. As duas são filhas dos outros dois fundadores do negócio: Gregório e Apolinar Castro.
A Jamones Salamanca possui 15 funcionários, e toda a produção é fiscalizada pelo SIF (Serviço de Inspeção Federal).
A Salamanca investiu recentemente R$ 500 mil em um fatiador automático com balança para dar agilidade nas vendas do jamón em porções menores. Também oferece kits do pernil acompanhados com faca, madeira ou mármore. O de um quilo, chamado minikit, custa R$ 126. Pela peça maior, com osso, com faca e suporte de madeira, o comprador paga R$ 383.
Presunto serrano é comida típica espanhola
De acordo com Michele Novembre, coordenadora de gastronomia do Centro Universitário Senac de Águas de São Pedro (184 km de São Paulo), o jamón serrano é uma comida espanhola típica. “A carne de porco em geral e o jamón em particular são muito consumidos na Espanha”, afirma.
De acordo com ela, o alimento pode ser descrito como “o pernil do porco que foi curado com aplicação do sal marinho e permanece por meses em condições de temperatura e umidade controladas, para que o sabor, aroma e a textura fiquem apurados”.
Ainda segundo a professora de gastronomia, o jamón não é rico em calorias e pode ser consumido com vinho e cerveja. Para ela, o “segredo” na produção do jamón está na raça do animal, sua alimentação ao longo da vida e as condições de clima e temperatura em que foi criado e, também, como ele é abatido.
“Isso é fundamental para que se tenha um resultado positivo no produto final, gerando um presunto cru de qualidade", afirma.
A região de Salamanca, que dá nome ao frigorífico de Catanduva e é o local de origem dos fundadores, é uma referência na Espanha na produção de jamón. “Mas tem outras regiões que também o produzem.”
A diferença entre o presunto do tipo serrano e o que é comumente encontrado em supermercados e padarias está no processo de produção, diz Michele. Enquanto o primeiro é feito com a peça inteira, recebe sal e fica em local com umidade e temperatura controladas, o segundo é feito de várias partes do porco e cozido em uma forma.
Porcos que fornecem o pernil devem ser os mais pesados
Os porcos dos quais se extrai o pernil para a produção do presunto cru são normalmente os mais pesados e, por essa razão, os menos aceitos pelo mercado, afirma Eduardo da Costa Galego, 40, zootecnista e gerente de compras da unidade do Frigoestrela de Tupã, fornecedor da Salamanca.
Segundo ele, a preferência da maioria dos clientes, entre eles a rede de supermercados Pão de Açúcar, é pelos animais com menos gordura, que pesam entre 85 e cem quilos e são adquiridos sob a forma de carcaças (com osso).
Já os suínos destinados ao preparo do jamón pesam normalmente entre 105 e 110 quilos e contêm mais gordura. Eles fornecem pernis com peso entre dez e 11 quilos e são vendidos desossados.
Segundo o zootecnista, são abatidos entre 1.200 e 1.500 porcos por dia na unidade de Tupã. Donos de granja gaúchos chegam a enfrentar 18 horas de viagem para levar a carga ao abate. Na viagem, os suínos perdem normalmente até 5% do peso.
Os porcos utilizados na produção do presunto cru são das raças duroc, pietrain e landrace. Os animais recebem alimentação à base de milho, farelo de soja e nutrientes minerais. Em 120 dias os bichos ficam prontos para o abate.
Entre os fornecedores do Frigoestrela está a Agrícola Farinella, de Porto União (SC). A empresa cria e comercializa 264 mil porcos por ano, segundo Odanir Angelo Farinella, sócio gerente. Os animais são transportados em lotes de 120 ou 300 exemplares, dependendo do veículo. As viagens são feitas à noite devido às temperaturas mais amenas. A distância entre Porto União e Tupã é de 654 quilômetros.
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