Ministro da Economia pode realmente acabar com os concursos públicos?
Em evento em comissão na Câmara dos Deputados, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que o governo não irá promover mais concursos públicos nos próximos anos. A medida foi tomada, segundo ele, porque "houve excesso de contratações" nas últimas gestões e há "servidores demais" no estado.
Em abril, em um seminário promovido pelos jornais "O Globo" e "Valor Econômico", Guedes falou sobre "travar" os certames. No mesmo mês, foi enviado ao Congresso Nacional o projeto da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2020, que não prevê mais concursos.
Mas será que o ministro pode realmente acabar com os concursos? Especialistas ouvidos pela reportagem do UOL dizem que "dificilmente". Mesmo que a medida seja colocada em prática, afirmaram, apenas o Executivo federal poderia ser afetado, visto que existe autonomia entre as unidades da federação (estados, DF e prefeituras) e os Poderes.
"No caso do Poder Executivo federal, pode ser que as vagas sejam reduzidas, sim, por causa do Orçamento, mas não extintas. Já o Legislativo, o Judiciário, os estados e os municípios têm orçamentos próprios para realizar novos concursos", disse Akihito Allan Hirata, professor de direito constitucional que dá aulas em cursinhos para concursos há cerca de 20 anos.
Em início de gestão, ameaça é comum, diz especialista
Hirata falou também que, normalmente em início de gestões, ministros e presidentes costumam declarar que vão "dar fim" nos concursos. "Isso não é coisa nova e já ocorreu em governos anteriores, como o de Fernando Henrique Cardoso e de Dilma Rousseff. Passado o discurso, há concursos. Só neste ano, por exemplo, já foram abertos mais de cem deles, e pedidos de novos certames foram feitos por órgãos e autarquias federais", afirmou.
Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Agência Nacional da Água (ANA), Polícia Rodoviária Federal (PRF), Departamento Penitenciário (Depen) e Controladoria Geral da União (CGU) são algumas das entidades que solicitaram concursos.
Atividades do governo precisam de concursados
A professora titular do curso de direito administrativo da PUC-PR, Vivian Cristina Lima Lopez Valle, também concorda que dificilmente os concursos seriam extintos, já que há autonomia entre os Poderes. Além disso, disse, as atividades da administração pública, conforme estabelece a Constituição, devem ser feitas por servidores concursados.
"Portanto, se realmente ocorrer a redução nos certames e no número de servidores do executivo federal, o governo precisa achar uma forma de dar conta das atividades que são exercidas por pessoas que estão prestes a se aposentar. Seria um problema transferir atividades-fim para terceirizados em vez de trabalhar com estrutura própria, o que poderia até fragilizar as atividades", disse.
Digitalização não substitui mão de obra, diz sindicato
O ministro Paulo Guedes mesmo afirmou, no mesmo momento em que anunciou a suspensão dos concursos, que nos próximos cinco anos 40% dos servidores vão se aposentar. Em vez de substituí-los, disse, a ideia é "digitalizar o serviço público".
A Confederação dos Trabalhadores do Serviço Público Federal (Condsef) divulgou em seu site que o ministro, ao falar sobre digitalização, "passa um atestado de desconhecimento do que significa o Estado e todo o setor público, bem como o que assegura a Constituição".
Segundo a entidade, "quando se fala em atendimento público não é possível imaginar um cenário sem servidores para executar serviços essenciais" e que são muitos os serviços que exigem "presença de trabalhadores, equipes bem estruturadas e pessoal qualificado."
Funcionário encostado tem de ser demitido, diz ex-BC
Para o economista Carlos Eduardo de Freitas, ex-diretor do Banco Central, existe muita desigualdade no serviço público federal, o que deixa alguns setores com déficit de profissionais e outros não.
"Acredito que a medida tomada pelo ministro visa, em um primeiro momento, justamente arrumar a casa para que, em seguida, novas providências possam ser tomadas no funcionalismo", disse.
Freitas falou que o serviço público precisa de algumas reformulações, principalmente na progressão da carreira e na estabilidade dos servidores. "Hoje em dia é difícil demitir um funcionário público que não dá resultado. A meu ver, seria interessante, por exemplo, um novo sistema de demissão, em que fosse possível mandar embora servidores que se acomodam", afirmou.
Para Pedro Salanek Filho, professor e consultor da área financeira e de sustentabilidade empresarial do Instituto Superior de Administração e Economia do Mercosul, da Fundação Getulio Vargas (Isae/FGV), o funcionalismo público deveria ser visto como a iniciativa privada. "Se eu tenho um funcionário com baixa produção e faturamento, preciso trocá-lo. Do ponto de vista social, isso é trágico, mas economicamente falando é necessário", declarou.
O número de servidores públicos ativos da União, estados e municípios aumentou mais de 60% nas últimas décadas, segundo o Atlas do Estado Brasileiro, divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) em dezembro do ano passado. O gasto anual chegou a R$ 725 bilhões em 2017, o que representa 10,5% do PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil.
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