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Análise: O que Trump significa para as taxas de juros

Mohamed El-Erian

14/11/2016 11h31

(Bloomberg) -- Durante mais de dois anos, os preços de mercado embutiram muito menos aperto monetário do que o banco central dos EUA (Federal Reserve) sinalizava nos "pontos azuis", que representam as expectativas dos integrantes do Comitê de Mercado Aberto (FOMC) para a trajetória das taxas de juros.

A surpreendente eleição de Donald Trump à presidência tende a afetar essa divergência por dois motivos. As implicações no mercado serão diferentes, dependendo de qual motivo prevalecerá nos próximos meses.

Um panorama interessante se delineia a partir da comparação entre a mediana dos pontos azuis e a cotação dos contratos de juros a termo. Após caminharem de forma muito próxima, a distância entre as duas variáveis começou a ficar notável no primeiro trimestre de 2014. A distância se ampliou e persistiu, embora as duas linhas tenham se movido para baixo, com poucos tropeços.

Ainda não há uma análise definitiva que explique porque o Fed vem sinalizando consistentemente juros maiores, mas existem várias sugestões, incluindo o excesso de otimismo com a economia dentro do banco central (o que também causou repetidas revisões para baixo nas previsões de crescimento), as oscilações do dólar e a discrepância de sensibilidade entre representantes do Fed e do mercado às consequências de eventos internacionais. E como a visão do mercado tem sido validada pelos fatos, alguns até sugerem que os investidores estavam determinando as medidas do Fed e não o contrário.

A julgar pela reação inicial do mercado à eleição presidencial, a solidez dessa diferença consistente entre as projeções oficiais e do mercado para os juros poderá ser testada nos próximos meses - por duas razões.

Primeiramente, os investidores aceitaram rapidamente um cenário econômico de reinflação, com base nos comentários de Trump imediatamente após a vitória (particularmente os elementos favoráveis ao crescimento da abordagem econômica dele, incluindo gastos com infraestrutura, reforma tributária para as empresas e desregulamentação), além do fato de ele não ter enfatizado as medidas protecionistas que defendeu durante a campanha, que deixariam a economia exposta a pressões de estagflação no curto prazo (como tarifas sobre produtos vindos da China e do México e o desmantelamento do Acordo de Livre Comércio da América do Norte - Nafta).

O tom reforçou o conteúdo. Em seu primeiro discurso como vencedor, na madrugada de 9 de novembro, o presidente eleito enviou uma mensagem inclusiva e conciliatória que foi reforçada por figurões de ambos os partidos, incluindo Hillary Clinton, o líder da maioria na Câmara de Deputados, Paul Ryan, e o presidente Barack Obama.

O tom menos polêmico e o foco em uma agenda pró-crescimento fortaleceu o sentimento do mercado, levando à disparada das bolsas e a um novo recorde no índice Dow Jones. Ainda é cedo, mas alguns analistas já estão inclinados a revisar para cima suas projeções para a economia dos EUA, com efeitos benéficos para a economia global.

Dependendo de como o presidente eleito vai proceder, talvez essas expectativas não sejam o único fator por trás do movimento de reposicionamento dos preços nos mercados de juros, que incluiu a disparada no rendimento do título do Tesouro americano com prazo de 10 anos para 2,14 por cento. O segundo fator tem a ver com os sinais de alguns dos assessores econômicos de Trump, que questionaram a eficácia do estímulo prolongado pelo banco central e expressaram preocupações de que tais medidas estariam criando uma "economia falsa".

Essas indicações após a eleição vêm na esteira de queixas durante a campanha sobre a independência do Fed e a competência de sua diretoria. Se tais sinais se tornarem mais frequentes nas próximas semanas, o que não é certeza, a potencial convergência das expectativas para os juros teria uma cara diferente. Diante das preocupações do mercado sobre a autonomia operacional do Fed ? atributo que tem beneficiado a economia americana ?, o aumento dos rendimentos dos títulos provavelmente seria acompanhado de queda nas bolsas, o que poderia atrapalhar o crescimento econômico.

A ascensão de Trump à Casa Branca é mais do que um abalo sísmico político: já mexeu com os mercados e influencia expectativas sobre a perspectiva econômica. Se ele continuar enfatizando os elementos positivos de sua agenda econômica, se abstiver de medidas que ameacem criar estagflação, e se tudo isso se refletir em um esforço construtivo de implementação junto ao Congresso, o governo dele tem potencial para incentivar uma convergência de juros que seria consistente com maior crescimento econômico e maior estabilidade financeira.

Esta coluna não necessariamente reflete a opinião do conselho editorial da Bloomberg LP e seus proprietários.