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Reforma tributária pode ameaçar pagamentos aos acionistas, como JCP?

Há muitas especulações em relação ao teor da segunda parte da reforma tributária, que o governo federal pretende encaminhar ao Congresso ainda no segundo semestre de 2023. Aprovada na Câmara dos Deputados em 7 de julho de 2023, a primeira parte da reforma concentrou-se na simplificação dos tributos, por meio da criação de um imposto sobre o valor agregado (IVA) dual, visando substituir o PIS, Cofins, IPI, ICMS e ISS.

Na segunda parte da reforma tributária, o governo direcionará seu foco para os impostos incidentes sobre a renda. Nesta nova empreitada governamental, a prioridade deverá ser a busca por novas fontes de arrecadação, visando a redução do déficit fiscal e o controle da dívida pública. Dentre as possíveis alterações que o texto poderá propor, inclui-se a tributação dos dividendos e a eliminação dos Juros sobre Capital Próprio (JCP).

Antes de discorrermos sobre os possíveis impactos de uma eventual eliminação do Juros sobre Capital Próprio (JCP), é imprescindível que compreendamos o seu conceito e como ele influencia os resultados das empresas. O JCP foi instituído em 1995, por meio da Lei n° 9.249, como um mecanismo de distribuição de lucros que empresas podem realizar aos seus acionistas.

O montante a ser pago como JCP é calculado ao multiplicar o patrimônio líquido do exercício, após a exclusão de determinados elementos, pela Taxa de Longo Prazo (TLP).

Diferentemente dos dividendos, que são isentos de Imposto de Renda, os JCP estão sujeitos a uma alíquota de 15%. Por serem considerados despesas fiscais, os JCP podem ser deduzidos do lucro tributável da empresa. Essa dedução, por sua vez, resulta na redução do montante de impostos a ser pago pela empresa, acarretando, assim, um aumento no lucro líquido da mesma.

Vale ressaltar que há limitações quanto ao uso deste mecanismo como estratégia de dedução fiscal. O valor máximo dedutível de juros sobre capital próprio não pode ultrapassar o maior entre os seguintes valores: (i) 50% do lucro líquido do exercício, antes da consideração dos JCP e após a dedução da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL); ou (ii) 50% da soma dos lucros acumulados e das reservas de lucros.

Após entendido o funcionamento do JCP, é possível concluir que o impacto de um possível fim desta forma de distribuição de lucros será o aumento da base de cálculo de incidência do imposto de renda, o que levará a um maior pagamento de imposto pelas empresas e, consequentemente, a uma redução de seus lucros. Esse fato reduzirá o fluxo de caixa gerado pelas companhias, o que acarretará uma redução também no valor de suas ações.

Veja abaixo a mediana paga em juros sobre capital próprio por cada setor econômico nos últimos três anos.

  • Tecnologia da informação 96%
  • Financeiro 93%
  • Consumo cíclico 67%
  • Comunicações 67%
  • Consumo não cíclico 61%
  • Saúde 52%
  • Bens industriais 49%
  • Utilidade pública 45%
  • Petróleo gás e biocomb. 21%
  • Materiais básicos 19%
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Fonte: Bloomberg / Elaboração: Research PagBank

No intuito de identificar as empresas que poderiam vir a ser mais impactadas em caso de extinção do Juros sobre Capital Próprio (JCP), empreendemos um estudo que examinou o percentual de proventos pagos via JCP nos últimos 3 anos pelas companhias. A base de dados do estudo considerou apenas empresas integrantes nos índices Ibovespa, Small Caps e que tenham pago JCP no último ano. Nosso foco concentrou-se em elencar aquelas empresas que mais frequentemente recorreram a esse mecanismo como estratégia de distribuição de lucros aos seus acionistas. A tabela apresentada acima ilustra os desfechos desse estudo segmentado por setor.

No setor de Tecnologia da Informação (TI), apesar de contar com apenas duas empresas, Sinqia e Totvs, ambas empregaram o Juros sobre Capital Próprio (JCP) de maneira relevante como método de distribuição de lucros em 100% e 91% das ocasiões, respectivamente. No entanto, em termos de representatividade, é o setor financeiro que se destaca. As instituições bancárias, de maneira geral, demonstraram preferência pelo uso desse dispositivo como forma de remunerar seus acionistas.

Dentre os quatro maiores bancos, os índices de utilização do JCP variaram entre 86% e 93%. Entre todos os bancos, o BTG Pactual (BPAC11) e o Banco ABC (ABCB4) se destacam, tendo adotado o JCP em 100% das distribuições de lucros aos seus acionistas nos últimos três anos. Além disso, empresas como Hypera, MDias Branco, Multiplan e Sabesp também distribuíram 100% de seus lucros por meio do JCP. Outros nomes relevantes que recorreram ao JCP incluem a Cielo (99%), Sanepar (99%), Lojas Renner (98%), Localiza (89%), Ambev (89%) e Tim (87%). Levando em consideração a preferência dessas empresas em distribuir JCP, as mesmas tendem a ter seus resultados afetados com a extinção do mesmo.

No entanto, ainda é muito prematuro para avaliar o real impacto sobre o resultado das companhias e nos preços projetados de suas ações.

Vale destacar que, mesmo com uma alteração sobre os proventos distribuídos, ainda acreditamos que algumas companhias continuarão sendo boas distribuidoras de proventos, dado sua estrutura que não necessita de fortes investimentos para manter sua operação, além de algumas companhias serem grandes geradoras de caixa. Destacamos que temos uma carteira sugerida voltada para boas pagadoras de proventos.

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Na Carteira Rendeira do PagBank do mês de agosto, os ativos tiveram o JCP representando nos últimos três anos entre 0% e 86% dos proventos pagos aos seus acionistas. É importante ressaltar, no entanto, que o enfoque da carteira reside na busca por empresas que apresentem um dividend yield significativo.

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