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O 'fardo' do crescimento econômico sobre as trabalhadoras chinesas

25/04/2018 17h17

Nas últimas duas décadas, o governo chinês impôs uma série de reformas com o objetivo de estimular a economia. Mas os resultados não foram necessariamente positivos para as mulheres.

No país mais populoso do mundo, onde há mais homens que mulheres, é interessante ver que há menos mulheres entrando, ou permanecendo, no mercado de trabalho do que em décadas anteriores.

Mao Zedong, ex-líder do Partido Comunista da China, criou um slogan que se tornou famoso: "as mulheres seguram metade do céu". Parecia ser esse o caso quando 90% das mulheres com idade para trabalhar estavam empregadas nas cidades chinesas na década de 1970.

No entanto, se as reformas de mercado deslancharam, levando mais empresas privadas a contratar mais, as taxas de participação das mulheres no mercado de trabalho caíram consistentemente - em 2010, o censo indicou que apenas 44,7% das mulheres estavam empregadas. É uma proporção muito maior do que em alguns países desenvolvidos, mas, ainda assim, uma grande queda.

Crítica em relação às reformas, a escritora e jornalista Lijia Zhang diz que a China mudou de uma economia planificada para um modelo de economia de mercado que trouxe mudanças e oportunidades para homens e mulheres - especialmente as moradoras das cidades com maior qualificação. Mas também trouxe reveses, incluindo perda de empregos.

"Eu acho que as mulheres carregaram a maior parte do fardo durante a transição de uma economia planificada para a economia de mercado", diz ela. "Por exemplo, quando as empresas estatais se viam em dificuldade, as mulheres eram sempre as primeiras a serem demitidas".

Zhang viveu na pele as mudanças sobre as quais escreve em seu livro, Socialism is Great ("O Socialismo é Ótimo", em tradução literal). Tendo crescido em Nanquim, a capital da província oriental de Jiangsu, ela começou a trabalhar em uma fábrica de mísseis aos 16 anos de idade.

A cidade onde ela morava servia como área residencial para funcionários de uma fábrica local de maquinário que era administrada pelo Ministério da Indústria Aeroespacial.

"Eles tinham uma regra de que as mulheres com 45 anos fossem dispensadas da minha unidade de trabalho", diz ela, sugerindo que esta era uma regra tácita na fábrica.

Ela acredita que a transição para a economia de mercado deu espaço para que mais empresas estabelecessem práticas discriminatórias contra mulheres sem que fossem penalizadas. "Antes, havia essa igualdade de gênero ao estilo maoísta. Agora, ela foi substituída por um sexismo escancarado", diz ela.

"É muito mais difícil conseguir emprego, porque eles fazem demandas extras. Algumas empresas se negam a contratar mulheres em idade fértil. E, às vezes, se a mulher engravida, eles a demitem. Às vezes eles forçam as mulheres a escrever 'eu prometo não ter filhos nos próximos 10 anos'".

Dados recentes mostram que as mulheres vivendo nas cidades chinesas hoje ganham apenas 67,3% do que os homens ganham. Já as que vivem nas regiões rurais ganham menos que 56%.

Assim como em outros países, há vários fatores contribuindo para que essa lacuna exista. Mas a diferença na China é que há idades obrigatórias de aposentadoria. As mulheres precisam se aposentar antes que os homens - aos 55 para funcionárias do Estado, contra 60 para os servidores homens.

Talvez você não precise olhar muito além da elite política da China para ver a disparidade entre homens e mulheres na representação política.

O Partido Comunista, que está no poder, tem apenas uma mulher em seu Politburo número 25 (um importante comitê central), enquanto o Comitê Permanente do Politburo Central, mais poderoso, nunca teve uma mulher em suas fileiras. Dos 204 membros do comitê central, apenas 10 eram mulheres.

A China passou por um período de rápido crescimento. Mas o fato de que ainda há percepções tradicionais enraizadas sobre os papéis dos homens e das mulheres significa que ainda há um longo caminho para que ocorram avanços reais na base dessa grande economia.

*Esta matéria é baseada em um vídeo do programa Business Daily da BBC e a análise foi feita pela jornalista e escritora chinesa Lijia Zhang.