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Comunidades amazônicas fazem aliança para resistir a projetos de Bolsonaro

16/01/2020 11h56

Aldea Piaraçu, Brasil, 16 Jan 2020 (AFP) - Dezenas de líderes indígenas brasileiros e representantes de outras comunidades da floresta reunidos em uma aldeia amazônica acertaram formar uma aliança para resistir aos projetos do presidente Jair Bolsonaro de abrir essas regiões à mineração e exploração agrícola.

"Eu não quero que ninguém morra na minha frente, eu não quero que seja a matança de todo mundo, de branco contra índio", declarou o chefe Raoni na quarta-feira, falando à membros da imprensa, entre eles uma equipe da AFP.

Para a reunião de líderes indígenas foram convidados outros grupos de habitantes da aldeia do Piaraçu, localizada às margens do rio Xingu, em Mato Grosso.

"Bolsonaro está falando muito mal da gente (...) Não está atacando só índio, mas está atacando índio mais forte ainda [que outra pessoa]", acrescentou Raoni, com o corpo pintado de preto, o enorme disco no lábio inferior e o tradicional cocar de penas amarelas.

O chefe Kayapó, com idade estimada em 89 anos, espera levar ao Congresso em Brasília o documento resultante dessa reunião, que durará até sexta-feira.

"Eu vou levar o documento, aí vou perguntar para ele [Bolsonaro] porque está falando mal dos índios", disse ainda.

O líder indígena também enfatizou a importância de buscar apoio político na Europa.

O encontro envolve representantes de comunidades tradicionais dedicadas a atividades sustentáveis, incluindo extração, em consonância com a Aliança dos Povos da Floresta, formada pelo líder ambiental Chico Mendes, seringueiro, morto em 1988.

"Há mais de 30 anos, num cenário muito parecido a este, foi pensada uma grande aliança dos povos da floresta, e o cenário político era tão preocupante como o de hoje", afirma Angela Mendes, filha do falecido dirigente.

Sob um sol escaldante desde a primeira hora da manhã, os participantes do encontro convocado por Raoni se reuniram na maloca central da aldeia.

Alguns apresentaram danças tradicionais e cantaram canções de guerra, enquanto um coro de mulheres com vestidos coloridos e pinturas corporais em preto e vermelho se encontravam ao lado dos porta-vozes da nova aliança.

- "Quase cenário de guerra" -Sonia Guajajara, coordenadora executiva da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), alertou que o contexto atual representa "um momento dramático, quase um cenário de guerra" e que os projetos de Bolsonaro prenunciam "uma tragédia para os povos povos indígenas tradicionais e comunidades extrativistas".

"Não vamos a aceitar negociar os nossos territórios e as nossas vidas para resolver problemas da crise econômica que não foi causada por nós", acrescentou Guajajara, que foi candidata a vice-presidente nas eleições de 2018 pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL).

Os líderes listaram o que consideram as principais ameaças: mineração, exploração madeireira, invasão de terras, contratempos no sistema de saúde indígena e assassinatos de líderes.

Bolsonaro, que atribui a pregação ambiental a interesses estrangeiros para explorar os recursos da Amazônia, prometeu em dezembro entregar ao Congresso um projeto de lei que abrirá a floresta à mineração.

Um rascunho do texto publicado pelo jornal O Globo afirma que o projeto também propõe legalizar as atividades de petróleo e energia.

Em várias ocasiões, o presidente disse que as reservas indígenas condenam as populações locais ao atraso e as comparou com "zoológicos".

Dados oficiais preliminares mostram que a partir de janeiro de 2019, quando Bolsonaro assumiu o poder, até dezembro, o desmatamento da Amazônia brasileira aumentou 85% em relação a 2018, atingindo 9.166 km2.

"Bolsonaro, por que você não nos respeita? Por que quer acabar com os índios?", questionou a líder kayapó Tuíra, após entoar um canto em sua língua natal.

A seu redor, a terra, de um vermelho intenso, contrasta com o azul do céu e o verde da floresta densa que cerca aldeia, próxima ao Parque Nacional do Xingu.

Raoni sabe que sua luta começou muito antes de ele nascer e insiste na necessidade de novas gerações assumirem "a proteção dos povos indígenas".

"Estou velho, cansado", desabafa, depois de fazer uma breve dança tradicional na maloca central.

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