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Ministro da Economia pode realmente acabar com os concursos públicos?

Lucas Gabriel Marins

Colaboração para o UOL, em Curitiba

18/06/2019 04h00

Em evento em comissão na Câmara dos Deputados, o ministro da Economia, Paulo Guedes, disse que o governo não irá promover mais concursos públicos nos próximos anos. A medida foi tomada, segundo ele, porque "houve excesso de contratações" nas últimas gestões e há "servidores demais" no estado.

Em abril, em um seminário promovido pelos jornais "O Globo" e "Valor Econômico", Guedes falou sobre "travar" os certames. No mesmo mês, foi enviado ao Congresso Nacional o projeto da LDO (Lei de Diretrizes Orçamentárias) de 2020, que não prevê mais concursos.

Mas será que o ministro pode realmente acabar com os concursos? Especialistas ouvidos pela reportagem do UOL dizem que "dificilmente". Mesmo que a medida seja colocada em prática, afirmaram, apenas o Executivo federal poderia ser afetado, visto que existe autonomia entre as unidades da federação (estados, DF e prefeituras) e os Poderes.

"No caso do Poder Executivo federal, pode ser que as vagas sejam reduzidas, sim, por causa do Orçamento, mas não extintas. Já o Legislativo, o Judiciário, os estados e os municípios têm orçamentos próprios para realizar novos concursos", disse Akihito Allan Hirata, professor de direito constitucional que dá aulas em cursinhos para concursos há cerca de 20 anos.

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Hirata falou também que, normalmente em início de gestões, ministros e presidentes costumam declarar que vão "dar fim" nos concursos. "Isso não é coisa nova e já ocorreu em governos anteriores, como o de Fernando Henrique Cardoso e de Dilma Rousseff. Passado o discurso, há concursos. Só neste ano, por exemplo, já foram abertos mais de cem deles, e pedidos de novos certames foram feitos por órgãos e autarquias federais", afirmou.

Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), Agência Nacional da Água (ANA), Polícia Rodoviária Federal (PRF), Departamento Penitenciário (Depen) e Controladoria Geral da União (CGU) são algumas das entidades que solicitaram concursos.

Atividades do governo precisam de concursados

A professora titular do curso de direito administrativo da PUC-PR, Vivian Cristina Lima Lopez Valle, também concorda que dificilmente os concursos seriam extintos, já que há autonomia entre os Poderes. Além disso, disse, as atividades da administração pública, conforme estabelece a Constituição, devem ser feitas por servidores concursados.

"Portanto, se realmente ocorrer a redução nos certames e no número de servidores do executivo federal, o governo precisa achar uma forma de dar conta das atividades que são exercidas por pessoas que estão prestes a se aposentar. Seria um problema transferir atividades-fim para terceirizados em vez de trabalhar com estrutura própria, o que poderia até fragilizar as atividades", disse.

Digitalização não substitui mão de obra, diz sindicato

O ministro Paulo Guedes mesmo afirmou, no mesmo momento em que anunciou a suspensão dos concursos, que nos próximos cinco anos 40% dos servidores vão se aposentar. Em vez de substituí-los, disse, a ideia é "digitalizar o serviço público".

A Confederação dos Trabalhadores do Serviço Público Federal (Condsef) divulgou em seu site que o ministro, ao falar sobre digitalização, "passa um atestado de desconhecimento do que significa o Estado e todo o setor público, bem como o que assegura a Constituição".

Segundo a entidade, "quando se fala em atendimento público não é possível imaginar um cenário sem servidores para executar serviços essenciais" e que são muitos os serviços que exigem "presença de trabalhadores, equipes bem estruturadas e pessoal qualificado."

Funcionário encostado tem de ser demitido, diz ex-BC

Para o economista Carlos Eduardo de Freitas, ex-diretor do Banco Central, existe muita desigualdade no serviço público federal, o que deixa alguns setores com déficit de profissionais e outros não.

"Acredito que a medida tomada pelo ministro visa, em um primeiro momento, justamente arrumar a casa para que, em seguida, novas providências possam ser tomadas no funcionalismo", disse.

Freitas falou que o serviço público precisa de algumas reformulações, principalmente na progressão da carreira e na estabilidade dos servidores. "Hoje em dia é difícil demitir um funcionário público que não dá resultado. A meu ver, seria interessante, por exemplo, um novo sistema de demissão, em que fosse possível mandar embora servidores que se acomodam", afirmou.

Para Pedro Salanek Filho, professor e consultor da área financeira e de sustentabilidade empresarial do Instituto Superior de Administração e Economia do Mercosul, da Fundação Getulio Vargas (Isae/FGV), o funcionalismo público deveria ser visto como a iniciativa privada. "Se eu tenho um funcionário com baixa produção e faturamento, preciso trocá-lo. Do ponto de vista social, isso é trágico, mas economicamente falando é necessário", declarou.

O número de servidores públicos ativos da União, estados e municípios aumentou mais de 60% nas últimas décadas, segundo o Atlas do Estado Brasileiro, divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) em dezembro do ano passado. O gasto anual chegou a R$ 725 bilhões em 2017, o que representa 10,5% do PIB (Produto Interno Bruto) do Brasil.

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