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Até quem aposta em renda variável está fugindo de ação no Brasil

Francisco Marcelino e Paula Sambo

24/02/2015 12h47

(Bloomberg) -- Os investidores sabem que os negócios vão mal no mercado de ações brasileiro quando até quem está focado em renda variável deixa de querer ações.

Os gestores de ativos estão reduzindo a participação da renda variável nos seus portfólios e elevando os recursos em caixa ao máximo permitido por lei depois que o Ibovespa caiu 35 por cento em dólares desde o dia 1º de setembro. Este é o pior desempenho entre os principais índices acionários do mundo. O peso da renda variável no total dos ativos dos fundos de investimentos caiu de 14 por cento em dezembro de 2013 para 12 por cento no fim do ano passado, segundo dados da Anbima, a Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais. Já a participação das chamadas operações compromissadas, aplicações em que o emissor se compromete a recomprar o título, atingiu o maior patamar em pelo menos cinco anos.

As ações brasileiras têm passado por uma fase ruim: a Petrobras perdeu US$ 62 bilhões em valor de mercado desde setembro em meio às investigações da Operação Lava Jato. A queda nos preços das commodities tem afetado empresas como Vale SA e Biosev SA. A inflação em alta, a perspectivas de baixo crescimento e o risco de racionamento de energia são fatores que contribuíram para a fuga da renda variável, disse Jorge Simino, diretor de investimento da Fundação Cesp (Funcesp), quarto maior fundo de pensão do país, com cerca de R$ 23,5 bilhões (US$ 8,2 bilhões) em ativos.

"É difícil justificar a compra de ações", disse Bernardo Rodarte, que tem R$ 1 bilhão sob gestão na Sita Corretora, em Belo Horizonte. "Os gestores de renda variável estão vendendo ações e mantendo o dinheiro em caixa, o que faz sentido com a renda fixa dando um retorno de cerca de 1 por cento ao mês".

Estratégia de investimento

Os fundos de ações brasileiros que seguem o Ibovespa caíram 3 por cento em 2014, contra um ganho de 11 por cento dos fundos de curto prazo, segundo a Anbima. Levando isso em conta, a estratégia de investimento é uma escolha óbvia para os gestores de ativos, disse Simino.

"Temos 15 por cento do nosso portfólio em dinheiro, em compromissadas de um dia ligadas" à taxa básica de juros de 12,25 por cento, disse Simino em entrevista no escritório da Bloomberg, em São Paulo, acrescentando que a participação ideal seria de 20 por cento. Ele disse que as ações caíram para 15 por cento de seu portfólio após representarem cerca de 25 por cento em 2007. "Esse desalinhamento de várias variáveis simultâneas a gente está precificando desde meados de 2013. Por isso é que a gente está fazendo caixa".

Preferir caixa a ações é um "disparate técnico" para investidores de longo prazo, como os gestores de fundos de pensão, disse ele.

Banco Central

As compromissadas chegaram em dezembro a uma participação de 28 por cento do patrimônio total dos fundos brasileiros. Uma alta de 3,5 pontos porcentuais em um ano. Esses títulos de curto prazo podem durar apenas um dia e são garantidos por papéis do governo. As compromissadas ganharam popularidade no início dos anos 1990, quando a hiperinflação corroía o valor dos títulos de prazo mais longo.

O volume de compromissadas atingiu R$ 858,1 bilhões em dezembro, uma alta de 49 por cento no período de um ano, mostram dados do BC. Enquanto isso, a autoridade monetária elevou a Selic, que estava em 10,5 por cento em janeiro de 2014. Mesmo com a elevação dos juros, o IPCA subiu 7,14 por cento nos 12 meses até janeiro, o ritmo mais rápido em quase dois anos e meio.

"Essa migração das ações para a renda fixa reflete as incertezas econômicas", disse Paulo Vieira da Cunha, um ex-diretor do BC que agora é economista-chefe do fundo hedge Ice Canyon, por telefone, de Nova York. "Esse movimento de compra, especialmente na parte curta da curva, implica que os investidores não vão querer assumir o risco de duração".

Título em inglês: Even Stock Pickers Don't Want Stocks Anymore: Corporate Brazil

Para entrar em contato com os repórteres: Francisco Marcelino, em São Paulo, mdeoliveira@bloomberg.net; Paula Sambo, em São Paulo, psambo@bloomberg.net.