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Aposta secreta de Putin com reservas fracassa e gera crise cambial

Evgenia Pismennaya, Ilya Arkhipov e Brad Cook

18/12/2014 12h14

18 de dezembro (Bloomberg) - Membros do Kremlin se reuniram em segredo em fevereiro para responder a uma pergunta crucial de Vladimir Putin: a Rússia poderia aguentar o golpe econômico por assumir o controle da Crimeia?

Moscou disse que sim. Os mercados não têm tanta certeza.

Enquanto Putin exultava nos Jogos Olímpicos de Inverno em Sochi há dez meses, seus assistentes lhe garantiram que a Rússia era rica o suficiente para aguentar as repercussões financeiras de uma possível incursão à Ucrânia, segundo duas fontes do setor. Essa conclusão agora parece ter sido um sério erro de cálculo.

A Rússia aumentou as taxas de juros para níveis punitivos e gastou pelo menos US$ 87 bilhões, ou 17 por cento, das suas reservas de moeda estrangeira para tentar evitar que o desmoronamento do rublo gere uma espiral de pânico. Até agora, nada funcionou.

Apesar do que lhe foi assegurado em Sochi, agora Putin enfrenta a crise econômica mais severa do país desde 1998, quando a desvalorização e o calote da Rússia reverberaram no mundo inteiro. As sanções impostas pelos EUA e pela União Europeia e, mais significativamente, o desmoronamento dos preços do petróleo estão corroendo as reservas que incentivaram Putin a anexar a Crimeia apesar da indignação internacional.

A história das reservas em moeda estrangeira da Rússia segue, em números concretos, a história do poder de Putin, do colapso do final da década de 1990 à riqueza petroleira da década de 2000 e, agora, ao terror renovado que prevalece hoje.

Discussões fundamentais

Três funcionários do governo caracterizaram as discussões de fevereiro como fundamentais para o pensamento de Putin sobre a Ucrânia. A série de discussões se deu antes que a Rússia ajudasse Viktor Yanukovych, então presidente da Ucrânia e aliado de Putin, a fugir de protestos violentos.

Disseram a Putin, 62, que a Rússia tinha reservas suficientes em moeda estrangeira para anexar a Crimeia e resistir a quaisquer possíveis sanções. O presidente talvez não tivesse agido se a Rússia não tivesse desenvolvido seu colchão financeiro nas boas épocas, disseram as três fontes, que solicitaram o anonimato devido à natureza delicada das discussões.

Em 5 de dezembro, o total de reservas da Rússia era de US$ 416 bilhões, incluindo um diferencial de cerca de US$ 169 bilhões entre dois fundos especializados. Mas, com o desmoronamento do rublo, esse tesouro está se esgotando mais rapidamente do que a maioria tinha previsto. O pânico começou a se instalar entre os russos comuns.

História das reservas

Quando Putin entrou no Kremlin, em 1999, a Rússia estava quase falida. Ele tinha menos de US$ 13 bilhões disponíveis e enfrentava uma dívida externa de US$ 133 bilhões, principalmente da era soviética.

Nos oito anos seguintes, o crescimento dos preços do petróleo bruto alimentou um crescimento médio anual de 7 por cento, encheu os cofres do Estado e levou as agências de risco a elevar suas avaliações.

Por sua vez, isso ajudou a encorajar Putin. Em 2007, quando as reservas ultrapassaram US$ 300 bilhões, o presidente criticou abertamente os EUA. Em 2008, quando o caixa quebrou um recorde com US$ 598 bilhões, a Rússia invadiu a Geórgia. As posses de moeda estrangeira afundaram para US$ 376 bilhões em 2009 durante a crise financeira mundial.

Cerca de 40 por cento das reservas da Rússia estão contidas em dois fundos de riqueza soberana controlados pelo Ministério das Finanças. O governo está buscando formas de usar esses fundos para ajudar empresas com dificuldades de caixa e manter a maior quantidade de moeda estrangeira possível. As empresas russas possuem cerca de US$ 50 bilhões em bonds e empréstimos em moeda estrangeira com vencimento até o fim de 2015, segundo dados compilados pela Bloomberg.

Funcionários reconheceram que utilizar as reservas poderia aumentar ainda mais os riscos para a posição do país com os investidores.

Mas poucos em Moscou esperam que Putin entre em pânico.

"Para Putin, só uma coisa importa: há dinheiro?" disse Sergei Aleksashenko, ex-vice-presidente do Banco Central. "Sim. Então adeus!".

Título em inglês: 'Putin's Secret Gamble on Reserves Backfires Into Currency Crisis'

Para entrar em contato com os repórteres: Evgenia Pismennaya, em Moscou, epismennaya@bloomberg.net; Ilya Arkhipov, em Moscou, iarkhipov@bloomberg.net; Brad Cook, em São Petersburgo, bcook7@bloomberg.net